Alcolumbre chantageia governo para meter a mão no erário

Atualizado em 1 de dezembro de 2025 às 13:20
Davi Alcolumbre durante plenário. Foto: Divulgação

Por Márcio Chaer, na ConJur

Do Império ao alvorecer da Constituição Federal de 1988, o modelo da tripartição de Poderes baseou-se numa lorota: a de que o poder estatal tem três esferas independentes — Legislativo, Executivo e Judiciário. Em teoria, a equação é destinada a garantir a liberdade e evitar a tirania.

Na prática, o Executivo, até então, concentrava quase todo o poder, como dono do cofre da República e patrão da magistratura e legisladores.

A partir dos anos 1990 — porque a CF, como as leis em geral, demorou alguns anos para “pegar” — o Supremo Tribunal Federal virou governo de fato. Isso assustou quem não tinha lido a Carta, ou a interpretava como o texto varrido pela história.

Mercado da vergonha

Já o Congresso, não. Preferiu sua parte em dinheiro. O nobre papel de legislar e compartilhar o governo virou um encadeado de negociações miseráveis para lotear a máquina estatal, pagar cabos eleitorais e bancar reeleições. O Legislativo renunciou ao papel de legislar também.

Nas ocasiões em que este site perguntou a Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ainda presidente do Senado, o que foi feito da Comissão criada para regulamentar os cerca de 100 dispositivos da Constituição que esperam para vigorar, a resposta foi a mesma: “Vou verificar e depois respondo.”

Depois dos seus 250 artigos originais, a Constituição Federal ganhou 70 outros com o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Como se fosse pouco, o Congresso acrescentou à Carta mais de 130 emendas. Não é pouco.

Se chegarem ao STF mais 100 Mandados de Injunção, o tribunal se verá na situação de “legislar” mais cem vezes. Mas qual tem sido a principal crítica de Rodrigo Pacheco ao Supremo? A de que o tribunal vem usurpando o papel do Congresso.

Ignorância desumana

Rodrigo Pacheco gosta de mostrar o que não conhece do processo constitucional. Ele é entusiasta da PEC que restringe decisões monocráticas no Supremo. Mesmo sabendo de duas coisas: a primeira é que o apelido “decisão monocrática” é equivocado, quando se refere a decisões que replicam o entendimento do tribunal. E é isso que quase sempre ocorre.

O segundo aspecto que Pacheco ainda tem chance de responder é como fazer para viabilizar um tribunal — em que cada integrante decide, em média, 10 mil vezes por ano — sem a corrida de revezamento possibilitado pelos julgamentos individuais. Em especial os que só fazem replicar entendimentos do colegiado.

Mas Pacheco não parou por aí. Ele protestou contra o fato de o tribunal buscar solução para o debate da descriminalização do porte de maconha. Esse papel, insiste, é do Congresso. Como se não soubesse que, nos 37 anos de vigência da CF, o Congresso desviou-se de temas polêmicos, como a questão das drogas, do aborto e da eutanásia. A Nação espera os projetos que Pacheco diz serem incumbência do Parlamento.

Em maio deste ano ele voltou a defender o fim da possibilidade de decisões monocráticas suspenderem leis ou atos dos poderes Executivo e Legislativo. De novo: como ficam as cláusulas pétreas que impõem ao tribunal essa obrigação?

Davi Alcolumbre e Rodrigo Pacheco. Foto: Divulgação

Pega ladrão

Sempre em coro com seu padrinho, com quem disputa o campeonato nacional da esperteza, o comerciante Davi Alcolumbre (União-AP), Pacheco andou dizendo que o caminho correto para descriminalizar o porte de maconha seria o processo legislativo e criticou a decisão do STF nesse sentido. Taxou de invasão da competência do Legislativo.

A nação aguarda a aprovação das leis que a dupla diz ser atribuição do Congresso, para o que eles não mexem um dedo. Mas Pacheco deu andamento à PEC 8/2021, que limita decisões monocráticas de ministros do STF — aprovada em dois turnos pelo Senado em novembro de 2023.

Na época, esse desconstitucionalista alegou ter recebido agressões gratuitas de ministros do STF (Barroso, Alexandre e Gilmar criticaram a proposta). A Câmara engavetou a PEC e ele criticou os deputados por isso.

Na confortável posição dos inimputáveis, em agosto de 2023, ele já havia criticado a corte por ter retomado esse mesmo julgamento. Na mesma ocasião, também criticou a decisão do STF sobre o piso nacional da enfermagem, por ter “inovado” com dispositivos não contemplados na proposta anteriormente analisada pelo Congresso.

O poderoso das galáxias

Pacheco foi mais longe. Ele criticou a decisão do STF que determinou a instalação da CPI da Covid. Chamou de politização do Judiciário. Em outubro de 2022, ele também disse que havia “ativismo político” do Judiciário, para explicar seu comodismo.

Em outubro de 2023, ele defendeu a “limitação de acesso ao STF para evitar que tenha ponto de contato constante com a sociedade”.

Já defendeu “rediscutir” as competências do STF e é autor de uma PEC que tira da corte a prerrogativa de decidir, por exemplo, sobre questões penais.

Nesse enredo de stand up, Alcolumbre aceitou animado o picadeiro de falso poderoso que a imprensa monocromática lhe deu. Dizer que vai impedir o governo de governar porque não se vai indicar um despreparado para o STF é o máximo.

Mesmo sabendo que essa chantagem é apenas um truque para meter, mais um pouco, a mão no erário, Alcolumbre sabe a soma que lhe renderam as emendas orçamentárias e os cabos eleitorais que ele tem empregado na administração direta e indireta, em autarquias e empresas públicas.

Alcolumbre nunca quis um ministro no STF. Nem poder. O que ele quer mesmo é dinheiro.