
Na noite em que Donald Trump foi eleito presidente dos Estados Unidos, um evento realizado por um grupo ligado ao movimento reacionário norte-americano revelou o clima de hostilidade que acompanhava a vitória republicana.
O jornalista Jamil Chade, colunista do UOL, decidiu acompanhar o encontro para observar quem eram os apoiadores mais radicais do então candidato. “A festa virou uma declaração de fúria e vingança”, descreveu. Segundo ele, a comemoração foi marcada por discursos agressivos e promessas de uma “retomada brutal” do poder.
Em seu livro “Tomara que você seja deportado” (editora Nós), Chade relata ter chorado ao caminhar de volta para casa, pelas ruas de Nova York, na madrugada seguinte. “Não pela derrota dos democratas, mas por ter entendido que o grupo que chegava ao poder tinha na violência seu instrumento político”, escreveu.
Oito meses depois, uma investigação do site Publico revelou o conteúdo de conversas de um grupo chamado Jovens Republicanos, que reunia militantes de 18 a 40 anos e hoje é considerado a base do movimento ultraconservador americano. As mensagens, trocadas em um chat do Telegram, mostravam discursos racistas, antissemitas e violentos.
De acordo com o Publico, os participantes se referiam a negros como “macacos”, exaltavam o estupro e cogitavam o uso de câmaras de gás contra adversários políticos. William Hendrix, vice-presidente dos Jovens Republicanos do Kansas, chegou a usar insultos raciais mais de uma dezena de vezes. Outro integrante, Bobby Walker, descreveu o estupro como “épico”.

Peter Giunta, então presidente da ala jovem republicana de Nova York, escreveu: “Todos que votarem ‘não’ irão para a câmara de gás”. A mensagem recebeu resposta de Joe Maligno, ex-conselheiro do grupo: “Podemos consertar os chuveiros? Câmaras de gás não combinam com a estética hitlerista”. Já Annie Kaykaty, membro do comitê estadual, afirmou: “Estou pronta para ver as pessoas queimarem agora”.
A investigação reuniu 2.900 páginas de conversas, trocadas entre janeiro e agosto, e revelou o esforço interno para transformar a juventude republicana em uma força declaradamente pró-Trump. “As mensagens mostram uma cultura onde o racismo e o antissemitismo circulam livremente, reflexo do afrouxamento das normas políticas na era Trump”, diz o texto do Publico.
O site também identificou a presença de Michael Bartels, consultor sênior da Administração de Pequenas Empresas do governo Trump. Embora tenha participado das conversas, Bartels não contestou o teor extremista. “Ele se recusou a comentar”, relatou a reportagem. Após a divulgação, um dos participantes foi demitido e outro perdeu uma oferta de emprego, enquanto lideranças republicanas condenaram o conteúdo.
Nas trocas, membros ainda usavam o código “1488”, referência a um lema supremacista branco e à saudação “Heil Hitler”. Um deles chegou a ironizar o risco de exposição: “Se algum dia vazássemos esse chat, estaríamos ferrados”, escreveu. Para Jamil Chade, a reportagem apenas confirmou o que testemunhou naquela noite de 2016: o surgimento de um movimento que normalizou o ódio e a violência na política norte-americana.