
Por Jeferson Miola, publicado em seu blog
A reação desrespeitosa e agressiva do tenente-brigadeiro Carlos Augusto Amaral Oliveira ao discurso proferido pela presidente do Superior Tribunal Militar [STM] Maria Elisabeth Rocha no ato de rememoração dos 50 anos do assassinato de Vladimir Herzog pela ditadura representa o pensamento autoritário, conspirador e ingerencista reinante nas Forças Armadas.
Este oficial da ativa da Força Aérea [FAB], indicado ministro do STM por Bolsonaro em 2020, propugna uma justiça militar justificadora do terror de Estado durante a ditadura e revisionista da verdade histórica daquele período obscuro e sanguinário.
O brigadeiro atacou a presidente do STM porque ela pediu “perdão à sociedade brasileira e à história do país pelos equívocos judiciários cometidos pela Justiça Militar Federal em detrimento da democracia e favoráveis ao regime autoritário”.
Em consonância com o imperativo democrático de memória, verdade e justiça, a ministra Maria Elisabeth pediu “perdão a tantos outros homens e mulheres que sofreram as torturas, as mortes, os desaparecimentos forçados e o exílio”, e “pelos erros e as omissões judiciais cometidas durante a ditadura”.
Está amplamente documentada a atuação vergonhosa da justiça militar na engrenagem do regime de terror implantado em 1964, quando realizava julgamentos farsescos, com provas falsas e forjadas para condenar ilegalmente opositores da ditadura e proteger trogloditas fardados e os cúmplices civis do regime que praticaram atrocidades inomináveis.
Para a presidente do STM, “essa agressão desrespeitosa [do brigadeiro] não atinge apenas esta magistrada, [mas] atinge a magistratura feminina como um todo”.

O ataque do brigadeiro Carlos Augusto representa, também, uma agressão à democracia e ao direito da sociedade brasileira à verdade histórica sobre o passado ditatorial, para que não mais se repitam rupturas do Estado de Direito como a ocorrida em 1964 e outra vez tentada durante o governo fascista-militar com Bolsonaro.
É inaceitável que a justiça militar continue atuando como um órgão mistificador da história real do nosso país.
Aliás, a justiça militar sequer deveria existir, deveria ser extinta. Na maioria dos países não existe justiça militar em tempos de paz. Os crimes cometidos por militares são julgados em tribunais civis da Justiça Comum e as faltas disciplinares por regimentos e estatutos próprios.
No Brasil, essa justiça militar justificadora da barbárie ditatorial se caracteriza, ainda, como uma sinecura, onde ministros recebem salários muito acima do teto constitucional.
O tenente-brigadeiro e ministro do STM Carlos Augusto, por exemplo, de dezembro de 2024 a agosto de 2025 recebeu de salários o montante de R$ 1.183.877,30, o equivalente à média de 131.542 reais por mês [Fonte: STM/Transparência]. A maior remuneração mensal dele neste período foi de R$ 280.763,59, em dezembro do ano passado.
Apesar de relativamente recente, a atuação jurídica do tenente-brigadeiro Carlos Augusto no STM é bastante polêmica.
Na sessão do Tribunal de 15 de dezembro de 2022, ao relatar determinado processo, ele aproveitou para atacar a Suprema Corte em termos genuinamente bolsonaristas:
“O STF está processando meio mundo no país só porque falou mal do STF. É o que está acontecendo no Brasil hoje. As pessoas que falam mal do STF numa conversa de bar ali vão sendo processadas com a Polícia Federal dentro das suas casas aí e sendo presas sem nem saber e seus advogados não têm acesso a absolutamente nada”.
Como relator do caso dos militares que fuzilaram o carro do músico Evaldo Rosa com 62 tiros de fuzil em abril de 2019, o tenente-brigadeiro Carlos Augusto absolveu os colegas de farda de crimes graves, imputando-lhes uma condenação mínima, em regime aberto.
Se nas sessões do STM que são publicizadas o brigadeiro da FAB defende abertamente posicionamentos incompatíveis com a democracia e a Constituição, é de se imaginar as posições que ele defende na intimidade insondável dos altos comandos militares.
É lamentável a omissão do ministro da Defesa Múcio Monteiro a essa realidade.