Sobre a crueldade da Gol com a família de Deborah Colker

Atualizado em 21 de agosto de 2013 às 10:28

Porque tratar passageiros como lixo não dá em nada.

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Theo com a mãe, Clara, a avó, Deborah e o cenógrafo Gringo Cardia

O constrangimento a que foram submetidos a coreógrafa Deborah Colker, sua filha Clara e o neto Theo é sintoma de como as companhias aéreas encaram os passageiros: basicamente, como lixo.

Num avião que seguia de Salvador para o Rio, uma funcionária abordou a família, exigindo um atestado médico do menino. Theo sofre de uma doença chamada epidermolise bolhosa, não contagiosa. A pele, muito sensível, fica com bolhas e úlceras. O piloto avisou que não decolaria sem o documento. Policiais federais foram acionados. Tudo diante dos demais passageiros, que ficaram chocados.

Theo tem 3 anos. 3 anos. A mãe, Clara, contou a história em sua página no Facebook. Eu reproduzo o post no final deste texto.

Deborah afirma que a abordagem da tripulação foi “totalmente deselegante e despreparada”. A Gol faz isso porque pode. Vale o mesmo para a Tam. Elas formam um duopólio que faz com que você esteja obrigatoriamente na mão delas. A Tam tem 40% de participação no mercado, contra 36,3% da Gol. O resto é da Azul e da Avianca.

A Tam vende uma imagem pseudo-sofisticada para otários como nós. A revista de bordo, pretensiosa, sempre com um artista que voa de jabá na capa, repleta de erros grosseiros, é um contraste com a tortura da poltrona. A Gol, pelo menos, parou de contar aquela lorota de que era low cost.

“Não há espaço para a discussão de mais concorrência”, disse o presidente da Gol, Paulo Kakinoff, no ano passado. Como assim? As quatro empresas apresentaram agora um pedido ao governo para isenção temporária de tarifas. A culpa é da alta do dólar. Seria a única saída para não aumentar as passagens.

Kakinoff ligou para Deborah para se desculpar pelo ocorrido. A Gol soltou um comunicado atestando que sua intenção era “assegurar o bem-estar de todos os passageiros a bordo”. Também cravou que “cumpriu rigorosamente as recomendações do Manual Médico da IATA (sigla em inglês da Associação Internacional de Transportes Aéreos) e da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)”. Deborah mantém a decisão de entrar com um processo.

Companhias aéreas costumam frequentar as listas de empresas mais odiadas do mundo. Isso em países onde você pode optar entre mais de meia dúzia de nomes. No Brasil, você é obrigado a odiar as duas de sempre. Em compensação, tem direito a ver shows de prepotência, arrogância, crueldade e burrice.

O relato de Clara Colker, mãe de Theo, no Facebook:

“Saímos na sexta-feira do Rio para Salvador, pela Gol, sem o menor problema.

Na volta para o Rio, no Check-in a moça me perguntou o q havia com meu filho.

Falei q tinha Epidermólise Bolhosa, um problema de pele. OK. Seguimos para nosso portão, em direção à aeronave.

Passamos pela polícia, novamente pela atendente da Gol. Td OK.

Estava sentada ao lado da minha mãe e do meu filho dentro do avião, …já nos nossos assentos, td ok, acomodados. Meu marido sentado na mesma fila no outro lado do corredor, bem pertinho da gente.

Um funcionário veio até mim e perguntou: – vc tem atestado?

Falei: – do q? Ele disse: – Disso (apontando para meu filho). Do médico da criança. (apontando na cara do meu filho).

Falei: – ele está bem, tem um problema genético, de pele. sou mãe dele e responsável por ele. ele está bem e pode viajar.

A abordagem foi super esquisita, meio agressiva, totalmente indelicada mas me controlei…

Insatisfeito, o funcionário foi até a cabine. Voltou uma mulher, outra funcionária. O constrangimento começou a piorar. Falei em tom já ríspido:

– Ele eh o meu filho tem epidermólise bolhosa e não tem problema nenhum em viajar. sua doença não eh contagiosa e ele está bem.

Ja viajei inúmeras vezes c/ ele para dentro e fora do Brasil. Nunca passei por isso. Basta olhar para mim, p/ pai e para a avó q vivem agarrados nele e não têm nada na pele.

Mesmo assim, a funcionária como se não estivesse ouvindo o q eu falava, dizia ainda na frente do meu filho:

– precisa de um atestado médico dessa criança senão ele não poderá viajar neste voo!

(eu pensava: pq escolheram meu filho! qual o critério para essa abordagem?????)

Neste instante falei p/ Pedro (meu marido) filmar o q ela ia dizer. Na hora, ela disse q não falaria se fosse filmada e q não poderíamos filmar. Na frente da câmera ela não falaria conosco.

Neste instante uma mulher a 3 filas de distância da nossa grita p/ mim: – chama o Ministério Público! Isso eh preconceito e discriminação!

Comecei a chorar. Já estava mt nervosa. O Theo vendo isso tudo. Surreal. O avião todo já participando da situação, as pessoas nos olhando.

Um constrangimento inacreditável. Meu filho me olhando, uma criança de 3 anos passando por isso. Aquele avião fechado, as pessoas sem sair nem entrar, tudo em torno da gente.

A funcionária saiu. Ficou 10 minutos fora. Jurava q o avião seguiria viagem e ainda pensei: deviam vir pedir desculpas p/ Theo e para mim…

Volta a funcionária dizendo q o avião só vai partir com aval de um médico. As pessoas começaram a se manifestar.

Minha mãe q até então estava controlada, se levantou e disse:

– agora me tiraram do sério! Estava tentando me controlar mas não dá! Isso não existe! O que estão fazendo com meu neto!

(Foi ficando pior. Inacreditável. Só ia crescendo a implicância com o Theo, o incômodo. meu aperto ali. desumano o q estava acontecendo.

Afinal de contas, meu filho passaria por uma análise de um médico q iria até nosso assento para avaliá-lo! Surreal! E a situação para uma criança de 03 anos?!

Como assim! Já tinha dito o q ele tinha!

Qd o médico da Infraero entrou no avião minha mãe estava lá na frente da aeronave, discutindo na cabine, e fui até o médico tb, falamos:

– ele tem uma deficiência genética! Epidermólise bolhosa!

E o médico fala:

– Ah… Epidermólise bolhosa! Não tem problema nenhum o menino viajar! é uma doença de pele…

senti até o médico constrangido! com vergonha da situação.

o médico foi acionado por uma situação de emergência, como se estivesse indo socorrer um passageiro q estava passando mal dentro do avião.

Nesse momento, a Polícia Federal tb estava na porta do avião, dois agentes foram acionados; querendo retirar minha mãe, meu filho, eu e meu marido do avião e disse q tinha q cumprir ordens da empresa aérea GOL.

Fiquei mt irritada e falava q naquela tripulação só tinham ignorantes, agressivos. Minha voz mudou, fiquei fora de mim. mal. fiquei leoa, tava mt chateada com o q estavam fazendo com o meu filho.

Nunca senti uma coisa tão ruim. Um preconceito e discriminação tão grande. Em 04 anos q sou mãe do Theo, já sofri à beça, demais. Ando na rua já acostumada a ser bombardeada por olhares curiosos mas nunca tinha sentido uma agressão, violência mesmo, tão grande com ele. o dedo na cara dele, sem a menor piedade. nenhum funcionário daquela tripulação pensou no constrangimento q estavam proporcionando àquele menino de 03 anos. ninguém pensou no peso q estavam colocando na cabeça daquela criança, que é meu filho!

O cenário dentro do avião era: quase tds passageiros em pé, totalmente indignados, vindo falar comigo, com meu filho. Mt solidários. Super chateados com a atitude da tripulação da GOL.

Mts tinham conexão e estavam perdendo suas conexões.

Ja tinham uns 40 min de atraso e o circo ainda estava montado.

O médico foi falar com o comandante. Disse q estava td OK q o Theo podia viajar numa boa.

Mesmo assim o comandante, frio e grosseiro, disse q nós só viajaríamos se apresentássemos um atestado médico por escrito.

Uma outra médica, passageira, q participava da discussão na frente do avião, tb foi falar com o comandante, esclarecer que o menino tinha EB e q estava td certo com ele…

Mas o comandante queria o atestado!

Meu marido sugeriu que o médico da INFRAERO fizesse um atestado, de próprio punho, ali dentro do avião.

O médico andou em direção a meu filho, olhou ele a cerca de uns 3 metros de distancia, durou menos de 10 segundos a análise dele, retornou e deu atestado em um papel qualquer branco sem nada timbrado.

O médico estava sem o carimbo (afinal de cts veio por uma emergência, para socorrer o suposto paciente q passava mal na aeronave, uma situação de emergência).

Então, tivemos q esperar mais 20 minutos para q o médico trouxesse o carimbo para finalizar o “atestado”.

Minha vontade era descer do avião na hora estava com nojo, com receio;

qd disse – quero sair daqui…

a mesma mulher, a primeira a gritar sobre o Ministério Publico, disse q se nós saíssemos do avião tds desceriam conosco.

Que todos estavam com nossa família. Me sensibilizei demais.

Estavam TDS as pessoas do avião super solidárias, preocupadas com o constrangimento com o Theo. Vinham fazer carinho nele, brincar com ele e falar comigo.

Resolvi ficar no avião. Nisso já passava 1hora de atraso e o constrangimento muito grande. Theo me viu chorando de novo.

Tentei disfarçar q o avião não estava atrasado por causa dele… sei q ele percebeu. impossível não perceber.

Duas meninas vieram até mim com 3 papéis na mão, nos papéis tinham os nomes, telefones e e-mails de tds q estavam sentados nos assentos, um pouco afastados de nós e solidários com a causa, dizendo q qq coisa q precisássemos, poderíamos contar com eles.

O comandante avisou q o avião iria partir. Voamos para o Rio.

Chegaria no Rio 13h50. Chegamos no Rio às 16h10.

No táxi, no caminho de casa, perguntei:

– Theo, vc viu o q estava acontecendo no avião?

Ele respondeu:

– Tava todo mundo olhando pra mim, falando de mim.

Falei:

– filho, só aquelas poucas pessoas chatas falavam de vc, da sua pele, todos os outros do avião foram nossos amigos.

Ficaram do nosso lado, com a gente.

Fazendo esse relato, tenho ainda mais dimensão do que aconteceu. Parece cena de filme, parece irreal. Não dá para aceitar que isso foi feito com o Theo.

Não dá para admitir tamanha desumanidade (se é q existe essa palavra!). Tem um lado q é minha dor de mãe, de ver meu filho, minha cria, viver isso. Racha meu coração.

Tem outro lado cidadã q não acredita q vivenciou essa situação. Preconceito puro, rasgado. Na cara!

Meu filho tem machucados pelo rosto. Sua imagem desperta curiosidade, atenção, olhares como qq um outro q não se encaixa nos padrões. Mas e aí?! Qual é o problema disso?

Penso q por ter tais fragilidades deva ser recebido pela sociedade com respeito, amor, zelo, carinho. Além disso é uma criança. Enquanto estou aqui colocando minha raiva para fora, verbalizando essa situação, ele está com ela dentro dele. sem “colocar para fora”, sem exorcizar essas angustias… Como é isso? q danos tem isso para ele? como será viajar de avião novamente? ele irá enfrentar?

Como será estar num ônibus, em um local fechado? Ele vai se sentir como? Depois de ter passado por um avião inteiro, cheio de gente, no maior rebuliço olhando para ele, gritando seu nome, gritando as palavras: doença, pode, não pode, o q é q o garoto tem?! Eu não sei. Eu tô me sentindo muda, angustiada, presa num presente q me dá medo do futuro.

Nunca imaginei uma empresa fazer isso com alguém. Nunca imaginei uma empresa fazer isso com uma pessoa. Nunca imaginei uma empresa fazer isso com uma criança de 03 anos. Theo faz 04 anos depois de amanhã (quarta-feira).

A indicação para alguém q tem Epidermólise Bolhosa é levar uma vida normal, a mais normal possível. Meu filho vai à escola, tem amigos, brinca, uma família q o ama mais do que tudo.

Pessoas que lhe tratam com mt amor. A vida dele por si só é sofrida para caramba. O banho é desesperador. Comer dá trabalho, as coceiras à noite, curativos diários e constantes etc, etc etc…

Tudo o q ele precisa é de respeito, carinho, cuidado. Não só ele como qq portador de EB. Lidar com a estética deles já é difícil pois tem machucadinhos em todo o lugar do corpo.

é uma doença rara mas q mt gente tem e tem milhares de sites na internet, no wikipidia, etc. é mt fácil saber sobre a doença. Nunca que Theo deveria passar por isso.

Ele chegou em casa 3 horas depois do previsto, deixou de tomar os remédios na hora certa, não almoçou. Se coçou à beça durante o voo. Um voo q duraria 02 hs durou 4hs.

Meu filho foi discriminado, violentado verbalmente. Sofreu preconceito por ter sua pele diferente.