
O advogado Nelson Wilians pagou R$ 22 milhões para impedir que uma funerária de luxo se instalasse ao lado de sua mansão no Jardim Europa, bairro nobre de São Paulo. A transação, realizada em 2020, envolveu uma offshore nas Ilhas Virgens Britânicas e o empresário Maurício Camisotti, apontado pela Polícia Federal como intermediário do negócio, conforme informações da colunista Natália Portinari, do UOL.
No auge da pandemia, Wilians descobriu que a casa vizinha à sua, de 1.422 metros quadrados, estava prestes a ser vendida a um grupo de investidores do setor funerário por R$ 15 milhões. O imóvel pertencia aos sobrinhos do empresário Abílio Diniz. Para evitar que o projeto fosse adiante, o advogado entrou em contato com os proprietários e se ofereceu para comprar o casarão.
Incomodada com a interferência, a família Diniz aumentou o valor para R$ 22 milhões — proposta que Wilians aceitou. No entanto, ele informou que o imóvel seria registrado em nome de outra pessoa: o empresário Maurício Camisotti, da área de saúde e seguros. Documentos mostram que a compra foi feita por meio de uma offshore de Wilians nas Ilhas Virgens Britânicas.
Intermediação e offshore
Em um contrato de gaveta firmado com os quatro filhos de Alcides dos Santos Diniz, irmão de Abílio, Wilians definiu que o imóvel ficaria no nome de Camisotti e de sua mulher, Cecília Montalvão Simões. Em seguida, o bem seria transferido para a empresa Oral-Dent, cujas cotas seriam repassadas à Irmãos Wilians Empreendimentos e Participações S.A., administrada por Anne Wilians, esposa do advogado.
A operação foi concluída em novembro de 2020. Poucos meses depois, em abril de 2021, a casa foi demolida e o terreno virou um gramado murado ao lado da residência de Wilians. Oficialmente, a propriedade ainda está registrada em nome de Camisotti e de sua esposa.

Relações financeiras sob investigação
Wilians e Camisotti estão sendo investigados pela Polícia Federal na Operação Sem Desconto, que apura fraudes em descontos indevidos do INSS. A compra da casa passou pela offshore de Wilians, com Camisotti atuando como intermediário.
O advogado de Wilians, Santiago Schunck, afirmou que “não há qualquer ilegalidade, irregularidade ou incompatibilidade jurídica nas transações mencionadas, realizadas entre entes privados, de forma transparente, formal e dentro dos parâmetros legais e comerciais vigentes”.
Já Camisotti declarou em nota que seus negócios com Wilians “são de caráter privado, legítimo, estão documentados e consistem em empréstimos pessoais e na compra de um imóvel”, negando qualquer ligação com suas atividades empresariais.
Negócio com os herdeiros Diniz
O casarão era de propriedade da Bradish, empresa dos filhos de Alcides Diniz, irmão de Abílio. A companhia enfrentava uma ação por dívida tributária de R$ 33 milhões com a União. Por isso, o contrato previa que os Diniz indenizariam Wilians e Camisotti caso houvesse penhora judicial sobre o bem.
O pagamento de R$ 22 milhões foi dividido entre os quatro herdeiros — R$ 4,75 milhões para cada um — e o corretor recebeu comissão de R$ 1,3 milhão. A dívida da Bradish com a União foi posteriormente renegociada, mas ainda soma R$ 69 milhões, conforme dados da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.

Alertas e investigações
O nome de Camisotti já havia aparecido em outras investigações, como a CPI da Covid, por suposta participação na compra da vacina Covaxin. Em 2024, após a Operação Sem Desconto, ele tentou convencer o BTG Pactual a autorizar a transferência de 40% de seu patrimônio para criptomoedas, segundo comunicação do banco ao Coaf.
O BTG informou que Camisotti declarou ter crédito de R$ 35 milhões em relação a Nelson Wilians no Imposto de Renda de 2023. Também reportou ao Coaf que ele tentou justificar pagamentos recebidos de uma offshore de Wilians, mas se recusou a apresentar documentação.
Além da compra da casa, Wilians repassou R$ 15 milhões a Camisotti entre 2016 e 2022. A defesa do advogado sustenta que “os negócios ocorreram antes de qualquer suposto vínculo do Sr. Camisotti com o INSS” e que “toda a documentação já foi apresentada à Justiça, comprovando a plena licitude e regularidade das operações”.
