
O Superior Tribunal Militar (STM) decidiu, por unanimidade, reverter a decisão de um juiz de primeira instância e determinou que o coronel da reserva Rubens Pierrotti Júnior fosse processado por críticas à cúpula do Exército.
O Ministério Público Militar o acusou de cometer crimes militares, como crítica indevida e ofensa às Forças Armadas, após declarações feitas em entrevistas sobre seu livro “Diários da Caserna: Dossiê Smart: A História que o Exército Quer Riscar”, no qual denuncia corrupção dentro da corporação e critica vários de seus oficiais, incluindo o ex-vice-presidente Hamilton Mourão.
O livro de Pierrotti contém acusações de que a corporação e seus membros, incluindo Mourão, estiveram envolvidos em um escândalo relacionado à compra de um simulador de apoio de fogo da empresa espanhola Tecnobit, no valor de cerca de R$ 83 milhões, ajustados para a cotação atual.
O coronel alegou que a compra foi parte de um esquema de corrupção envolvendo altos oficiais do Exército, acusando-os de falsificar documentos e manipular processos para beneficiar empresas privadas. Ele também questionou a atuação de outros militares, particularmente em relação à postura do Exército durante os episódios de instabilidade política e o golpe de Estado liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
Em suas entrevistas, Pierrotti criticou a atuação do Exército durante a crise política, dizendo que o golpe não avançou por “inépcia dos próprios militares” e acusou o Alto Comando de se envolver em ações oportunistas. O coronel também se dirigiu ao Superior Tribunal Militar, acusando-o de desperdício de recursos públicos e de ter transformado o Exército em uma “unidade politizada”.
Os ataques foram considerados ofensivos e incompatíveis com a disciplina militar, levando o Ministério Público Militar a apresentar a denúncia. Na primeira instância, o juiz que analisou o caso decidiu rejeitar a denúncia, argumentando que Pierrotti fez as declarações enquanto estava na reserva e não mais sujeito às mesmas regras disciplinares dos militares em serviço ativo.

O juiz se baseou em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que garante a liberdade de expressão, especialmente no que se refere à crítica política, sem configurá-la como crime, e concluiu que as ações de Pierrotti não deveriam ser enquadradas como delito.
A decisão foi contestada pelo Ministério Público Militar, que recorreu ao STM. O tribunal, por 14 votos a zero, contrariou o entendimento do juiz de primeira instância, determinando que a denúncia fosse aceita e que o caso seguisse para a ação penal.
O STM considerou que as declarações feitas por Pierrotti tinham caráter ofensivo e que ele ultrapassou os limites da liberdade de expressão ao atacar diretamente a imagem e a confiança das Forças Armadas e de seus superiores.
O advogado de defesa de Pierrotti, André Perecmanis, informou que entraria com um habeas corpus com o objetivo de restabelecer a decisão inicial, que havia rejeitado a acusação. Segundo o advogado, a decisão do STM contrariou jurisprudência consolidada no STF, o que motivaria o recurso judicial.
A defesa argumenta que o coronel, ao escrever seu livro e dar entrevistas, usou uma técnica literária conhecida como “romance com chave”, uma forma de narrativa ficcional que, no caso, se refere a fatos reais, mas com a troca dos nomes dos personagens envolvidos.