Como Janja usa a moda como forma de promover inclusão e sustentabilidade. Por Nathalí

Atualizado em 6 de janeiro de 2023 às 14:16
Janja e Lu Alckmin sobem rampa do Congresso Nacional durante posse do presidente Lula (PT). Foto: Bruno Spada

 

Falar sobre a roupa de uma primeira-dama é considerado por muitos progressistas uma futilidade – inclusive por mim.

No caso de Janja, entretanto, a história muda: no evento de posse do marido, ela usou uma roupa produzida por bordadeiras que sustentam um terço da pequena cidade de Timbaúba dos Batistas, no Rio Grande do Norte.

A Cooperativa das Mãos Artesanais de Timbaúba dos Batistas engloba cerca de 800 bordadeiras, e cinco delas criaram os detalhes da roupa usada por Janja na posse de Lula.

Em parceria com a estilista brasileira Helô Rocha, as bordadeiras também foram responsáveis pelo vestido de noiva de Janja, que tinha como tema o luar do sertão, com bordados de fases da lua, estrelas, mandacarus e xiquexiques (plantas do semi-árido).

Quando escolhemos nossas vestimentas, damos a ela um significado: escolhemos também uma forma de expressar nossa identidade, nossas preferências mais individuais, nossos anseios e nosso auto olhar.

Nunca antes uma primeira-dama encomendou uma roupa com bordadeiras do nordeste.

“Antigamente a tradição era passada de mãe pra filha, mas está sendo esquecida”, disse a bordadeira Valdineide Dantas, e não há nada de espantoso nisso:

A única tradição que interessou às primeiras-damas anteriores a Janja (vide Michelle Bolsonaro e Marcela Temer) é a tradição de usar roupas de grife caríssimas como forma de demonstração de status, vestidos pudicos, roupas discretas e sem expressão, simbolizando o próprio papel dessas mulheres nos governos de seus respectivos maridos.

Como já dissemos, Janja é gente nossa, e gente nossa não liga pra status. Gente nossa sabe que chique é valorizar o regional e o pequeno produtor.

Olhar, portanto, para o look de Janja não é futilmente falar sobre uma roupa: é compreender que todas as nossas escolhas de consumo fazem diferença para a coletividade.

Comparada a Michelle Bolsonaro – que assumia um estilo pudico, marcado pelos preceitos evangélicos, a fim de passar uma impressão de “ajudadora do marido”, objeto decorativo no palanque, ou no máximo marionete para tentar conquistar o eleitorado feminino, Janja também consegue falar através de seu estilo, deixando um recado claro de empoderamento feminino.

Janja se recusa a ser a mulher-troféu, a mulher cara que vive à sombra do marido. Ela prefere, através de suas escolhas mais simples – como uma roupa para um evento importante – promover a inclusão de outras mulheres e valorizar o regional, e nos prova que isso em nada diminui sua elegância, muito pelo contrário.

Nesta nova Era, elegante não é usar a roupa mais cara, da estilista mais renomada: é tornar a moda um ato político.

Como se não bastasse, Janja rompeu com a tradição que ditava o uso de saia ou vestido pelas primeiras-damas, desafiando uma tradição patriarcal nunca antes enfrentada.

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Nathalí Macedo
Nathalí Macedo, escritora baiana com 15 anos de experiência e 3 livros publicados: As mulheres que possuo (2014), Ser adulta e outras banalidades (2017) e A tragédia política como entretenimento (2023). Doutora em crítica cultural. Escreve, pinta e borda.