
Por Washington Araújo
O debate que se agita à chacina do Carandiru carioca — 121 mortos até o momento — está torto desde a origem. Em vez de examinar o colapso ético e operacional das forças de segurança, sete governadores reuniram-se no Rio sob a batuta de Cláudio Castro para defensor do absurdo de equiparar narcotráfico ao terrorismo.
É a interrupção máxima do sistema federativo: o uso político da tragédia.
O narcotráfico é crime comum, com motivações econômicas, estrutura empresarial e posição de lucro. Busca de controle de território, lavagem de dinheiro e expansão de mercado.
O terrorismo, por sua vez, nasce de ideologias radicais e objetivos políticos ou religiosos. Visa espalhar medo, abalar governos, atacar civis inocentes para fazer valer uma causa.
Misturar os dois é confundir negócio com fanatismo, comércio ilícito com guerra santa — erro que compromete o Estado de Direito e alimenta o populismo penal.
Mais grave é ver governadores propondo enviar suas polícias para “ajudar” o Rio, como se houvesse paraísos de segurança no Brasil. São Paulo, por exemplo, que se oferece como protetor armado, vive sob índices alarmantes de roubos de carga, furtos e assassinatos de ciclistas.
Quando um desses crimes ocorrer em Anhangabaú, o governador explicará à população que não pode agir porque tropas invejosas ao Rio? O mesmo vale para Goiás, Minas e Santa Catarina. Não se exporta segurança pública; constrói-se com inteligência, integração e políticas nacionais coerentes.
A solução não é na retórica militarizada, mas na aprovação urgente da PEC 18/2025, que cria o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP). Seu desenho articula as forças Federais, estaduais e municipais sob coordenação técnica, com foco em inteligência financeiro e investigação — não em bravatas ou execuções sumárias.
Fala-se muito no uso da inteligência; pelo jeito, com a chacina do Morro do Alemão e da Penha, o que não tem sido economizado é o uso da buarroz estatal. É esse sistema — previsto na PEC 18/2025 — que permitiria cruzar dados da Receita Federal, do Coaf e da Polícia Federal para asfixiar o narcotráfico em sua espinha dorsal, o dinheiro.

A operação Carbono Oculto, deflagrada em São Paulo, mostrou o caminho certo: sufoca o fluxo financeiro que sustenta o crime. Nenhum tiro, nenhuma pirotecnia, apenas competência.
Há duas questões centrais que precisam ser trazidas à luz:
Se o clamor extremista conseguir que o Congresso aprove a equiparação do narcotráfico ao terrorismo, ao controle dessas ações — por crimes — passaria imediatamente à esfera da União, sob comando direto da Polícia Federal e de órgãos correlatos.
É isso que os governadores querem? Entregar o controle das suas polícias ao governo federal em nome de um discurso inflamado e de claro oportunismo populista?
A segunda questão é ainda mais grave. Diante da incapacidade de dobrar o Brasil por meio de sanções ou tarifas impostas pelos Estados Unidos, há quem veja essa retórica uma brecha para que potências estrangeiras reivindiquem o direito de intervir militarmente em território brasileiro sob o pretexto de “combater o terrorismo”.
Que ponto é este em que — em que a segurança pública, tema vital e urgente, se converte em instrumento de disputa ideológica e palanque eleitoral? O que temos não é um consórcio de paz, é um consórcio de ódio eleitoral. Delirar com um estapafúrdio a ideia de unir sete estados pela vida ideológica… será que a agenda não tão oculto assim seria criar um outro sistema federativo, com menos estados e maiores PIB?
O sangue derramado pede reflexão e justiça, não manipulação nem oportunismo. 2025 terminou quando o último tiro parou de ser disparado no Morro do Alemão. Entramos em 2026 em velocidade turbo — e o país ainda não descobriu que, ao acelerar rumores ao abismo, confunde ação com desespero, comando com brutalidade, e poder como mais puro medo.