Não existe mulher que gosta de apanhar. Mas delegado, existe. Por Nathalí Macedo

Atualizado em 18 de outubro de 2019 às 19:37
Delegado Waldir

A baixaria foi genelarizada: o Delegado Waldir – um dos líderes do partido e figura folclórica do bolsonarismo –  disse que “implodiria” o presidente, depois que seu mito tentou derrubá-lo pra favorecer Eduardo Bolsonaro. Frota saiu do partido e até posou pra foto com David Miranda e pediu ajuda a Pablo Vittar pra derrubar o presidente (?) Até Joice Hosselman disse que a inteligência emocional de Bozo é -20 (você jura, amada?!).

Então, não, não é só você que não está entendendo nada. Está cada vez mais difícil, mesmo.

Depois do circo armado, o Delegado Waldir – que a essa altura já fez qualquer acordo de seu interesse e desistiu da implosão – pôs panos quentes na situação: “foi um momento de emoção. É que nem mulher traída: apanha, mas volta”, disse, ao declarar que segue firme na carreira de lambe-botas do presidente.

Não me espantaria que um delegado bolsominion não tivesse conseguido formular uma metáfora melhor, mas a piada é tão infame que só me ocorre o seguinte: enquanto estivermos ocupados explicando que mulheres violentadas não permanecem em situação de violência porque querem, não perguntaremos o que afinal poderia implodir Bolsonaro (a gente sabe que a implosão é só uma questão de tempo, mas seria ótimo ver o serviço adiantado).

No fundo, gente como Waldir já conhece a nossa cantiga, mas não custa nada dizer – de novo e uma vez mais – que violência contra a mulher não é piada porque não tem graça.

Mulheres violentadas não permanecem ao lado de seus algozes por interesse, como é o caso do delegado em questão. Elas são impelidas a permanecerem sob violência por questões muito mais complexas, como dependência financeira e emocional, condicionamentos culturais  e desassistência do Estado.

A treta baixo nível do PSL não pode ser comparada nem por brincadeira com o drama real de uma mulher violentada, mas esse país nos desrespeita em tantos níveis que, sinceramente, isso é o mínimo.

Que metáfora poderia narrar um político borra-botas que ameaça a plenos pulmões “implodir o presidente” e em poucos dias põe o rabinho entre as pernas e arremata com uma piada machista?

Não existe metáfora possível, assim como não existe mulher que gosta de apanhar (mas delegado, existe).

Nathalí Macedo
Nathalí Macedo, escritora baiana com 15 anos de experiência e 3 livros publicados: As mulheres que possuo (2014), Ser adulta e outras banalidades (2017) e A tragédia política como entretenimento (2023). Doutora em crítica cultural. Escreve, pinta e borda.