
Para evitar um colapso climático, a economia global precisará ser 100% descarbonizada. Essa é a visão dos especialistas ouvidos no seminário “Clima e Desenvolvimento Sustentável”, realizado pelo DCM e pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), com apoio do BNDES, na manhã de segunda-feira (24), na capital paulista. A mediação foi do jornalista Caco de Paula, coordenador do evento.
Ricardo Abramovay, professor sênior do Instituto de Energia e Ambiente da USP, abriu o evento destacando a concentração das emissões em poucos atores. Cinco países e 56 empresas respondem por 66% das emissões globais de gases de efeito estufa, responsáveis pelo aquecimento global e pelas mudanças climáticas.
Segundo Abramovay, descarbonizar a economia é um desafio, “pois as grandes empresas são boas em disseminar tecnologias e produtos, mas nem sempre são eficientes em criar inovações”.
Camila Gramkow, diretora da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (Cepal) no Brasil, alertou para a urgência das mudanças no sistema produtivo global. “Mudanças climáticas não são um fenômeno neutro: se nada for feito, o mundo vai piorar. E mulheres, os mais pobres e os marginalizados serão os mais afetados por essas mudanças. Precisamos pensar em justiça climática”, afirmou.
Na avaliação de Camila, o aquecimento global cria três armadilhas: “Países com baixo crescimento econômico terão mais dificuldade nesse cenário, porque eventos climáticos extremos afetam estruturas produtivas; um clima mais extremo tende a agravar desigualdades; e esses eventos podem fragilizar Estados e instituições, pressionando governos”.
Alexandre Coelho, coordenador do MBA em Geopolítica e Transição Energética da FESPSP, falou sobre os impactos das mudanças climáticas nas relações internacionais: “Poucos países têm a condição do Brasil em termos de energia e geopolítica. A matriz elétrica brasileira é muito mais limpa. Além disso, o Brasil é líder em biocombustíveis e é o segundo maior detentor de terras raras, minerais essenciais para tecnologias estratégicas como baterias de veículos elétricos”.
Abramovay, porém, aponta obstáculos para o Brasil: “EUA, China e Índia, os três maiores emissores de CO₂, concentram suas emissões em combustíveis fósseis. No caso do Brasil, 75% das emissões vêm do desmatamento e da pecuária”, explicou.

Mercado x Estado
Gabriel Aidar, superintendente de Planejamento e Pesquisa Econômica do BNDES, tratou do papel do Estado na transição econômica e ambiental: “Só o mercado não trará as mudanças necessárias. A COP30 foi uma conferência na floresta, com políticas voltadas para as florestas”.
Ele apresentou dados sobre investimentos: “Até o fim de 2026, teremos R$ 50 bilhões para o Fundo Clima e outros R$ 7 bilhões para reflorestamento em 168 mil hectares na Amazônia. Clima e meio ambiente também são desenvolvimento”.
Camila Gramkow reforçou o ponto: “Estimativas indicam que investimentos em mitigação e descarbonização chegarão a 5% do PIB nos países emergentes. O impacto sobre trabalho e renda na transformação do sistema produtivo nem sempre é considerado”.
Esse cenário gera contradições, observou Abramovay: “Enquanto crescem os investimentos em energia eólica e solar, os investimentos em combustíveis fósseis dobraram, impulsionados por EUA, Rússia e Brasil — e não pelo Oriente Médio”.
“Nossa soberania energética ainda se apoia em energias antigas, sejam fósseis ou renováveis. O Brasil ainda está no início no uso de baterias elétricas e no aproveitamento das terras raras. O país precisa continuar combatendo emissões geradas pelo desmatamento e pela pecuária para contribuir com as metas globais”, disse o professor.
Coelho, da FESPSP, enxerga nisso uma chance estratégica: “Há um vácuo de liderança política na transição econômico-ambiental. Haverá uma grande reconfiguração da geopolítica global por causa da necessidade urgente de mudanças econômicas, e o Brasil poderá ter protagonismo”.
“Não houve consenso ao final da COP30 sobre o abandono total dos combustíveis fósseis. Oitenta dos 160 países votaram a favor e 80 votaram contra. Mas essa será uma mudança inevitável”, disse Camila Gramkow. Aidar reforçou: “O custo da inação diante das mudanças climáticas é inestimável. No pior cenário, haverá queda significativa no PIB de muitos países”.











