Pai de santo dá cheque sem fundo de R$ 280 milhões e Correios anulam leilão de terreno

Atualizado em 11 de novembro de 2025 às 11:25
Sede dos Correios. Foto: reprodução

Os Correios anularam a venda de um imóvel avaliado em R$ 280 milhões em Brasília após descobrirem que o pagamento havia sido feito com um cheque sem fundos. A negociação, marcada por suspeitas e falhas de verificação, envolvia uma ONG sediada em Taguatinga (DF), a CPM Intercab, dirigida por Jorge Luiz Almeida da Silveira, conhecido como Pai Jorge de Oxossi — líder religioso do Candomblé e responsável por um terreiro na Ceilândia, periferia da capital federal.

Segundo o Estadão, informações da estatal indicam que a anulação foi determinada após a constatação de irregularidades no pagamento da entrada do imóvel, antigo campus da Universidade Corporativa dos Correios (UNICORREIOS), no Setor de Clubes Esportivos Norte, uma das áreas mais valorizadas de Brasília.

O terreno, de 212 mil metros quadrados e avaliado inicialmente em R$ 322 milhões, foi vendido com deságio, já que a ONG foi a única participante do certame realizado em junho deste ano.

Pai Jorge afirmou que desconhecia as irregularidades e ainda pretende disputar o imóvel em uma nova licitação. “A gente tem alguns ativos que estamos negociando para poder serem pagos. Se o terreno for para leilão de novo, nós vamos entrar com os recursos”, declarou ao Estadão.

O caso começou a levantar suspeitas logo após a homologação da venda. O então presidente dos Correios, Fabiano Silva, determinou que a área de compliance investigasse a ONG e seu dirigente. O relatório apontou que a CPM Intercab não possuía capital social compatível com o negócio e que o líder religioso havia recebido auxílio emergencial durante a pandemia de covid-19.

Lote comprado em leilão que será anulado. Foto: reprodução

Apesar do alerta, a Diretoria de Administração da estatal considerou o processo regular e recomendou a continuidade da venda. Fabiano Silva, entretanto, suspendeu a transação até que o Conselho de Administração analisasse o caso. Em setembro, a CPM Intercab comunicou a desistência e pediu a devolução do valor pago como entrada.

A investigação revelou que o cheque de R$ 500 mil, apresentado como garantia, foi emitido pela empresa M Gorete F Alves Ltda. Contudo, o CNPJ informado não existe, conforme consulta ao sistema da Receita Federal. No fim de outubro, a área financeira dos Correios confirmou que o valor nunca foi depositado.

“No período compreendido entre 26/06/25 e 24/10/25, não foi identificado qualquer crédito oriundo da empresa M GORETE F ALVES LTDA (CNPJ 04.601.058/0001-04), emissora do cheque devolvido”, informou um ofício interno.

A suposta empresa tem número de registro semelhante ao da MG Incorporadora de Imóveis Ltda, pertencente à empresária Maria Gorete Ferreira Alves.

Segundo Pai Jorge, ela teria visitado seu terreiro e prometido apoio financeiro para o projeto social que a ONG planejava instalar no terreno da UNICORREIOS, voltado à capacitação de jovens negros e ao ensino de teologia afro-brasileira. “A dona Maria Gorete fez uma doação. Ela esteve uma vez aqui no terreiro. Depois não tive mais notícias dela”, disse o religioso.

Maria Gorete é alvo de investigação da Polícia Civil do Distrito Federal e teve prisão decretada por envolvimento em golpes imobiliários. De acordo com a polícia, ela negociava a compra de terras e cobrava valores por serviços de georreferenciamento antes de desaparecer com o dinheiro. Seu advogado, Bruno Trelinski, afirmou que não comentará o caso antes de ter acesso completo aos autos.

Augusto de Sousa
Augusto de Sousa, 31 anos. É formado em jornalismo e atua como repórter do DCM desde de 2023. Andreense, apaixonado por futebol, frequentador assíduo de estádios e tem sempre um trocadilho de qualidade duvidosa na ponta da língua.