“Judeu, porém cristão”: o estranho caso de Filipe Martins, do gesto supremacista branco, e seu tio “barão”

Atualizado em 25 de março de 2021 às 12:09

Filipe Martins, o assessor internacional de Bolsonaro pilhado fazendo um gesto de supremacistas brancos em reunião dos senadores com Ernesto Araújo, defendeu-se com a cartada do judaísmo.

“Um aviso aos palhaços que desejam emplacar a tese de que eu, um judeu, sou simpático ao ‘supremacismo branco’ porque em suas mentes doentias enxergaram um gesto autoritário numa imagem que me mostra ajeitando a lapela do meu terno: serão processados e responsabilizados; um a um”, escreveu nas redes.

A uma fã surpresa, deu uma explicação peculiaríssima.

Confirmou que é judeu, “porém cristão. Só a parte da família que mora em Israel segue o judaísmo”.

Qualquer um pode se declarar o que quiser, claro.

Mas, vejamos: ele é filho único do operário goiano Carlos Pereira e de Claudilene Garcia Martins. Era ateu e depois engajou-se num credo pentecostal.

O sobrenome “Pereira”, como muitos outros tirados de árvores, é vulgarmente reconhecido como cristão-novo. Isso, no entato, é a uma forçação de barra sem qualquer base histórica.

A revista Amálgama, de direita, fez um perfil de um tio picareta de Filipe, do qual ele é seguidor (abaixo de Olavo de Carvalho na lista de adoração, claro).

“Barão Camilo Agasim-Pereira de Fulwood e Dirleton, nascido Camilo Pereira, não tem em qualquer lugar de sua árvore genealógica uma ancestral judia materna e imediata – mãe, avó materna, etc. – o que o desqualificaria a proclamar-se judeu”, diz a matéria.

Segue:

Isso não o impediu, é claro, de adotar a fé judaica, proclamando-se sefardita (judeu de origem portuguesa ou espanhola) de inteira origem.

Como não se poderia proclamar judeu sem que rabinos atestassem sua conversão à religião, Camilo providenciou um julgamento por uma corte rabínica inexistente – uma tal Beit Abravanel.

Pesquisando mais a fundo sobre o dono do domínio dessa corte rabínica fraudulenta, formada por rabinos imaginários, com alguma dificuldade descobre-se que esta está registrada em nome do TOV Group Inc, uma empresa de mídia inativa sediada em Hallandale, Milton, Flórida.

O telefone do Beit Abravanel, a corte rabínica, também está registrado em nome do mesmo TOV Group Inc., Corporation. E quem seriam os donos dessa empresa? De acordo com os registros, os donos dessa companhia são os autoproclamados Barão e Baronesa de Fulwood, e sua filha Sarah seria uma das agentes.

Deste modo, com uma sentença inventada por uma corte de mentirinha em uma página de internet, Camilo tornou-se judeu de uma hora para outra.

Kiko Nogueira
Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.