
Por Leonardo Sakamoto, no Uol
Afirmar que Jair Bolsonaro não estava tentando fugir após um vídeo mostrar o ex-presidente confessando que derreteu a tornozeleira eletrônica com um ferro de solda é tratar o brasileiro como idiota. As imagens vieram a público após aliados gastarem a manhã jurando que era apenas um defeito no equipamento. Um defeito quente, pelo visto.
Ele podia estar grogue de algum remédio na hora em que teve que se explicar à polícia, como defenderam seus aliados à Carla Araújo, no UOL. Mas, no vídeo, o próprio ex-presidente disse à servidora da administração penitenciária do Distrito Federal que o processo de queima da tornozeleira começou na tarde de ontem. Foi um derretimento em volta de todo o aparelho, ele sabia o que estava fazendo.
As imagens e o áudio seriam provas mais do que suficientes para decretar uma prisão preventiva, nem sendo necessário conjugar isso com a vigília que foi aclamada pelo seu filho, o senador Flávio Bolsonaro, com o objetivo de gerar tumulto à ordem pública. Ele não estava testando apenas até onde a tornozeleira iria sem apitar à central, também estava verificando os limites das instituições e da República.
URGENTE: STF divulga imagens da tornozeleira eletrônica usada por Jair Bolsonaro com sinais claros de tentativa de rompimento. Nas imagens, uma diretora da Secretaria de Administração Penitenciária do DF faz vistoria no equipamento. pic.twitter.com/81HGdiAPIE
— Renato Souza (@reporterenato) November 22, 2025
Se um rapaz pobre da periferia de São Paulo que tivesse sido preso por roubo e, por sorte, estivesse esperando o julgamento em liberdade, tentasse derreter a sua tornozeleira como faca quente na manteiga, esse mesmo pessoal que minimiza o que Jair fez não ia dar mole, não. Estaria pedindo prisão perpétua e esculacho no camburão.
Em vez disso, quando se trata de Bolsonaro, seus defensores preferem fabricar versões alternativas da realidade, como se o país inteiro fosse obrigado a acreditar em contos de fada para adulto armado. Essa insistência em negar o óbvio não é apenas patética: é perigosa, porque normaliza a ideia de que alguns podem burlar a lei sem enfrentar consequências.
No fundo, o que estão defendendo não é Bolsonaro, mas o privilégio de construir a realidade a partir de ficção e não de fatos. E enquanto essa lógica prosperar, a democracia seguirá sendo tratada como tornozeleira de plástico: algo que eles acham que podem derreter quando bem entenderem.