Por que a ex-premiê de Bangladesh foi condenada à morte

Atualizado em 17 de novembro de 2025 às 15:16
Sheikh Hasina, ex-premiê de Bangladesh, condenada a morte por crimes contra a humanidade. Foto: Reuters

A ex-primeira-ministra de Bangladesh, Sheikh Hasina, recebeu pena de morte por “crimes contra a humanidade” ligados à repressão aos protestos do ano passado.

A decisão foi tomada pelo mesmo tribunal criado por ela em 2009, acusado desde então de servir a disputas políticas.

Hasina governou o país por 15 anos, até ser derrubada em julho após meses de manifestações contra denúncias de corrupção e contra o sistema de cotas para empregos públicos. Desde então, vive exilada na Índia.

As acusações

Segundo o relatório do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos, divulgado em fevereiro, os protestos deixaram cerca de 1.400 mortos em 46 dias e milhares de feridos. O documento afirma que integrantes do antigo governo, forças de segurança e grupos ligados ao partido de Hasina praticaram violações graves de direitos humanos.

O novo governo, liderado por Muhammad Yunus, prometeu punir abusos cometidos durante a gestão anterior. Hasina foi julgada à revelia e enfrentou cinco acusações:

  • Discursos considerados incitadores;
  • Ordem para uso de armas letais contra manifestantes;
  • Morte do estudante Abu Sayed, da Universidade Begum Rokeya;
  • Execução de seis manifestantes desarmados na região de Chankharpul, em Dhaka;
  • Queima de seis pessoas em Ashulia.

O jornal The Daily Star noticiou que ela foi condenada por todas as acusações. A pena de morte foi aplicada pelo episódio de Chankharpul, ocorrido em 5 de agosto do ano passado.

Hasina nega tudo. Em entrevista ao The Indian Express, afirmou que o atual governo inflou as manifestações e responsabilizou Yunus por estimular a revolta. Ela também mencionou atuação de radicais e presença de estrangeiros que, segundo ela, ajudaram a ampliar a violência.

O tribunal que se voltou contra sua criadora

Na campanha eleitoral de 2008, o partido de Hasina, a Liga Awami, prometeu julgar colaboradores do Exército paquistanês na guerra de 1971. Já no poder, ela instituiu o Tribunal de Crimes Internacionais (ICT) em 2009.

O tribunal prendeu e condenou diversos acusados, muitos deles ligados ao Jamaat-e-Islami, rival histórico da Liga Awami. As sentenças incluíram prisão perpétua e pena de morte. Mesmo com apoio inicial da população, críticos afirmavam que o tribunal funcionava de maneira parcial. Em 2012, o diretor da Human Rights Watch para a Ásia, Brad Adams, classificou os julgamentos como problemáticos devido às dúvidas sobre independência e imparcialidade.

Após a queda de Hasina, o ICT passou a investigar justamente aqueles que o criaram. Dez dias depois da fuga da ex-primeira-ministra, abriu-se um inquérito contra ela e outros nove suspeitos por assassinato, tortura e outras violações. A acusação entregou um relatório de 135 páginas, acompanhado de milhares de documentos e depoimentos.

Prédio em chamas durante protestos em Bangladesh, em agosto de 2024. Foto: Rajib Dhar/AP

E agora? Nada muda para Hasina — por enquanto

A decisão do tribunal não altera a situação imediata da ex-premiê. Ela segue na Índia, em local não divulgado, e a extradição depende de aval do governo indiano. A chance disso acontecer é considerada pequena.

Hasina sempre foi aliada de Nova Délhi. Durante sua administração, os dois países fortaleceram laços econômicos e culturais, além de cooperação em segurança. Ela foi vista como uma liderança alinhada aos interesses indianos na região.

O tratado de extradição entre Índia e Bangladesh prevê várias situações em que o pedido pode ser negado, incluindo casos em que a acusação não tenha sido apresentada de forma justa ou quando os crimes forem de natureza militar sem equivalente direto na legislação comum. Assim, existe margem legal para a Índia rejeitar a solicitação.

Com Bangladesh prestes a realizar novas eleições e sem um governo estável no comando, a devolução de Hasina dificilmente ocorrerá tão cedo.