A dura vida de um editorialista

Atualizado em 26 de maio de 2013 às 16:54

NÃO É FÁCIL A VIDA DE  editorialista.

Foi o que me ocorreu ao ler o editorial em que o Estadão declara seu apoio a Serra. Não que apoiar Serra seja um problema. É que é penoso escrever um texto que reflete não o que você pensa, mas seu patrão.
Papai foi, nos anos 60, editorialista da Folha. Um dia, no fragor de uma greve de fome de presos políticos, Frias ordenou a ele que escrevesse um editorial sobre o assunto. A tese que Frias defendia era que não havia presos políticos. Todos eram presos comuns. Papai não topou escrever isso.

Papai era assim.

Me pergunto se o autor do editorial realmente acredita no que escreveu. O editorial fala, por exemplo, na “escandalosa deterioração moral do governo”. O PT, no campo dos costumes políticos, não é melhor que os outros, ao contrário do que afirmava antes de chegar ao poder com ares virginais. Mas pior também não é.

Faz, basicamente, o que todos fazem: nomeações de amigos, alianças oportunistas, atritos com a imprensa diante de críticas etc. A grande diferença do PT, em seus oito anos de poder, foi uma atenção bem maior que a habitual aos pobres. Daí a extraordinária popularidade de Lula e a virtual vitória de Dilma.

Desde Getúlio Vargas, com uma breve interrupção em João Goulart, os governos no Brasil olharam muito mais para os ricos do que para os pobres. O símbolo maior disso são as consultas cerimoniosas feitas por sucessivos governantes a Roberto Marinho, da TV Globo.

Os pobres retribuem a Lula com o que podem dar: seu apoio e seu voto.

A oposição a Lula precisa entender melhor as razões de seu sucesso para depois combatê-lo. No editorial, o Estadão diz que Lula “se autoglorifica”.  Serra não, com a sua aborrecida cantilena dos genéricos e outras coisas com as quais diz ter mudado a vida dos brasileiros? E o próprio Estadão, que no editorial destaca “todo o peso da responsabilidade à qual nunca se subtraiu em 135 anos de lutas”? E Marina com sua “Onda Verde” miraculosa? E Plínio com sua pose pedante de único puro no meio de corruptos?

O PT ruma para um terceiro mandato menos por seus méritos na presidência — embora os haja, a começar pelo foco na pobreza — e mais pelos defeitos da oposição.

Entre as coisas boas que a carreira me trouxe está a de nunca, ao contrário de papai, ter sido editorialista. Quanto a este do Estado, coloquei no Facebook minha intuição segundo a qual ele trará aproximadamente zero votos a mais para Serra. Um amigo emendou: “Talvez menos …”