A batalha entre governo e Congresso para mudar a legislação sobre o crime organizado

Atualizado em 4 de novembro de 2025 às 6:41
Hugo Motta, presidente da Câmara, e Lula. Foto: Breno Esaki/Metrópoles

Em meio ao avanço da oposição na pauta da segurança pública, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) intensificou as articulações para impedir uma derrota política no Congresso. O Palácio do Planalto tenta adiar a votação do projeto que equipara facções criminosas a grupos terroristas, marcada para esta terça-feira (5) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, enquanto aposta no próprio “projeto de lei antifacção”, apresentado como alternativa institucional à proposta da direita.

A ministra da Secretaria de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, passou a segunda-feira (4) em ligação com deputados da base e do centro, tentando convencer parlamentares a barrar a sessão.

Paralelamente, o governo também se mobilizou no Senado para conter o avanço da CPI do Crime Organizado, que será instalada nesta terça e tende a fortalecer o discurso oposicionista após a operação policial que deixou 121 mortos no Rio de Janeiro.

O Planalto avalia que a oposição tenta transformar o tema da segurança em um novo campo de desgaste político, explorando a popularidade do governador Cláudio Castro (PL-RJ) após a megaoperação no Rio. Pesquisa Genial/Quaest mostrou que 64% dos fluminenses aprovaram a ação contra o Comando Vermelho, resultado que reforçou a narrativa de endurecimento penal defendida pela direita.

Enquanto a CPI é instalada no Senado, a CCJ da Câmara pode votar o projeto que enquadra facções criminosas como organizações terroristas. De autoria do deputado Danilo Forte (União-CE) e relatado por Nikolas Ferreira (PL-MG), o texto é uma das bandeiras centrais do bolsonarismo.

A proposta amplia a Lei Antiterrorismo de 2016 para incluir o domínio territorial — uma referência direta ao controle de comunidades por facções — e prevê penas de até 30 anos de prisão.

Hugo Motta e Gleisi Hoffmann, ministra da SRI. Foto: Gil Ferreira/SRI

Na prática, a aprovação da proposta levaria à federalização das investigações e à cooperação internacional para bloqueio de bens, transformando o combate ao crime em um tema de segurança nacional. O governo, no entanto, vê riscos econômicos e diplomáticos nessa abordagem.

A alternativa do Executivo é o “PL Antifacção”, assinado por Lula na sexta-feira (31). O texto cria o tipo penal de “facção criminosa”, com penas de cinco a dez anos para integrantes e financiadores, podendo chegar a 30 anos em casos de homicídio sob ordem de chefes do crime.

A proposta também autoriza o uso de infiltrados, criação de empresas fictícias, confisco antecipado de bens e monitoramento digital mediante autorização judicial.

A ideia do governo é endurecer as punições sem recorrer ao enquadramento de terrorismo, o que, segundo o Planalto, poderia “vulnerabilizar o princípio da soberania nacional”.

“É um absurdo que isso seja pautado antes da lei antifacção. Chega a ser uma piada em um momento sério. A lei antifacção tem uma pena maior na pena mínima do que a do terrorismo. Qual é o sentido? Vulnerabilizar o princípio da nossa soberania e incitar a agressão de um outro país”, afirmou o líder do PT na Câmara, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ).

Técnicos da área econômica alertam que reconhecer grupos terroristas no Brasil abriria espaço para sanções internacionais e restrições financeiras. Países enquadrados como abrigos de terrorismo podem enfrentar isolamento bancário, redução de investimentos e aumento no custo de seguros e crédito.

Enquanto tenta controlar a votação na Câmara, o Planalto encara outro desafio no Senado. A CPI do Crime Organizado, proposta pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE) e autorizada por Davi Alcolumbre (União-AP), investigará facções e milícias, mas já nasce com maioria oposicionista.

Entre os membros titulares estão Flávio Bolsonaro (PL-RJ), Sergio Moro (União-PR), Marcos do Val (Podemos-ES), Magno Malta (PL-ES) e Eduardo Girão (Novo-CE) — todos críticos ao governo. A base indicou Jaques Wagner (PT-BA), Rogério Carvalho (PT-SE) e Fabiano Contarato (PT-ES), delegado da Polícia Civil, cotado para presidir o colegiado.

A oposição tenta emplacar Flávio Bolsonaro no comando da CPI, com o objetivo de transformá-la em vitrine política. O governo tenta reagir, apostando em Contarato e em uma narrativa de “mão firme” no combate às facções, mas dentro dos limites constitucionais.

Augusto de Sousa
Augusto de Sousa, 31 anos. É formado em jornalismo e atua como repórter do DCM desde de 2023. Andreense, apaixonado por futebol, frequentador assíduo de estádios e tem sempre um trocadilho de qualidade duvidosa na ponta da língua.