Sakamoto: bolsonarismo ironiza multidão anti-dosimetria, mas ato pró-golpistas flopou

Atualizado em 15 de dezembro de 2025 às 11:44
Protesto contra o PL da Dosimetria na Avenida Paulista neste domingo (14). Foto: Zanone Fraissat/Folhapress

Por Leonardo Sakamoto, no UOL

Atos no Rio, em São Paulo e em diversas cidades do país mobilizaram uma multidão contra a redução de penas para golpistas, mostrando que a impunidade a golpistas e a esbórnia política vem empurrando o campo progressista de volta às ruas. Era um público menor que nos atos contra a PEC da Blindagem e o PL da Anistia, o que era esperado, mas um público consistente para essa pauta.

Porém, o deputado Paulinho da Força (SD-SP), que foi relator do PL da Dosimetria, resolveu criticar a demanda das manifestações, usando uma conhecida tática bolsonarista: tentar convencer que o tamanho do apoio a alguém ou a uma ideia depende da quantidade de gente na rua. E ao vocalizar o ataque, que vem sendo feito por seguidores do ex-presidente aos atos de ontem, assume que tem um lado.

“Todos os vídeos que eu publiquei em defesa do projeto da dosimetria tiveram audiência maior do que isso”, disse ele em registro de Fábio Zanini, na Folha de S.Paulo. Afirma que apenas um de seus vídeos teve mais de 300 mil visualizações.

Posso dizer ao deputado que só uma das minhas postagens criticando o fato do PL da Dosimetria antecipar a saída da cadeia de condenados por corrupção, lavagem de dinheiro, crimes sexuais, entre outros, para poder reduzir a pena de Jair e outras lideranças do golpismo, teve mais de um milhão de visualizações. E há vídeos circulando, com críticas de juristas, analistas, artistas e demais cidadãos à dosimetria, com muitos milhões. E isso significa o que? Nada. Porque isso não é uma competição de popularidade.

Sempre digo aqui que as pessoas perderam um pouco o senso do que é uma multidão. Porque encher ruas e avenidas com dezenas de milhares de pessoas, como ocorreu ontem, é sinal de bastante gente, principalmente para um tema específico como perdão a golpistas. Uma das razões para isso é que estamos acostumados a números promiscuamente inflados pela polícia na época do impeachment de Dilma Rousseff.

E isso vale para a esquerda e a direita, porque o bolsonarismo que, agora, cita os números da USP, chamam eles de mentirosos quando medem suas próprias manifestações.

Segundo o Monitor do Debate Político no Meio Digital da USP, Cebrap e ONG More in Common, o Rio de Janeiro juntou 18,9 mil e São Paulo, 13,7 mil ontem. Em setembro, no ato contra a PEC da Blindagem e o PL da Anistia, os mesmos locais reuniram 41,8 mil e 42,4 mil, respectivamente.

Mas se o bolsonarismo quer brincar de colocar a régua e comparar quem teve o maior, vale lembrar que o último ato pela liberdade de Jair Bolsonaro e em favor da saída de golpistas da cadeia, realizado no dia 30 de novembro em frente ao Museu Nacional, em Brasília, teve 130 pessoas no seu auge. Isso depois que o ex-presidente já estava preso na PF do Distrito Federal cumprindo pena de 27 anos e três meses por tentativa de golpe de Estado.

Isso também não significa que o bolsonarismo não vai conseguir colocar milhares nas ruas ou que o apoio ao ex-presidente desidratou a ponto de se tornar irrelevante. Ele continua sendo uma das mais importantes forças políticas do país, tanto que o centrão e a Faria Lima estão panicados após ele escolher seu filho, Flávio, como adversário de Lula nas eleições – um bode cujo preço para sair da sala é a anistia ou, exatamente, a redução do tempo de pena do pai.

Da mesma forma, isso não significa que milhões de pessoas não estejam indignadas com o cambalacho que vem sendo cozinhado pelo Congresso Nacional para abrir a golpistas e, de lambuja, soltar criminosos comuns. Mas nem todo mundo que está indignado precisa ir à rua.

Vale lembrar que, segundo o Datafolha de dezembro, 54% dos brasileiros afirmam que a prisão de Bolsonaro foi justa frente a 40% que avaliam como injusta.

Durante anos, a extrema direita prometeu que, caso Jair fosse condenado e preso, uma comoção popular paralisaria o país. Isso não aconteceu, o que causou frustração em aliados do ex-presidente, que esperavam multidões nas ruas protestando contra o encarceramento.

Os atos de ontem, realizados em todo o país, demonstraram insatisfação da população quanto ao PL da Dosimetria, relatado por Paulinho da Força. Atento a isso, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) afirmou a Julia Affonso, do UOL, que vai apresentar votar pela rejeição completa do PL da Dosimetria Comissão de Constituição e Justiça.

Senadores perceberam que o projeto é, literalmente, chave de cadeia, liberando. Vão propor algo diferente, que reduza a pena dos peixes pequenos, sem atingir os líderes do golpismo.

Como já disse aqui, esse tipo de situação não é o fundo do poço, porque aprendemos no Brasil que, no fundo do poço, tem sempre um alçapão. Mas a Câmara deveria tentar se reconectar à maioria do país. Ano que vem tem eleição, né?

Veja vídeos do ato contra o PL da Dosimetria:

Veja o ato bolsonarista flopado em Brasília no último dia 30: