Burrice e má fé: jornalistas atacam regulação da mídia, existente nos EUA e Europa, para interditar o debate

Atualizado em 27 de agosto de 2021 às 17:36
Edir Macedo e Jair Bolsonaro – Foto: Alan Santos/PR

O debate sobre regulação da mídia, lançado novamente por Lula em entrevista nesta semana, está envolto numa nuvem de desinformação, burrice e má fé.

Jornalistas que servem a patrões os mais venais saem gritando “censura” sem saber do que estão falando, fazendo coro com os bolsonaristas.

A ideia é interditar o debate.

“O ex-presidente Lula deu munição de presente para seus críticos ao voltar a falar em regulação da mídia. Até dentro do PT admitem que a estratégia foi tudo, menos inteligente. Tese carcomida. Não existe democracia sem liberdade de imprensa”, escreveu Daniela Lima, da CNN.

Ora.

Falta munição para os críticos de Lula? Por que a tese é “carcomida”? A Daniela determina o que pode ou não pode ser discutido?

A imprensa é regulada ECONOMICAMENTE (perdão pela ênfase) no mundo desenvolvido. EUA, Reino Unido, Dinamarca, Itália, França — todos esses países têm legislação para impedir, por exemplo, casos como o do bispo Macedo, proprietário de igreja, grupo de comunicação e partido político.

Quem se beneficia disso é a sociedade, e não os patrões. Isso, no Brasil, é um problema para o jornalista.

Reproduzo abaixo trecho de matéria da insuspeita BBC sobre o assunto.

EUA: Foco é regulação econômica

Os Estados Unidos não têm uma Lei de Imprensa, e a regulamentação da mídia no país é feita por diferentes legislações.

No caso das telecomunicações (rádio, TV aberta e a cabo, internet e telefonia móvel e fixa), a regulação está a cargo da Federal Communications Commission (Comissão Federal de Comunicações, ou FCC, na sigla em inglês), agência independente do governo criada em 1934.

A FCC se dedica principalmente a regular o mercado, com foco nas questões econômicas. O órgão é responsável por outorgar concessões.

A propriedade cruzada de meios de comunicação é proibida. Assim, uma mesma empresa não pode ser proprietária de um jornal e de uma estação de TV ou de rádio na mesma cidade.

Há também regras que impõem certos limites sobre o número de estações de TV e rádio que uma mesma empresa pode controlar em determinado mercado. Esses limites variam de acordo com o tamanho do mercado e têm o objetivo de impedir que um mesmo grupo controle totalmente a audiência em determinado local.

No caso do conteúdo, há no país o entendimento de que este deve ser regulado pelo próprio mercado e pela opinião pública.

No entanto, a FCC age em casos de abuso, quando há a percepção de descumprimento de regras, como a que proíbe a exibição de cenas “indecentes” na TV.

Um dos casos notórios ocorreu em 2004, na exibição do Super Bowl – a final da temporada de futebol americano –, evento que costuma ter a maior audiência televisiva do país.

No show do intervalo, transmitido pela rede CBS, o cantor Justin Timberlake puxou a blusa de Janet Jackson, deixando aparecer seu seio.

Apesar de a imagem ter sido mostrada por menos de um segundo, a FCC multou a CBS em US$ 550 mil – decisão que depois foi revertida.

Outra regra determina que canais de TV dediquem pelo menos três horas semanais a programas infantis educativos.

A atuação da FCC é acompanhada pelo Congresso americano, a quem a agência presta contas periodicamente. Além disso, o Judiciário também pode intervir.

No caso de mídia impressa, a ideia é que mercado e opinião pública se encarreguem da regulação. Casos de difamação, calúnia e outros tipos de injúria costumam gerar processos na Justiça e resultar na aplicação de multas pesadas. (…)

Reino Unido: Regras duras após abusos de tabloides

Classificada pela presidente Dilma Rousseff como uma das “mais duras” do mundo, a legislação do Reino Unido para regulação da mídia surgiu na esteira do escândalo de escutas ilegais feitas por tabloides britânicos.

A lei visa à regulação da atividade de jornais e revistas. Além dela, há outra regulação, mais antiga, para emissoras de TV e rádio.

Em 2011, uma comissão judicial, coordenada pelo juiz Brian Leveson, passou a analisar desvios de ética na mídia após um escândalo envolvendo principalmente tabloides. Em um dos casos, um jornal hackeou o telefone de uma estudante assassinada e apagou mensagens da caixa eletrônica, o que deu à família e à polícia a esperança de que ela pudesse estar viva.

O relatório final do chamado inquérito Leveson afirmou que a imprensa “causou dificuldades reais e, algumas vezes, estragos na vida de pessoas inocentes, cujos direitos e liberdades foram desprezados”.

Um dos desdobramentos da investigação foi a criação, em novembro deste ano, do Press Recognition Panel, painel que supervisiona um órgão de autorregulação e tem poder de aplicar multas de até um milhão de libras (R$ 4 milhões) às publicações, além de impor direito de resposta e correções a jornais, revistas e site noticiosos.

A filiação dos veículos ao novo sistema não é obrigatória, mas há diversos “incentivos” para que façam parte: por exemplo, o veículo que não integrar o órgão precisa pagar as custas judiciais dos processos de acusação, mesmo se sair vencedor.

À época da criação do órgão, os principais jornais britânicos disseram que o modelo poderia sujeitar os veículos à interferência indevida de políticos.

Até o momento, apenas o Daily Telegraph aderiu ao novo sistema. A expectativa é que o Financial Times não se envolva, mas os outros dois grandes jornais, Independent e Guardian, deixaram a possibilidade de adesão em aberto. O órgão deve entrar em funcionanmento pleno no ano que vem.

Emissoras de rádio e TV, por sua vez, são reguladas por outro órgão, o Ofcom. O órgão também é responsável pela telefonia, serviços postais e internet.

Entre as atribuições do Ofcom estão garantir a pluralidade da programação de TVs e rádios, garantir que o público não seja exposto a material ofensivo, que as pessoas sejam protegidas de tratamento injusto nos programas, e que tenham sua privacidade invadida.