Como Tucker Carlson está rachando a extrema-direita com suas críticas a Israel

Atualizado em 21 de dezembro de 2025 às 10:05
Tucker Carlson no TPUSA, maior evento da extrema-direita dos EUA

A extrema-direita americana vive um de seus momentos mais explícitos de fratura interna, e Tucker Carlson está no centro desse racha.

O embate ficou evidente durante a AmericaFest, principal conferência anual da Turning Point USA, organização conservadora fundada pelo falecido Charlie Kirk que reúne milhares de militantes jovens, influenciadores digitais, parlamentares republicanos e figuras centrais do trumpismo.

O evento funciona hoje como um termômetro ideológico da base MAGA, revelando disputas abertas sobre o futuro do Partido Republicano.

No palco da AmericaFest, o comentarista Ben Shapiro atacou diretamente Tucker Carlson, além de Candace Owens, Megyn Kelly e Steve Bannon, classificando-os como “fraudes e charlatães”. Segundo Shapiro, o movimento conservador estaria em “grave perigo”, tomado por figuras que dizem agir em nome de princípios, mas que, na prática, alimentam teorias conspiratórias e desinformação.

Ao mencionar Bannon, ex-estrategista de Donald Trump e amigo dos Bolsonaros, Shapiro afirmou que acusações de “lealdade a países estrangeiros” feitas por ele não se baseiam em provas, mas em ataques pessoais. A plateia reagiu com murmúrios e constrangimento.

A fala gerou reações imediatas dentro do próprio campo fascista. Shapiro era comparsa de Jeffrey Epstein, o financista condenado por crimes sexuais e acusado de comandar uma rede internacional de exploração envolvendo figuras poderosas. Epstein tornou-se uma referência tóxica no debate político americano, frequentemente usada para deslegitimar adversários.

Shapiro avançou então contra Tucker Carlson por dar espaço em seu programa a Nick Fuentes, influenciador da extrema-direita conhecido por posições neonazistas, antissemitas e supremacistas brancas, que ganhou notoriedade após participar de um jantar com Trump em 2022. Para Shapiro, dar palco a esse tipo de figura seria um ato de covardia política.

Carlson é hoje o maior influenciador da ultra-direita americana, com milhões de seguidores nas redes sociais, especialmente no YouTube. Ao subir ao palco, o ex-apresentador da Fox News atacou o que chamou de islamofobia crescente dentro da ala pró-Israel americana. Disse que a maioria da população tem mais pontos em comum do que divergências, mas que uma minoria transforma qualquer crítica em acusação automática de antissemitismo. Para ele, promover “guerras raciais falsas” serve apenas para dividir o país.

“Atacar milhões de americanos só porque eles são muçulmanos? Isso é repugnante. E eu sou cristão”, continuou. “Não sou muçulmano, sei que há um grande esforço para dizer que eu sou um jihadista secreto, não sou. Que diabos vocês estão fazendo? O que vocês estão fazendo é tentar dividir o país. Todas essas falsas guerras raciais que eles vivem promovendo.”

Foi para cima de pastores que justificam o genocídio cometido por Israel em Gaza e condenou o que chamou de “adoração ao poder e ao dinheiro”. “Nós, cristãos, não estamos autorizados a matar inocentes. Ponto. Matar pessoas que não cometeram crimes é imoral”, falou.

“Sempre achei que é correto criticar e questionar nossa relação com Israel, porque isso é insano e nos prejudica. Nós não ganhamos nada com isso”.

Nos últimos meses, Tucker Carlson ampliou esse conflito ao criticar publicamente decisões do governo Trump. Durante o verão, ele condenou o bombardeio ordenado pela Casa Branca contra alvos no Irã. Trump reagiu chamando Carlson de “kooky” (“doidão”). Em entrevista, Carlson afirmou que decidiu se manifestar por considerar que o ataque atendia interesses israelenses. Segundo ele, a reação foi imediata. “No segundo em que falei, virou ‘você odeia todos os judeus, você odeia judeus, você é nazista’”, relatou. “Eu imaginava que isso fosse acontecer, mas mesmo assim fiquei chocado.”

Na semana passada, Carlson disse ter ouvido que Trump anunciaria uma guerra contra a Venezuela em um pronunciamento nacional, o que acabou não se confirmando. Apesar dos atritos, Carlson e Trump mantêm canais de comunicação abertos e trocam elogios públicos. Questionado recentemente sobre a entrevista de Carlson com Nick Fuentes, Trump saiu em sua defesa. “Eu o achei bom”, afirmou. “Ele falou coisas boas sobre mim ao longo dos anos. Acho que ele é bom.”

Kiko Nogueira
Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.