Austeridade e fáscio-jaguncismo, tudo a ver. Por Gilberto Maringoni

Atualizado em 22 de fevereiro de 2023 às 15:47
Austeridade fiscal promove corte de gastos sociais. Reprodução: Vermelho

Austeridade fiscal não é uma iniciativa episódica ou um freio de arrumação nas contas públicas. Austeridade fiscal é a forma perene de se administrar o capitalismo do século XXI através da ameaça infindável de mais cortes e mais constrangimentos aos orçamentos públicos. As políticas de austeridade fiscal são sempre brandidas pelo “mercado” e por seus representantes no aparelho de Estado como uma espécie de castigo bíblico contra o pecado capital (!) da gastança, que pode ser tanto o investimento em obras de infraestrutura, quanto o de levar comida ao prato dos miseráveis. A austeridade fiscal age como ameaça punitiva preventiva contra tentações de expansão de tarefas do Estado, como espada desembainhada sempre pronta a ser manuseada contra os inimigos da boa governança. Austeridade fiscal é a doutrina do choque aplicada à economia.

ESTAMOS EM CRISE, estamos em crise, estamos em crise e é preciso pagar por isso!

A AUSTERIDADE FISCAL é o complemento teoricamente racional ao bolsonarismo de porta de quartel, à chantagem de que se meu candidato não ganhou é porque fraude houve. O apelo positivista-jagunço à ordem equivale à criminalização de políticas fiscais expansivas. O golpismo dos ressentidos não nasceu junto das políticas de austeridade, mas a quadra histórica de esgarçamento do tecido social, fragmentação do mundo do trabalho, mas o austericismo retroalimenta a busca por soluções mágicas na esfera política.

A AUSTERIDADE COMO MODO DE GESTÃO embute um componente profundamente fatalista e mítico à gestão pública. Depois do infindável sacrifício da contenção de dinheiro, eis que os céus se abrirão e a redenção do crescimento, do emprego e do dinheiro no bolso surgirá por encanto. O austericismo nos levará a uma solução mágica equivalente à do sebastianismo fardado resultante de vigílias coletivas por 7 dias e 7 noites em frente às tropas enfileiradas ou do socorro que virá dos ETs conectados aos celulares em nossas cabeças. A partir daí, o fogo purificador do golpe nos conduzirá à vida eterna.

AUSTERICÍDIO E FASCISMO caminham, pois, de mãos dadas. Ambos clamam por soluções não-racionais, não institucionais e não-democráticas. Pinochet (e Milton Friedman) cantaram a pedra há quase meio século: é impossível estabelecer políticas alucinadamente liberais na economia sem romper com a democracia. É preciso queimar pneus, é preciso bloquear estradas, é preciso vaiar Gil, é preciso metralhar alunos e professores em sala de aula, é preciso matar petralhas, é preciso escrever editoriais ameaçadores, é preciso manter o teto, é preciso privatizar, é preciso escrever cartas com conselhos arrogantes a Lula, é preciso lembra-lo que assim ele não vai governar, é preciso lembrar de fazer todos esquecerem as 700 mil mortes, é preciso, é urgente fazer alguma coisa!

AS POLÍTICAS DE AUSTERIDADE – com seu entulho modernizante de teto de gastos, responsabilidade fiscal, superávit primário, entre outras pérolas – são formuladas a partir da teoria econômica do celular na cabeça. E ai dos que não se enquadrarem em suas tábuas da lei: serão condenados ao déficit eterno e à eliminação do mercado, o nirvana dos bobos. Vigiar e punir é pouco. Austeridade e fascismo significa punir e punir em busca da redenção nas quatro linhas de qualquer coisa que surja a cada momento.

Tudo o mais é populismo, e será condenado aos infernos!

Participe de nosso grupo no WhatsApp, clicando neste link

Entre em nosso canal no Telegram, clique neste link
Gilberto Maringoni
Gilberto Maringoni, professor de Relações Internacionais da UFABC e candidato do PSOL ao governo de São Paulo, em 2014