Lana del Rey e o espírito do tempo

Atualizado em 17 de outubro de 2014 às 17:36

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Tratei há alguns anos, em um trabalho de conclusão do curso de Jornalismo, da relação entre a música e o comportamento humano. Dos artistas com ideais hippies dos anos 70, aos emos dos anos 2000, passando pelo punk, gótico, grunge e indie.

É claro que diversos outros movimentos surgiram no período, expressões de diversas tribos contemporâneas que exigiriam um trabalho à parte, e por isso mantive o foco no chamado mainstream da cultura ocidental.

O que a minha hipótese dizia é que pode ser percebido nessa cultura um movimento dialético, em que cada estilo se esgota na síntese do seu oposto, que vem a ser justamente o novo gênero de sucesso, o representante maior do espírito daquele tempo.

Assim os hippies cantaram o sonho de um mundo de paz e amor, que surgia como esperança no horizonte do pós-guerra; os punks, a revolta por não realizá-lo. E desse contraste, segundo a hipótese apresentada, grunges e góticos deram expressão ao fracasso, seja da anarquia punk, seja do sonho hippie, o momento de consciência da angústia, em que a rede de significados do mundo e de ideias para a existência se rompe, nos mantendo suspensos no vazio.

Já não fazia sentido cantar a paz e o amor nem a revolta contra o sistema, do mesmo modo que hoje a angústia da poesia grunge perdeu seu apelo. O que surgiu no lugar se mostrará mais claro quando o futuro lançar seu olhar sobre esse presente, mas talvez seja Lana Del Rey quem nos ajude como ninguém a compreender esse período.

Lana não se desespera nem dá gargalhadas. Do movimento hippie herdou a coroa de flores no cabelo e uma certa serenidade que por vezes contrasta com a melancolia, flerta com a mística. Dizem que ela é um produto, que mudou de nome e de estilo pra alcançar o sucesso, mas isso pouco importa. Sendo um produto, ainda assim ela é a síntese do que vivemos nas últimas décadas e justamente por isso faz sucesso. O espírito de um tempo consciente de suas utopias, de seus fracassos e de sua força e que então retorna a si para, como diz a sua música, “just ride, just ride”.

O texto acima, de Leonardo Mendes, foi publicado originalmente no site Van Filosofia