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Por Francisco Teixeira, professor titular de História na UFRJ e ex-professor da rede municipal de Educação do Rio de Janeiro
Durante a campanha eleitoral de 2022, o então candidato Lula prometeu um “revogaço” das medidas antipopulares, da Era Temer-Bolsonaro. Entre tais reformas consta a Reforma do Ensino Médio, conhecida como “Novo Ensino Médio”, onde constam dois pontos, de difícil aceitação, por parte dos especialistas em Educação: de um lado, obrigar os estudantes a uma escolha precoce de uma carreira, desconectada de um conhecimento real de seu futuro campo profissional.
Ora, hoje, nas universidades públicas do país, se discute formas de flexibilizar a admissão direta numa carreira visando diminuir o abandono/trancamento/desistências, em especial nos semestres básicos – hoje na casa dos 25% de todos os admitidos anualmente na universidade.
Assim, se vemos um forte abandono – que custa extremamente caro ao Estado fornecer Educação de Qualidade, que não resulta na formação do estudante – na faixa etária de 18-21 anos, média nos três primeiros semestres universitários, imagine-se se tal escolha se der aos 14-15 anos de idade? Por outro lado, para introduzir disciplinas alienígenas – quase todas de formação com baixa remuneração no mercado de trabalho – o currículo se propôs, e está em curso, eliminar de vez disciplinas como História, Filosofia e Sociologia.
Ora, temos aqui uma declaração nítida, das autoridades, que tais disciplinas são “desmobilizadoras”, chatas e desnecessárias – exatamente por um Governo que reclama a inspiração de Anísio Teixeira e Paulo Freire. Mas, o interessante, é o senso comum de que o “brasileiro não tem memória”, ou o “brasileiro não sabe votar”, tão comumente repetidos.
É nesse contexto que o MEC quer privar os adolescentes brasileiros de sua própria História, a formação social e racial da sociedade, os atropelos e glórias de tudo que foi feito para que o Brasil seja o Brasil que conhecemos hoje.
Da mesma forma, com uma rapidez estonteante, o fascismo/nazismo cresce no país, as escolas são alvo do ódio e a violência se torna endêmica entre adolescentes. Mas, o MEC – quase ecoando Bolsonaro – afirma que os alunos têm muito “conteúdo” teórico para estudar. Assim, a Escravidão, o Tráfico Negreiro, os racismos e o Holocausto nazista não serão mais ensinados nas escolas brasileiras.
É assim que o MEC quer formar os jovens cidadãos no país. Afirma, de forma falaciosa, que a revogação do Novo Ensino Médio não é possível, posto que se voltaria ao passado e o regime anterior era muito ruim. Não é verdade, “Ruim” é, e vai continuar sendo, a infra-estrutura das escolas, a ausência de laboratórios digitais, de grupos de livre associação para GTs de teatro, literatura, jornalismo, além da inexistência de laboratórios para o estudo de Química, Biologia e Física. Claro, é péssima a remuneração de professores, obrigados a trabalhar em “duas matrículas” – Estado e Município – além de uma ou duas escolas particulares para poder sobreviver.
Nada disso consta do NEM. Nenhuma palavra sobre isso, mesmo que cerca de 85% dos professores do país tenham votado em Lula para presidente porque, enfim, teríamos uma escola menos “bancária” – de alunos passivos, sentados em bancos escolares.
Criou-se uma mítica que as melhores escolas e de melhor desempenho estão no Nordeste, o que habilitaria o Ministro da Educação a manter o projeto herdado de Temer-Bolsonaro. Não é verdade, basta consultar o Google. As melhores escolas de ensino médio no Brasil são escolas federais – os colégios militares, os colégios de Aplicação, das universidades federais e os Cefets, além dos colégios de Aplicação das universidades estaduais – onde a infra-estrutura é muito melhor, os professores melhor pagos e a permanência do aluno na escola é bem maior. E tudo isso com o currículo pré-Temer.
A mudança foi autoritária, conduzida sem o debate com especialistas, com estudantes, com professores e com as famílias. Não deveria ser continuada, e muito menos privar os estudantes de uma formação humanista, emancipadora e capaz de fortalecer o sistema democrático no país, a partir de um conhecimento crítico – afinal, são estes os objetivos do Governo Lula? Mas, quem no futuro saberá que houve um homem, que saiu dos grupos mais subalternos da sociedade para mudar o Brasil? Sem a História os adolescentes não saberão, no futuro, quem foi Lula da Silva? Teremos apenas robôs, fazedores de brigadeiros e bolos em pote, que não saberão sequer, que é possível mudar o país.