Para Joaquim Barbosa, os Estados Unidos são uma coisa vaga que atende, basicamente, a suas conveniências do momento.
Num congresso de jornalismo, ele citou os americanos ao se referir, mais uma vez, ao caso da funcionária que ele tentou retirar do STF por alegado conflito de interesses.
A funcionária, como se sabe, é casada com um repórter do Estadão com quem JB teve uma encrenca pública. JB mandou-o “chafurdar no lixo” depois que o jornalista noticiou gastos de 90 000 reais em dinheiro público na reforma nos banheiros do seu aposento funcional de presidente do STF em Brasília.
JB fracassou em afastá-la do STF. Ela está lotada no gabinete de Lewandowsky, que não viu sentido no pleito de JB e a manteve. Se conheço a alma humana, Lewandowsky aproveitou para vazar a tentativa frustrada de vingança.
Nos Estados Unidos isso não aconteceria, voltou a afirmar Barbosa ao se referir ao caso.
Bem, primeiro e antes de tudo, “conflito de interesse”, a rigor, existiu na tentativa de JB de prejudicar a mulher do jornalista. Ele tentou usar seu poder como presidente do STF para uma vendetta pessoal.
Mas, muito além disso, se a referência são os Estados Unidos, JB não tem muito do que se gabar.
Nos Estados Unidos, um presidente do STF patrocinaria – com dinheiro público, sempre – uma viagem de jornalistas apenas para que eles fizessem matérias laudatórias sobre ele? Lembremos: a viagem – para a Costa Rica – foi feita num avião da FAB.
Que aconteceria, nos Estados Unidos, se um presidente do STF fosse flagrado comprando um apartamento com uma pequena trapaça para sonegar impostos? E se ele arrumasse emprego para o filho numa grande organização jornalística com um contencioso bilionário na Receita Federal?
Falta a JB, além de tudo, a discrição essencial a um magistrado em sua posição. Em sua loquacidade irreprimível, ele opina sobre tudo. Em breve, é possível que palpite na escalação da seleção. É verdade que a mídia o incentiva a opinar sobre qualquer coisa, mas ele deveria ter noção de suas limitações e se resguardar. Se um dia aprender a responder “não sei”, terá feito um avanço considerável. Mas não: até sobre o jornalismo investigativo ele julga ter algo a dizer. Digo apenas o seguinte: se o jornalismo investigativo funcionasse, a vida de Joaquim Barbosa seria muito menos confortável: a mídia teria esquadrinhado, por exemplo, a compra do apartamento em Miami.
Em vez disso, o que se viu foi uma cobertura miserável, em grande parte por conflito de interesse: a mídia enxerga nele um aliado, e por isso o escândalo passou virtualmente em branco por jornais, revistas e telejornais. Combatividade, só no jornalismo independente feito na internet — ainda sem os recursos necessários para investigações mais caras.
Para Joaquim Barbosa, “conflito de interesse” é aquilo que seus desafetos fazem. Se ele olhar para o espelho, verá alguém sem nenhuma autoridade moral para falar sobre o assunto.