A fintech da Faria Lima que movimentou mais de R$ 17,7 bilhões para o PCC

Atualizado em 28 de agosto de 2025 às 12:09
Agentes da Polícia federal, em conjunto com as receitas federal e estadual fizeram buscas e apreensões em endereços na Faria Lima. Foto: Werther Santana/Estadão

A investigação que resultou na Operação Carbono Oculto teve início em Santos, com a apreensão de máquinas de pagamento em casas de apostas clandestinas. Registradas em nome de postos de gasolina ligados a uma grande distribuidora, essas maquininhas revelaram um fluxo financeiro incomum. O rastreamento levou ao BK Bank, hoje apontado como um dos principais instrumentos do crime organizado para movimentar recursos do mercado de combustíveis.

Fundado em 2012 como BK Instituição de Pagamento, em Ribeirão Preto, com capital de apenas R$ 15 mil, o banco passou por sucessivas transformações. Em 2019, já rebatizado de Berlim Finance, elevou seu capital para R$ 2 milhões. No ano seguinte, transferiu-se para Campinas, onde se consolidou como polo de fintechs associadas ao crime organizado, segundo a Polícia Federal.

Em 2022, tornou-se oficialmente uma fintech e, em 2024, ampliou seu capital para R$ 9 milhões, passando a se registrar no Banco Central. Nesse período, movimentou R$ 17,75 bilhões em operações suspeitas, segundo o Coaf, com destaque para os R$ 2,22 bilhões ligados à distribuidora Aster, de Mohamad Hussein Mourad, apontado como sócio do empresário Roberto Augusto Leme da Silva, conhecido como Beto Louco.

De acordo com a Receita Federal, entre 2020 e 2024 o BK Bank movimentou R$ 46 bilhões, usando brechas regulatórias para impedir o rastreamento de recursos.

A fintech utilizava as chamadas contas-bolsão, em que depósitos de diferentes clientes são misturados em uma única conta, dificultando a identificação dos reais beneficiários. Segundo os promotores, isso transformou o banco em um “buraco negro” financeiro, permitindo que valores ilícitos circulassem sem controle.

Polícia civil, Federal e Receita Federal se concentram para saída de megaoperação Carbono Oculto, com participação da Receita Federal. Foto: reprodução

As descobertas mostraram depósitos em espécie — algo incomum para uma instituição de pagamento — que somaram R$ 61 milhões em pouco mais de um ano, em mais de 10 mil operações. Os valores eram redirecionados para empresas de fachada, como Class Finance e Berlin Finance, atual nome do BK Bank.

Investigações apontaram que parte desses recursos vinha da exploração de jogos de azar, da venda de combustíveis adulterados e de fraudes em bombas medidoras. Só em Santos, foram identificados 50 postos operando como fachada para o esquema.

A Receita também revelou que a Flórida Distribuidora de Petróleo foi a primeira grande cliente da fintech, responsável por quase metade da movimentação do banco em 2019. No mesmo período, essa distribuidora vendeu combustível para empresas inexistentes, como Ruflo, Fox e Soluquimi, levantando suspeitas de que o dinheiro tivesse origem ilícita. Em paralelo, Mourad expandia seu império, comprando quatro usinas sucroalcooleiras e se associando a outras duas.

As investigações identificaram cinco núcleos principais do esquema: Aster/Copape, Paraná, Yang, Alemão e Zaraboxter. Apesar de atuarem de forma autônoma, todos convergiam para o BK Bank como centro de movimentação financeira. “Identifica-se esse canal de fluxo financeiro para ocultar e dissimular a origem e o destino de valores”, afirmaram os promotores.

O Ministério Público sustenta que o BK Bank pertence, na prática, a testas de ferro, como Mário Gardin e Danilo Augusto, e que a estrutura criada pela fintech tinha como função principal blindar os negócios do crime organizado. As operações revelaram que só um dos investigados mantinha 941 empresas registradas em seu nome, mais de 200 ligadas ao setor de combustíveis.

Segundo a Receita, as operações do BK Bank e de empresas vinculadas apresentaram baixo recolhimento de tributos em comparação às cifras bilionárias movimentadas. O órgão conclui que o banco funcionava como engrenagem financeira essencial do esquema criminoso que, além de dominar parte do setor de combustíveis, atuava em apostas, importações irregulares e ocultação patrimonial.

Augusto de Sousa
Augusto de Sousa, 31 anos. É formado em jornalismo e atua como repórter do DCM desde de 2023. Andreense, apaixonado por futebol, frequentador assíduo de estádios e tem sempre um trocadilho de qualidade duvidosa na ponta da língua.