Que saudade do Jô Soares! Por Gustavo Conde

Atualizado em 18 de dezembro de 2020 às 12:16
Pedro Bial

Por Gustavo Conde

Quem lutou pela democracia nesses últimos 5 tenebrosos anos? Quem denunciou o golpe? Quem denunciou a prisão política de Lula? Quem fez das tripas coração para que um genocida torturador não fosse eleito? Que se expôs? Quem tomou porrada da polícia? Quem foi humilhado, cancelado, espancado, ameaçado (maldito gênero gramatical “masculino”… Mas é o que temos)?

Resposta: muito de nós que habitamos este exótico mundo da coerência política.

Mas o exótico mesmo é ver pessoas com alguma integridade caindo na tentação de serem co-enunciadas por uma estrela global, apenas pelo fato de que essa estrela (velha, sem brilho) ainda remete a uma dicção institucionalizada das narrativas oficiais.

O nome disso é subserviência – codinome, ‘viralatismo’.

Para muitos, é bom ver a Globo, a Folha, o Estadão e seus respectivos funcionários-colunistas-apresentadores se alinhando ao discurso anti-Bolsonaro.

O próprio Paulo Vannuchi me disse: é melhor isso do que nada.

Concordo.

Mas daí a soltar fogos pelo re-enquadramento do apresentador Pedro Bial vai uma distância astronômica.

Confesso que ver pessoas minimamente sérias permitindo que suas respectivas imagens sejam associadas a Pedro Bial nas redes sociais, além de tristeza, me proporciona um sentimento de desterro… De perceber que a tendência de deslumbramento-conciliação da esquerda continua forte e de que nada do que ‘aprendemos’ nos últimos anos foi, de fato, apreendido.

É como se tudo o que se produz no país em termos de discurso anti-fascismo só ganhasse validade quando enunciado por um ex-representante do sistema.

Anitta, Felipe Neto, Gabriela Priolli, Reinaldo Azevedo, Elio Gaspari, Miriam Leitão, Guga Chacra, Leandro Karnal… Não importa a grife: a massa glamourizada de funcionários do establishment percebeu a própria omissão e agora tenta se reconciliar com a história.

E nós, daqui do chão da fábrica digital, estamos sempre à disposição, como reza a mais eloquente tradição cultural do país: passamos o pano para os patrões com gosto.

Repito: não tem problema que estas figuras omissas tenham se convertido a defensores intransigentes da democracia. É até engraçado.

Mas – me desculpem – é preciso se dar ao respeito.

Como diria Lula, sem autoestima, ninguém te respeita.

Sobre Bial, no entanto, há uma cifra a mais de singularidade de ordem ética e estética.

Bial tem um dos piores textos do jornalismo. Sua escrita é pavorosa, o esplendor do mau gosto, da breguice, de tudo o que é mais ‘pegajoso’ em termos de discurso.

Suas ‘crônicas poéticas’ recitadas nos paredões do Big Brother Brasil – esse excelente programa de televisão nos oferecido pela Rede Globo – são um registo histórico da sua falta de intimidade com o sentido.

É essa personagem que, de repente, faz um texto igualmente piegas, plagiário, recitado e que tem o beneplácito da turma do gargarejo da esquerda digital?

É.

O que Bial diz nesse preâmbulo anti-Bolsonaro é a coleção mais infame de clichês daquilo que já foi dito sobre Bolsonaro.

Repetição infinita, sem estilo e sem finesse – sic – que, enunciado por um ‘global’, ganha ares de notícia.

Sempre é bom lembrar: o estrago cognitivo, caras pálidas, foi grande.

Ver Bial vociferando contra Bolsonaro naquele tom recitativo que irremediavelmente nos leva ao enjoo causa um sentimento misto de comiseração (coitado do Bial) e repulsa – para não dizer indignação (mas isso é tão óbvio que soaria piegas).

Enfim, que saudade do Jô Soares!

Pelo menos, o gordo era inteligente – e não se levava tão a sério.