
Superintendente do BNDES, Gabriel Aidar, que participará de seminário do DCM e da FESPSP, revela como o Tesouro Nacional viabilizou o salto que resultará na redução de 99,7 milhões de toneladas de CO₂ equivalentes (tCO₂e) na vida útil dos projetos e de 3,9 milhões de tCO₂e por ano, o equivalente a sete meses sem carros no estado de São Paulo
Em uma transformação de escala sem precedentes, o BNDES converteu o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, o Fundo Clima, em um instrumento central de financiamento climático. A carteira, que historicamente operava com cerca de 2 bilhões de reais, saltou para 25 bilhões de reais entre 2023 e 2025, um aumento de mais de doze vezes. Apenas em 2024, os 10 bilhões de reais já aprovados superam em mais de trinta vezes a média anual de 300 a 400 milhões registrada até 2022. Para 2025, a projeção é de pelo menos mais 14 bilhões de reais.
Essa mudança de escala reflete uma nova filosofia no principal banco de fomento do país. “A agenda do clima é uma agenda de desenvolvimento. Meio ambiente e clima hoje são desenvolvimento, não apenas uma dimensão, mas o próprio vetor do desenvolvimento”, afirma Gabriel Ferraz Aidar, superintendente da Área de Planejamento e Pesquisa Econômica do BNDES.
A declaração, feita em entrevista a caminho da COP30 em Belém, sintetiza o novo paradigma do banco: a transição ecológica deixa de ser um tema setorial e se torna eixo estruturante de um novo ciclo de crescimento para o Brasil.
O salto do Fundo Clima só foi possível a partir de uma engenharia financeira articulada no segundo semestre de 2023 entre o BNDES, o Ministério da Fazenda e o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). O ponto-chave foram os títulos sustentáveis que o Tesouro Nacional passou a emitir no mercado internacional. Fernando Haddad captou recursos em dólar com taxas próximas a 6,5% ao ano e assumiu para o Tesouro o risco da variação cambial — um seguro que antes encarecia e inviabilizava a operação para o BNDES.
Assim, os recursos chegam ao Fundo Clima em reais, com taxa fixa, eliminando a imprevisibilidade do dólar. Isso permitiu ao BNDES repassar o dinheiro com uma taxa altamente incentivada para financiar projetos climáticos, em contraste com a Selic atual de 15% ao ano.
Os resultados já aparecem em projetos concretos. O impacto ambiental estimado é de 99,7 milhões de tCO₂e reduzidos ao longo da vida útil das iniciativas, além de 3,9 milhões de tCO₂e por ano. “Isso equivale a sete meses sem veículos rodando pelo estado de São Paulo”, compara Aidar.
Os projetos também devem gerar cerca de 90 mil empregos diretos e indiretos. Na restauração florestal, o banco mobiliza 7 bilhões de reais, o que resultará no plantio de 281 milhões de árvores — mais de uma por habitante do país. Em infraestrutura sustentável, o BNDES tornou-se o maior financiador de ônibus elétricos da América Latina, com quase 2 mil veículos desde 2023. A agenda de biocombustíveis, incluindo etanol de segunda geração e biogás, também avança e posiciona o Brasil como protagonista da descarbonização do transporte.
Essa visão será detalhada por Aidar no Seminário Pós-COP30: O Brasil diante das transformações globais, parceria entre o Diário do Centro do Mundo (DCM) e a Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). O evento ocorre em 24 de novembro, três dias após o fim da conferência, e fará um balanço crítico das decisões tomadas em Belém e seus impactos para o Brasil. Aidar dividirá a mesa de abertura com Ricardo Abramovay (USP), Camila Gramkow (CEPAL), Alexandre Ramos Coelho (FESPSP) e Aldo Fornazieri (FESPSP), oferecendo uma análise multidisciplinar dos desafios e oportunidades do país no cenário pós-COP30.
Mesmo com o sucesso do Fundo Clima, Aidar aponta gargalos importantes. O primeiro é a regulamentação do mercado de carbono, essencial para criar previsibilidade de preço e viabilizar projetos de longo prazo — especialmente os de restauração florestal, dependentes da venda de créditos.
O segundo é o volume de financiamento: a demanda é enorme e o pipeline de projetos em análise no BNDES já ultrapassa 30 bilhões de reais. “O que entra no Fundo Clima, a gente investe. Não faltam projetos”, afirma Aidar. O terceiro desafio é ampliar o apoio a iniciativas de adaptação climática, que ainda enfrentam mais dificuldades para atrair capital, apesar de sua importância.