
Na manhã desta segunda-feira (13), após oito dias de desaparecimento, os corpos do repórter britânico Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira foram encontrados no Amazonas, segundo a esposa do jornalista, Alessandra Sampaio. No domingo (5), os dois saíram da comunidade São Rafael rumo a Atalaia do Norte, mas nunca chegaram ao município.
A notícia sobre o sumiço veio na segunda-feira (6). Após horas sem contato, a União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) formou uma equipe com indígenas conhecedores da região e partiu em busca dos dois, passando pelo mesmo trecho que ambos haviam percorrido. No entanto, nenhuma pista foi encontrada.
A Univaja então solicitou que instituições de segurança municipais, estaduais e federais realizassem operações de busca. Em nota, a entidade afirmou que apenas seis policiais e uma equipe da Funai (Fundação Nacional do Índio) iniciaram as procuras naquele dia. O Comando Militar da Amazônia (CMA) afirmou que ainda não havia iniciado as buscas por não ter recebido ordem do Escalão Superior.
Foi aí que começou o apelo da sociedade. O caso ganhou enorme repercussão nacional e internacional, e familiares dos desaparecidos clamaram às autoridades para que fossem empregados todos os recursos nas operações de busca.
A mulher de Dom Phillips gravou um vídeo em que implorava ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) para que intensificasse a procura por seu marido e pelo indigenista. Alessandra disse que a família ainda tinha “um pouquinho de esperança” de encontrar os dois vivos.
Indigenista foi ameaçado
Na terça-feira (7), o Estadão divulgou um bilhete anônimo, escrito há cerca de um mês, que continha ameaças a Bruno Pereira e teria sido escrito por pescadores que praticam de maneira ilegal a retirada diária de toneladas de peixe pirarucu e tracajás na região do Vale do Javari.
“Sei que quem é contra nós é o Beto Índio e Bruno da Funai, quem manda os índios irem para área prender nossos motores e tomar nosso peixe. Só vou avisar dessa vez, que se continuar desse jeito, vai ser pior para vocês. Melhor se aprontarem. Tá avisado”, dizia a carta.
Bolsonaro culpou os desaparecidos
No mesmo dia, o presidente declarou, em entrevista ao SBT News, que a incursão do jornalista e do indigenista pela Amazônia é “uma aventura que não é recomendável”, em uma tentativa de responsabilizá-los pelo próprio desaparecimento.
“Realmente, duas pessoas apenas em um barco, em uma região daquela, completamente selvagem, é uma aventura que não é recomendável que se faça. Tudo pode acontecer”, afirmou o chefe do Executivo. Foi a primeira vez que ele comentou o caso.
“Pode ser um acidente, pode ser que tenham sido executados. Tudo pode acontecer. A gente espera e pede a Deus que sejam encontrados brevemente. As Forças Armadas estão trabalhando com muito afinco na região”, completou.
Foi o governo Bolsonaro que abriu caminho para a ocupação de terras indígenas e o garimpo ilegal, permitindo que qualquer grupo atropele as políticas de proteção ao meio ambiente e aos povos e comunidades tradicionais na Amazônia.
Justiça apontou omissão do governo
Na quarta-feira (8), a Justiça Federal da 1ª Região determinou que a administração federal reforçasse as buscas no Vale do Javari, em resposta à Ação Civil Pública movida pela Univaja, juntamente com o MPF (Ministério Público Federal) e a DPU (Defensoria Pública da União), dois dias antes.
Na decisão, a juíza federal Jaiza Maria Pinto Fraxe determinou que a União efetivasse imediatamente a viabilização de helicópteros, embarcações e equipes de busca, seja da Polícia Federal, Forças de Segurança ou Forças Armadas para localizar os desaparecidos. Segundo a magistrada, a União foi omissa e falhou em seu dever de fiscalizar terras indígenas e proteger povos indígenas isolados.
ONU denunciou lentidão do governo nas buscas
O Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos disse que o governo brasileiro teve uma ação “extremamente lenta” na busca para encontrar os dois desaparecidos.
Em entrevista coletiva na sexta-feira (10), a entidade lamentou o “desdenho” na fala de autoridades e pediu que o Brasil “redobre” seus esforços e que plenos recursos sejam disponibilizados para a operação.
A porta-voz da comissão, Ravina Shamdasani, demonstrou preocupação com os “constantes ataques e perseguições enfrentados por defensores dos direitos humanos, ambientalistas e jornalistas no Brasil”.
Dom e Bruno foram vítimas de emboscada, disse testemunha
Uma fonte ouvida com exclusividade pela Amazônia Real contou que o repórter e o indigenista foram vítimas de uma emboscada. Essa testemunha fazia parte de uma equipe de 13 vigilantes indígenas que circulavam com os dois pela região do Vale do Javari, em Atalaia do Norte, no Estado do Amazonas, fronteira com o Peru.
Segundo a fonte, os indígenas alertaram sobre os riscos de Bruno e Dom seguirem sozinhos pelo rio Itacoaí. No que foi relatado, por volta das 4 horas daquele domingo, o indigenista e o jornalista avisaram que iriam conversar com o ribeirinho “Churrasco”, presidente da comunidade São Rafael.
Dias antes, eles já teriam ”esbarrado” com um outro grupo, que estava em uma embarcação considerada incomum para navegar em cursos d’água mais estreitos. Este grupo citado fez questão de mostrar que estava armado e realizou ameaças.
Cartão de saúde do indigenista e itens do repórter foram encontrados
Neste domingo (12), a Polícia Federal informou que encontrou um cartão de saúde com o nome de Pereira e outros objetos dele e de Phillips. Os bombeiros acharam também uma mochila, um notebook e sandálias no local em que estavam sendo feitas as buscas.
De acordo com a PF, foram encontrados o cartão com o nome do Bruno, uma calça preta, um chinelo preto e um par de botas do indigenista. Também foi achada uma mochila de Dom, com roupas pessoais e um par de botas.
PF ainda não confirmou morte dos dois
A esposa de Dom Phillips relatou ter recebido uma ligação da PF explicando que os corpos foram levados para a perícia. A Embaixada do Reino Unido teria comunicado aos irmãos do repórter que os corpos são de Phillips e do indigenista.
Em nota, a Polícia Federal negou que os corpos dos dois tenham sido encontrados. A associação indígena Univaja, que denunciou o desaparecimento, não confirmou.
Leia na íntegra a nota da PF:
O Comitê de crise, coordenado pela Polícia Federal/AM, informa que, não procedem as informações que estão sendo divulgadas a respeito de terem sido encontrados os corpos do Sr. Bruno Pereira e do Sr. Dom Phillips.
Conforme já divulgado, foram encontrados materiais biológicos que estão sendo periciados e os pertences pessoais dos desaparecidos.
Tão logo haja o encontro, a família e os veículos de comunicação serão imediatamente informados.