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A cascata de Doria sobre a privatização do Ibirapuera. Por José Cássio

“Fica tranquilo que o ingresso vai ser baratinho”

 

Como bom publicitário, o futuro prefeito de São Paulo, João Doria, sabe bem as vantagens que uma empresa privada teria ao receber a administração de um parque como o Ibirapuera, zelando pela sua manutenção em troca de explorar a publicidade, os quiosques de alimentação e eventos de pequeno porte.

Já com relação ao potencial do Parque de Vila Brasilândia, um colosso de 300 mil metros quadrados com remanescente de mata nativa, corregos, nascentes e quedas d´água, além de várias espécies de animais silvestres, cercado casinhas sem acabamento, e um mar de pobreza, no extremo norte da cidade, ele parace não tem tanta certeza assim.

Essas são as contradições apontadas pelo vereador Ricardo Young para alguns dos programas anunciados por Doria na sua primeira semana como prefeito eleito de São Paulo.

“Em princípio não sou contra as PPP´s, mas ele está indo com muito apetite no filé. Por que o Ibirapuera?”, pergunta Young, que disputou a prefeitura pela Rede.

Concessões, ou parcerias público privadas, existem para permitir que o poder público transfira a manutenção do espaço ou mobiliário urbano para empresas, enquanto elas ganham o direito de explorar comercialmente os locais.

Com a Cidade Limpa, que ordena a paisagem de São Paulo, cresceu o interesse das empresas em participar desses editais, uma vez que a Lei acabou com o rico mercado de publicidade em outdoors.

O modelo já acontece com os abrigos de pontos de ônibus e os relógios de rua, mas está sendo contestado pelo TCM e na Câmara por vereadores como Ricardo Young.

“Nestes dois casos, dos abrigos e dos relógios, o que aconteceu é que a prefeitura se isentou da responsabilidade da manter e implantar novos e as concessionárias só vão até os locais onde há interesse comercial”, diz Young.

“E nem falo da periferia. Nos bairros a população não dispõe de nenhum recurso para tomar o transporte coletivo, pois nem a prefeitura, muito menos as concessionárias, estão preocupadas em instalar novos ou mesmo readequar e manter os já existentes”.

Segundo o vereador, as concessionárias estão “inadimplentes” com o contrato.

“O que era um projeto interessante para substituir o mobiliário urbano acabou virando um modelo de negócio de publicidade”, diz Young, “E, pior: está abrindo precedente para outras iniciativas, uma delas a publicidade em bancas de jornais, com o propósito de burlar a Lei Cidade Limpa”.

Young vê a iniciativa de João Doria de conceder o Ibirapuera como puro oportunismo. Segundo ele, o parque é um dos poucos que recebe manutenção adequada da prefeitura.

“Entregar logo de cara o filé é um absurdo”, critica. “Está aí uma iniciativa que alguém que busca um investimento sem risco sempre sonhou”.

De acordo com o vereador, as parcerias público privadas devem ser secundárias – não o foco central da gestão.

“Se ele estivesse falando numa PPP para explorar o recém-criado Parque do Jóquei, na Vila Sônia, o dos Búfalos, na zona Sul, ou mesmo o de Vila Brasilândia, na zona Norte, até dava para entender, mas ir direto no Ibirapuera é acelerar além da conta, chega a ser perigoso”, diz o vereador da Rede

Em relatório que está sendo apreciado pelo TCM, o Conselheiro João Antonio julgou o edital da concessão dos relógios e pontos de ônibus, vencido pela JCDecaux e Publicrono, que formam a concessionária A Hora de São Paulo, irregular em pelo menos um item.

Não exatamente os pontos levantados por Ricardo Young, que é a instalação do mobiliário apenas nos locais onde há interesse comercial, deixando na chuva usuários dos bairros menos valorizados, mas a incorreta definição do valor do contrato e da outorga e a irregularidade do critério do edital.

O conselheiro reitera a opinião da auditoria que aponta que os valores para veiculação de propaganda no mobiliário não levaram em consideração que, com a Lei Cidade Limpa, existia uma demanda reprimida por propaganda externa em São Paulo.

Como estamos carecas de saber, o mercado de publicidade externa é gigantesco e rico, como rico é potencial de consumo dos frequentadores do Ibirapuera – algo em torno de 300 mil pessoas todas as semanas.

Caberá ao prefeito eleito, como bom marqueteiro que é, explorar esse filé, porque conhece o potencial do negócio, mas a ele competirá também a responsabilidade de promover a equidade entre as vantagens e as obrigações da iniciativa privada na tomada do patrimônio dos paulistanos.

Nesse aspecto, faz sentido a preocupação de Ricardo Young quanto ao fato de, logo na primeira semana, Doria abrir o sorriso para contar que o primeiro a ser entregue é o cartão postal da cidade.

Se o caso dos abrigos de ônibus puder servir como referência, convém aos paulistanos ficarem de olhos bem abertos, pois o fim dessa história pode ser mais uma cascata sem efeito prático para as pessoas e na medida para encher os bolsos de empresários que adoram o lucro sem risco.

Jose Cassio

JC é jornalista com formação política pela Escola de Governo de São Paulo

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