A extrema direita se recompõe em todas as frentes. Por Moisés Mendes

Atualizado em 3 de outubro de 2023 às 23:18
Manifestantes com camisa do Brasil em aglomeração
Reprodução

Trabalhadores e estudantes estão voltando a fazer o que sempre fizeram, mas em tempos idos. Estão fazendo greves e paralisações para defender direitos e afrontar podres poderes políticos, econômicos e acadêmicos.

Tem gente jovem estreando em atos que haviam desaparecido do cenário brasileiro nos últimos anos. Os calouros talvez sejam a maioria.

Mas há ao mesmo tempo, enquanto a democracia se restabelece, o início de um movimento de refluxo da direita e do fascismo. Em toda parte, há um fascista à espera de protagonismo. Na Unicamp, um estudante foi agredido por um professor armado com faca e spray de pimenta.

Poderia ser um caso pontual, mas não no contexto em que o extremismo começa a se recompor, depois dos traumas da derrota na eleição e do fracasso do golpe. O fascismo está sequelado, mas vivo e usa faca.

Uma faca no bolso de um professor universitário branco não é a mesma faca no bolso de um homem qualquer no centro de São Paulo ou num arrastão nas praias do Rio.

A extrema direita instruída e precavida, pronta para dizer que se mantém intacta, carrega faca e spray de pimenta num campus universitário. Para enfrentar estudantes perigosos, principalmente os negros, como é o rapaz atacado pelo esfaqueador.

Os mais otimistas, que viam a democracia andar somente para a frente desde a posse de Lula, são confrontados com a realidade pós-8 de janeiro.

A cada avanço com ações efetivas, incluindo as institucionais, haverá a reação de alguém armado com algo que pode ser bem mais do que uma faca. Há sinais de que a extrema direita se recompõe e testa as iniciativas de uma nova fase proativa.

Alguns exemplos. O centrão no Congresso percebeu que estava sendo bonzinho e que pode e vai tirar mais de Lula agora e talvez muito mais logo adiante.

Inicia-se uma campanha, liderada pela Folha de S. Paulo, para tentar difundir de novo a falsa equivalência entre os métodos e as decisões de Alexandre de Moraes e de Sergio Moro.

Há na Folha, pela sequência de textos, um movimento organizado para dar uma falsa consistência à tese de que Moraes faz contra os golpistas e muambeiros o mesmo que Moro fazia em Curitiba contra empresários e seus executivos para pegar Lula.

A CPI do 8 de janeiro no Congresso pode chegar ao fim, agora em outubro, com a conclusão de que foi menos consequente do que a CPI da Covid e de que pouco ou nada acrescentou ao que o Supremo já fez no enquadramento do golpismo.

A CPI não teve força política para ouvir Braga Netto. Foi tratada com desdém pelo ministro Nunes Marques, que anulou a quebra de sigilo do policial rodoviário bloqueador de estradas Silvinei Vasques.

Seu colega de STF André Mendonça tenta fazer valer a tese de que alguns julgamentos de manés e terroristas devem ser presenciais no Supremo, o que pode fazer com que o desfecho de centenas de processos seja praticamente inviabilizado no médio prazo.

Não há mais uma linha, uma só, nos jornalões sobre a corrupção que se espalhou durante a intervenção de Braga Netto em 2018 no Rio. A pauta sumiu da grande imprensa.

General Walter Braga Netto. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Sumiram das pautas dos jornais as rachadinhas dos Bolsonaros e qualquer referência aos crimes da família. Sumiu tudo que tenha relação com os crimes das gangues comuns dos Bolsonaros e ficaram só, nos cantinhos, os desmandos das quadrilhas qualificadas.

Espalha-se pelos jornais a especulação, atribuída à gente do governo, segundo a qual pessoas próximas a Lula desconfiam da contribuição da delação de Mauro Cid para que Bolsonaro seja finalmente alcançado pelo sistema de Justiça.

Foram reativadas, na carona da reação ao voto de Rosa Weber pela descriminalização do aborto, todas as pautas de costumes do bolsonarismo.

O fascismo levou as questões moralistas, e não só as de família, para a eleição dos conselhos tutelares, que podem ter sido tomados de novo por fiéis das igrejas de Bolsonaro.

Só agora, quando Lula está no poder e fará suas escolhas, Rodrigo Pacheco volta a tocar a corneta dos que defendem a fixação de um tempo para os mandatos de ministros do Supremo.

Vozes estariam pedindo calma ao Planalto na recriação da Comissão de Mortos e Desaparecidos da ditadura, prevista para outubro, para que não incomodem os militares.

No meio disso tudo, enquanto a polícia continua matando negros, pobres e crianças, um professor da Unicamp anda com faca e spray de pimenta no campus e pula em cima de um estudante.

O nome do professor? A Unicamp não revela, para proteger seu corpo docente, porque um professor violento é antes um professor. A direita que usa arma branca também é acadêmica e com doutorado.

Publicado originalmente no Blog do Moisés Mendes

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