
O aluguel do Museu das Favelas para a gravação de cenas do filme Dark Horse, que retrata a trajetória do ex-presidente Jair Bolsonaro, gerou forte reação interna entre funcionários do equipamento cultural. A produção utilizou o espaço por dois dias, em dezembro, mediante pagamento de R$ 57 mil, conforme tabela pública, e reencenou no local a facada sofrida por Bolsonaro durante a campanha de 2018.
O museu é vinculado ao governo estadual, comandado por Tarcísio de Freitas, que também autorizou gravações do longa no Memorial da América Latina. Funcionários ouvidos relataram desconforto com a associação do espaço, voltado à cultura periférica, a um personagem político criticado por políticas adotadas durante seu governo, especialmente no período da pandemia.
As gravações no Museu das Favelas ocorreram nos dias 3 e 4 de dezembro, das 6h às 12h, e incluíram áreas como escadarias, foyer, hall, sala de reuniões e espaços externos. O mesmo local havia sediado recentemente uma exposição dedicada aos Racionais MC’s, cujos integrantes são críticos do ex-presidente.
Além da controvérsia institucional, a produção de Dark Horse passou a ser alvo de denúncias trabalhistas feitas por figurantes e técnicos brasileiros que atuaram nas filmagens realizadas entre outubro e novembro de 2025. Os relatos incluem agressões físicas, restrições excessivas, alimentação estragada e condições inadequadas de trabalho durante as gravações.

Um dos depoimentos mais graves é o do ator Bruno Henrique, que afirma ter sido agredido por membros da segurança durante filmagem no Memorial da América Latina, em 21 de novembro. Segundo ele, a produção proibiu a entrada de celulares, mas não ofereceu local seguro para guardá-los. Ao tentar acessar o set com o aparelho, relata ter sido arrastado, empurrado e agredido, episódio que teria resultado em registro de corpo de delito.
Outras queixas relatam atrasos de pagamento, cachês considerados abaixo do padrão do setor e práticas irregulares, como desconto de transporte e impedimento de saída do set por longos períodos. Os valores pagos a figurantes teriam variado entre R$ 100 e R$ 170, segundo denúncias reunidas por entidades representativas da categoria.
O Sindicato dos Artistas de São Paulo (Sated-SP) e o Sindcine abriram um dossiê com as reclamações e cobraram fiscalização mais rigorosa. As entidades destacam que produções estrangeiras devem cumprir a legislação brasileira, apresentar contratos formais e respeitar as convenções coletivas. Representantes sindicais classificaram como inaceitável a postura atribuída à equipe do filme.
Dirigido por Cyrus Nowrasteh e estrelado por Jim Caviezel no papel de Bolsonaro, Dark Horse tem roteiro assinado pelo deputado federal Mário Frias e estreia prevista para 2026. Procurada, a produtora responsável pelo elenco afirmou seguir a legislação e as práticas do mercado, enquanto a Secretaria da Cultura de São Paulo declarou que a locação dos espaços culturais seguiu critérios contratuais e não envolveu uso de acervo ou marcas institucionais.