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A batalha de Aras pela anistia. Por Milton Blay

O procurador-geral da república, Augusto Aras
Foto: Reprodução

Por Milton Blay

Em um enésimo artigo brilhante, o filósofo Vladimir Safatle, membro fundador da Comissão Arns, assina “Anistia, Nunca Mais”, um apelo em forma de advertência para que o Brasil possa, enfim, superar os anos sombrios da ditadura e os quatro anos do fascismo bolsonarista.

“No final da ditadura militar”, escreve Safatle, “setores da sociedade e do governo impuseram o silêncio duradouro sobre crimes contra a humanidade perpetrados durante os vinte anos de governo autoritário. Vendia-se a ilusão de que se tratava de astúcia política. Um país “que tem pressa”, diziam, não poderia desperdiçar tempo acertando contas com o passado, elaborando a memória de seus crimes, procurando responsáveis pelo uso do aparato do Estado para prática de tortura, assassinato, estupro e sequestro. Impôs-se a narrativa de que o dever de memória seria mero exercício de “revanchismo”.”

Na época, a palavra de ordem era deixar de olhar pelo retrovisor para assim esquecer o passado e construir um futuro radiante e harmônico. Sem levar em conta que um país que não pune os seus criminosos está condenado a cometer novamente os mesmos crimes. Assim aconteceu com o Brasil, submetido nos últimos quatro anos a um governo que transformou torturadores em heróis e as polícias em máquinas de extermínio de pobres, de preferência negros.

Repetindo Safatle, “não existe “superação” onde acordos são extorquidos e silenciamentos são impostos.” Com anistia, nada se constrói.

“O Brasil sempre anistiou o que não se anistia e pagou caro por isso. Manifestações com saudação nazista, membros da polícia ajudando golpistas, deputada armada ameaçando a população: a cadeia os espera; isso não quisermos cometer o mesmo erro duas vezes.”

O filósofo defensor dos Direitos Humanos, da nossa democracia tão combalida, espera do futuro governo duas atitudes: 1) que coloque na reserva o alto comando das Forças Armadas que chantageou a República; e 2) que responsabilize os policiais que atentaram contra eleitores brasileiros, modificando a estrutura arcaica e militar da força policial.

A Frente Ampla terá de agir. Estas duas condições serão necessárias para que o Brasil retome o caminho da democratização, mas não serão suficientes. A superação da destruição bolsonarista tem outras exigências. Será preciso, antes de mais nada, mobilizar a sociedade civil para a exigência de memória, e portanto de Justiça. Como fez e continua a fazer a Alemanha pós 2° Guerra. Ou como começa a fazer a França, potência colonizadora, com relação à Argélia.

Muito embora a situação exija urgência, estamos longe de tomar consciência do dever de memória. O novo governo terá pouquíssimo tempo, talvez dois, três meses, para iniciar o dificílimo trabalho de combate à indulgência. A sociedade brasileira não está acostumada a exigir os seus direitos.

Outra condição sine qua non para se evitar a tentação da anistia será criar as condições judiciais para que os responsáveis por crimes hediondos como os cometidos durante a pandemia sejam condenados e devidamente punidos.

Será preciso eliminar um dos principais fatores que até hoje bloquearam a Justiça de avançar. E um deles tem nome e sobrenome; Augusto Aras, pseudo-procurador-geral da República. Pseudo ou poste, como é comumente conhecido e enxovalhado em praça pública. Aras, e sua fiel escudeira bolsonarista Lindôra Araújo, que ganhou a vice procuradoria depois de ter pedido o arquivamento das investigações do capitão sob o argumento de que não havia provas científicas de que as máscaras protegiam contra o coronavírus, tiveram até hoje um só e único objetivo: evitar que a PGR cumprisse o seu dever de representar a sociedade. Ambos foram meros advogados, além de tudo medíocres, da família Bolsonaro e seus asseclas. Agiram como se estivessem a mando do Palácio. Assim atuaram nos últimos quatro anos, assim continuam a atuar a um mês do fim do mandato presidencial.

Em carta assinada por 184 integrantes do MPF, Aras foi cobrado a apurar envolvimento e omissão de autoridades do governo nos atos golpistas registrados no país. Para os procuradores, a investigação da relação de autoridades com os movimentos responsáveis por esses atos é fundamental, bem como o pedido de instauração de inquérito policial para apurar a ação criminosa dessas autoridades que gozam de foro privilegiado.

Aras respondeu, convocando uma reunião de procuradores de seis Estados para discutir a questão. Conversou com o ministro da Justiça e concluiu: Os governadores que encontrarem dificuldades para acabar com os atos golpistas poderão pedir a presença da Força Nacional, ou seja das forças armadas.

O Ministério Público mostrou assim de que lado está: ao invés de cumprir o seu papel optou por colocar lenha na fogueira.

Conclusão: até setembro de 2023, quando termina o mandato de Augusto Aras, o próximo ministro da Justiça terá muito trabalho para por o Ministério Público no lugar de onde nunca deveria ter saído, ou seja, no Poder Judiciário, como a voz do povo na defesa das leis, da Constituição, no patrulhamento das autoridades. Isto porque, desde o primeiro dia do governo Bolsonaro, o PGR tem agido como um instrumento do governo, agindo sempre na defesa do Executivo. Evidentemente, se Augusto Aras não tiver a hombridade de renunciar. É o mínimo que se deve esperar de alguém que amanhã será tratado como cúmplice, entre outras coisas, de 400 mil vítimas do Coronavírus. Mas Aras não é homem de renunciar, prefere prevaricar.

Tenham certeza, o carrancudo poste lutará pela anistia até o último suspiro.

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