
O juiz Marcelo Bretas não está disposto a passar fome.
Diante da postagem de Deltan Dallagnol feita ontem nas redes sociais anunciando que fará jejum na próxima quarta-feira, o juiz carioca deu o maior apoio ao colega.
“Quarta-feira é o dia D da luta contra a corrupção na Lava Jato. Uma derrota significará que a maior parte dos corruptos de diferentes partidos, por todo o país, jamais serão responsabilizados, na Lava jato e além. O cenário não é bom. Estarei em jejum, oração e torcendo pelo país”, escreveu Deltan sobre os maus presságios que estaria sentindo com relação ao próximo dia 4, quando Lula terá seu habeas corpus julgado.
E também deixando claro que, ao fazer alusão ao desembarque dos Aliados na Normandia, para ele trata-se de uma guerra.
“Caro irmão em Cristo, como cidadão brasileiro e temente a Deus, acompanhá-lo-ei em oração, em favor do nosso país e do nosso povo”.
‘Acompanhá-lo-ei em oração’ significa que baixou um Michel Temer em Bretas e, sobretudo, que jejum não é com ele. Irmão em Cristo, inclua-me fora dessa.
Deltan Dallagnol não deveria se surpreender com apoio restrito, afinal Bretas não costuma chegar a medidas tão extremas nem em batalhas particulares. O juiz carioca é casado com uma juíza e desejava que ambos recebessem o auxílio-moradia.
Uma resolução do CNJ proíbe a remuneração a casais que morem sob o mesmo teto, é obvio, no entanto Bretas não se deu por satisfeito e entrou com uma liminar para obter o benefício. Perdeu e não se tem notícias que tenha jejuado em protesto.
Numa perspectiva mais otimista, pode-se depreender que Marcelo Bretas seja mais fiel aos ensinamentos da Bíblia do que Deltan.
Evangélico como o amigo, Bretas tem passagens da Bíblia inteiras na memória, cita o livro sagrado em quase todas as suas entrevistas, afirma o tempo todo que lê a obra diariamente, quando acorda e quando vai dormir.
Portanto certamente conhece Mateus 6:16-21:
“E quando jejuardes, não vos mostreis contristados como os hipócritas, porque desfiguram o rosto, para que aos homens pareça que jejuam. Em verdade vos digo que já receberam o seu galardão. Porém tu, quando jejuares, unge a cabeça e lava o rosto, para não pareceres aos homens que jejuas, mas sim a teu Pai.”
Já Deltan não apenas quer parecer penitente como faz propaganda antecipada nas redes sociais. Um contristado hipócrita, segundo o livro de cabeceira dele mesmo.
Marcelo Bretas atua na 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro desde 2015 (que possui competência para julgar casos envolvendo crimes contra o sistema financeiro nacional e lavagem ou ocultação de bens) e ganhou notoriedade ao mandar prender Eike Batista.
É a ele que devemos agradecer por ter-nos proporcionado admirar o magnata sem a peruca loura.
Deleitando-se com seus 15 minutos de fama, aproveitou para polemizar e postou uma foto nas redes sociais na qual empunhava um fuzil.
Depois justificou dizendo que não gosta de armas, mas as considera um mal necessário.
Na mesma época, Bretas deu uma declaração que jogou alguma fumaça sobre sua capacidade de separar as esferas pública e privada.
“Não ando sem escolta. Estou aqui com um dos meus melhores amigos, que é policial”, declarou. O amigo estava pela amizade ou era escolta oficial?
Da mesma forma, a postagem feita pelo juiz em resposta a de Dallagnol não significaria que Bretas é mais um caso de servidor público que mistura Estado com religião?
Se ele crê que o Estado (o STF, no caso) só consiga realizar bem seu papel na base da oração, estamos fritos.
Esses ‘contristados hipócritas’ (adorei a definição, Mateus, valeu) que não separam Estado e Igreja, poderiam inspirar José Padilha a fazer um seriado para a Netflix.
O mecanismo seria explicado por meio de uma projeção de Powerpoint e um deles morreria após jejuar por um período mais longo que o de Gandhi. Que tal?