Mãe do ano: Ana Paula Sibert, mulher de Justus, e a podridão da elite. Por Nathalí

Atualizado em 11 de novembro de 2021 às 16:03
Veja a mulher do Justus
Ana Paula Siebert, Vicky e Roberto Justus em foto publicada no Instagram

A jornalista Nathalí Macedo escreve sobre Ana Paula Sibert. O que ela falou sobre dormir com a filha no lugar da babá. Ela é mulher de Roberto Justus e, portanto, rica.

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Ana Paula Sibert e a elite

É cada vez mais incontestável: rico no Brasil – mas rico mesmo, não o seu cunhado que tem medo que os comunistas tomem o celta 2005 dele – vive em um mundo paralelo. No mundo da esposa de Roberto Justus, Ana Paula Siebert, por exemplo, dormir com a filha é raridade – e sacrifício.

Na última segunda-feira, a modelo, herdeira e influenciadora – que combo, hein, amiga? – fez um “desabafo” inacreditável no instagram:

“Gente, estou acabada (…). Eu não estou acostumada a dormir com a Vicky [sua filha, de apenas um ano e meio], ela dorme com a babá, todo dia ela dorme com a babá. E aí, nesse final de semana, eu dormi com ela e, a cada vez que ela se mexe no berço, eu levanto da cama pra ver se está tudo bem (…) então eu não tive, tipo assim, horas de sono sem levantar.  Mamães me entenderão. É um desabafo de quem está cansada.”

Não, querida, mamães certamente não te entenderão. A maioria das mamães cansadas não tem uma babá à disposição 24h por dia, sete dias por semana. Por mais que você, como toda boa rica, tenha essa tendência incontrolável a fazer com que absolutamente tudo seja sobre você, não, você não faz parte desse clube.

Diferente da maioria das “mamães cansadas” brasileiras, você está com o sono e a lipoaspiração em dias. Essas mamães não pegam as crianças só pra fotografar, postar no instagram e devolver pra babá quando começarem a incomodar.

Elas fazem a parte difícil também – aliás, elas fazem sobretudo a parte difícil: elas alimentam, trocam fralda, cuidam e educam seus filhos. Eu não sou mãe, mas eu tenho mãe: a minha mãe é, antes de tudo, a pessoa que cuida de mim (e de quem, agora, eu também posso cuidar). Ela sempre diz algo que eu considero fortíssimo: “mãe é quem cria, o resto é genitora.”( e tá errada?)

Então, não, as mamães aqui do Brasil profundo não te entenderão. Por aqui, 57% das mães solo vivem abaixo da linha da pobreza (IBGE). “Sono picotado”, pra elas, é o menor dos problemas: elas ficam satisfeitas quando podem comprar iogurte pros filhos (de modo geral, é pão e água).

Cinthia Fernandes, moradora da periferia de e mãe solo de cinco crianças, é uma das mamães cansadas que certamente não te entenderiam: “Não sobra nada. É só o dinheiro para comer mesmo. Não dá para fazer muita coisa”, disse em entrevista à revista Azmina.

E você, Ana Paula? Você a entende?

Ninguém, nem mesmo outra mãe, deveria ter o direito de julgar a maternidade alheia, e eu, que não tenho filhos, quase me sinto desconfortável ao criticar a esquizofrenia insensível dessa mulher, mas a questão, nesse caso, transcende a própria maternidade.

Não estamos falando apenas de uma “mãe” que gesta a criança e depois a entrega aos cuidados de outras pessoas o tempo todo, desconhecendo, portanto, a experiência de ser mãe. Estamos falando de uma herdeira que por alguma razão acha que pode se igualar às mamães “comuns”, e se dizer tão cansada quanto elas, mesmo podendo se dar ao luxo de pagar outras mulheres para cuidarem de sua cria. Mulheres que certamente deixam seus próprios filhos em casa enquanto trabalham pra levarem o pão pra casa – que horas ela volta?

Estamos falando de uma dessas tantas sinhás pra quem algumas feministas brancas (cof cof) ainda têm, por vezes, a pachorra de cobrar sororidade. Capitãs do mato que se recusam a desceram das costas de mulheres pobres (e não raramente, negras). A questão é, portanto, política até o pescoço.

Mulheres privilegiadas como Ana Paula Siebert são algozes de outras mulheres. E são, também, vítimas da própria futilidade.

Entregam seus filhos nas mãos de estranhas enquanto fazem drenagem linfática simplesmente porque seu dinheiro lhes permite, e certamente nem sonham que os anos virão cobrar o tempo perdido, e quando notarem que nem dinheiro nem drenagem linfática preenchem esse vazio filho da p*ta que todo ser humano tem no peito, entenderão finalmente que só o afeto faz isso.

E afeto vem do cuidado. Da convivência. Você sabe, criar laços (principalmente com seus filhos, se você escolher tê-los). Elas não sabem que, quando estiverem velhas, seus filhos lhes pagarão um cuidador (ou um asilo), e nem o dinheiro será companhia.

Então, embora o abismo social entre essas duas mães seja absurdamente incômodo, embora os privilégios e a falta de noção da influenciadora só provoquem na maioria, naturalmente, fúria e desprezo,  eu preciso ser honesta ao dizer que sinto uma profunda compaixão por essas duas mães.

Por Cinthia, vítima de um país onde o filho chora e a mãe não vê, que não sabe se seus filhos comerão amanhã. E de Ana Paula, fortíssima candidata a morrer de fome de afeto – e o pior, por escolha própria.

Não é voto de pobreza de esquerdista perdido no personagem, eu juro, mas poucas coisas são tão tristes quanto ter tanto dinheiro a ponto de se desconectar completamente das coisas mais preciosas da vida: estar perto dos filhos (e mães, e pais, e irmãos, e afetos), ter amigos verdadeiros e ter noção e vergonha na cara, por exemplo.

A podridão da elite brasileira me enoja profundamente. Eu quero morrer sem conhecer o mundo paralelo dos ricos.

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