“Motta é inábil, autoritário e recebe ordens de Lira, que saiu de casa para cassar Glauber”, diz Sâmia Bomfim

Atualizado em 13 de dezembro de 2025 às 13:11
Sâmia Bomfim

A deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) contou ao DCMTV, na sexta-feira (12), que a decisão pela suspensão do mandato do deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) — em substituição à cassação, que era o cenário mais provável — resultou de um intenso processo de disputa política no Congresso Nacional. O caso marcou um dos episódios de maior tensão e cálculo estratégico no campo progressista nesta temporada legislativa.

Esposa de Glauber, Sâmia relatou bastidores envolvendo o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), apontado por aliados como o principal articulador da ofensiva contra o deputado do PSOL, tratado internamente como o algoz do parlamentar fluminense.

Na entrevista, a deputada também falou sobre o assassinato de seu irmão, o médico ortopedista Diego Ralf de Souza, morto em 2023 em um quiosque na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Segundo as investigações, o crime foi cometido por integrantes do Comando Vermelho.

A vitória não é só de Glauber, é também da luta popular

Sobre o caso de Glauber, é importante destacar que um processo de luta e de mobilização que sai vitorioso não pode deixar de considerar exatamente o que é fundamental: o respaldo e a pressão popular para que as coisas se reflitam dentro do Congresso Nacional. Recentemente, o país passou — claro que em outra dimensão — por um processo semelhante, que foi a derrota da chamada PEC da blindagem. Ela chegou a ser aprovada no plenário, mas o povo tomou as ruas e acabou enterrada no Senado. Agora, também foi aprovada, infelizmente, a PL da dosimetria, que é uma espécie de anistia para os golpistas, ainda que não seja integral. Por isso, há uma nova mobilização convocada para domingo.

O processo de cassação de Glauber, que durou mais de um ano e meio, contou com todo tipo de luta possível e necessária. Aproveito para, em nome dele, nosso, da nossa família e do PSOL, agradecer a solidariedade, as mensagens, a presença, a mobilização e o carinho. Tudo foi muito impressionante desde a primeira hora até ontem.

Vitória sobre Arthur Lira

Nesse contexto, derrotar o relatório de cassação do mandato de Glauber significa mais do que manter um mandato combativo e de esquerda na Câmara. Representa uma vitória sobre Arthur Lira, Eduardo Cunha e Hugo Motta, que é o fantoche que dá continuidade a esse projeto. A máscara de Hugo Motta foi arrancada. Quando assumiu, falou em democracia, citou Ulysses, o filme “Ainda Estou Aqui”, e, há três dias, fez algo que nem na ditadura aconteceu: mandou bater em deputado e jornalistas por meio da polícia legislativa e cortou o sinal da TV Câmara, porque havia ali um adversário protestando.

Em agosto, quando houve o sequestro da Mesa Diretora por dezenas de deputados, eles conseguiram, a partir desse ato, dialogar com Hugo Motta e ainda conquistaram a PEC da bandidagem e o projeto da anistia. Já Glauber ficou menos de uma hora na Mesa Diretora e foi tratado como foi. Por isso, essa vitória é de todos aqueles que lutam contra o golpismo, que tomam as ruas e estão indignados com o cinismo golpista de Hugo Motta, que finge estar em cima do muro enquanto pavimenta a candidatura de Tarcísio de Freitas e ataca o campo progressista.

Ele recebe ordens de Lira, Cunha, Tarcísio, Valdemar e Sóstenes. Só não tem, aparentemente, a própria firmeza política, porque, numa hora, manda descer o cacete em jornalistas e, na outra, diz que não foi ele, porque nem sabia do protocolo. Ora, ou ele é autoritário ou não tem condições de estar ali. Nunca vi alguém tão inábil, frágil e autoritário como ele. Por isso, foi uma vitória da democracia, em última instância, contra todos esses poderes no Congresso Nacional.

Hugo Motta está muito fragilizado

Hugo Motta está muito fragilizado. Todo mundo sabe que, nos bastidores, Arthur Lira o critica duramente e agora faz questão de expressar essas críticas por meio da imprensa. Basta abrir os jornais do país para encontrar notas do tipo: “em um grupo de WhatsApp, ele disse que a Câmara está uma esculhambação”; “para aliados, afirma estar furioso com a manutenção do mandato de Glauber”, e assim por diante.

Quando Lira faz isso, deixando vazar informações que, em tese, circulavam apenas internamente, ele sinaliza essa fragilidade. Sinceramente, isso torna dificílima a reeleição de Hugo Motta como presidente da Câmara. Tentando agradar todo mundo — ou achando que estava — ele acabou brigando com o governo, com o PL, garantiu ao Supremo a cassação de Zambelli e, no fim, precisou de Alexandre de Moraes para fazer valer a lei e obrigar a Câmara a cumprir uma decisão judicial.

Foi derrotado por um parlamentar que é tratado como “um isolado do PSOL”, alguém de quem a Câmara não gosta — mesmo entre os que o defenderam, muitos fizeram questão de dizer isso —, mas que teve o mandato mantido por uma questão de justiça e democracia. Ou seja, Hugo Motta perdeu para todo mundo. Tenho a impressão de que perdeu para si mesmo. É um rei de mentira, um rei que não reina e que acumula derrotas diárias.

Arthur Lira saiu de casa para tentar cassar Glauber

Desde a primeira hora, eles não conseguiram os 257 votos necessários para a cassação, em nenhuma das votações. Isso foi nos encorajando. Confesso que começamos a sessão bastante desanimados, mas, na primeira votação, percebemos que a tropa não estava tão organizada.

Foi nesse momento que Arthur Lira, que acompanhava a sessão de casa, correu para a Câmara e começou a atuar diretamente. Ele precisou entrar em campo ao perceber que os votos com os quais contava não estavam garantidos. Por isso também está bravo com Hugo Motta, pois achava que Motta resolveria tudo. Eles entraram de salto alto, acreditando que estava tudo resolvido, porque, em tese, ninguém gosta do Glauber. Só que a gente também faz política.

O depoimento de Pedro Paulo, do PSD

Já agradeci ao deputado Pedro Paulo mais de uma vez e, obviamente, agradeço novamente. Não apenas a ele, mas também a outros deputados que não são do nosso campo — e aos do nosso campo, claro, que agradeço e abraço muito. Foi um trabalho de parceria muito bonito, algo que se vê poucas vezes.

Tudo foi determinante, porque a diferença que possibilitou votar o relatório alternativo foi de seis votos — que, na prática, são três, pois se três votos mudam de lado, iríamos direto ao relatório de cassação. Honestamente, nosso estado hoje seria outro.

Foi uma articulação geral. Desde o primeiro momento, o deputado Pedro Paulo, do PSD do Rio de Janeiro, nos procurou dizendo estar muito indignado com a situação e à disposição para colaborar. Inclusive, sugeriu nomes de deputados liberais da direita tradicional para que fizéssemos contatos.

Havia um destaque decisivo, uma emenda apresentada pelo líder do PT, deputado Lindbergh Farias — a quem registro aqui meu agradecimento, pois desde ontem, às oito da manhã, estava ligando para saber como ajudar e colocou toda a equipe à disposição para formular a emenda. Foi, portanto, uma emenda do PT, destacada pelo PSOL e defendida pelo deputado Pedro Paulo, do PSD.

Há poucas semanas, estávamos em disputa política com ele por conta da reforma administrativa, de autoria dele, contra a qual realizamos diversas audiências públicas com servidores. Ele é, naturalmente, um deputado ligado ao mercado e, por isso, um nome acima de qualquer suspeita nesse caso. Ainda assim, fez uma fala excepcional, reforçando que não está no mesmo campo político de Glauber, que são adversários, mas que não havia como cassar seu mandato por uma questão de democracia e justiça. Com isso, ofereceu uma saída aos parlamentares.

Saber reconhecer as vitórias

Seis meses pode parecer exagero, mas não ousamos propor menos tempo para não gerar a sensação de punição excessivamente branda, já que é a partir de seis meses que há afastamento do mandato. Para nós, a prioridade era garantir os direitos políticos, razão pela qual não vamos recorrer da decisão. É importante saber reconhecer as vitórias. Fizemos tudo o que era possível, chegamos até aqui e agora seguimos em frente.

O assassinato do irmão de Sâmia pode ter sido um crime político?

Foi a primeira coisa que passou pela nossa cabeça. O crime ocorreu no Rio de Janeiro, vitimou o irmão de uma deputada do PSOL e cunhado de um deputado do PSOL, em uma situação muito estranha. Um médico, participando de um congresso, termina assassinado. Tudo isso nos impactou profundamente, ainda mais porque nossa companheira Marielle também havia sido assassinada.

O então ministro da Justiça, Flávio Dino, entrou em cena, mas não surgiram indícios que apontassem para essa linha de investigação, e a Polícia Federal se afastou. Foi quando apareceu a hipótese de confusão, de o médico se parecer com um líder miliciano do Rio de Janeiro.

Não insistimos na reabertura do inquérito para outras hipóteses. No entanto, o comando que vem de cima — das instituições e da política — determina o que acontece tanto nas milícias quanto no crime organizado, no CV e no PCC. Hoje me pergunto: foi um crime político? No stricto sensu, talvez não. No lato sensu, foi. Quando se fala da relação entre crime e política, então foi, sim. Se houve envolvimento de políticos, a história nos dirá.

 

Thiago Suman
Jornalista com atuação em rádio, TV, impresso e online. É correspondente do Daily Mail, da Inglaterra, apresentador do DCMTV e professor de filosofia e sociologia, além de roteirista de cinema e compositor musical premiado em festivais no Brasil e no mundo