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A Folha publica recados da Lava Jato – assim como publicou recados dos militares na ditadura. Por Raymundo Gomes

A empresa da família Frias a serviço da ditadura com a Folha da Tarde

Durante a ditadura, a Folha da Tarde notabilizou-se por publicar “recados” da ditadura sobre a sorte de “subversivos”. Agora jornalistas do primeiro time da Folha de S. Paulo se prestam ao mesmo papel, publicando ameaças anônimas da Lava Jato para fazer falar o marqueteiro do PT João Santana, há cinco meses preso – e que assim ficará o tempo necessário até abrir o bico.

No último dia 16 de julho, às 2 da manhã, o Painel, coluna de notas assinada pela repórter Natuza Nery, publicou o seguinte recado (http://painel.blogfolha.uol.com.br/2016/07/16/para-lava-jato-ex-marqueteiro-do-pt-corre-risco-de-perder-timing-da-delacao-se-demorar-a-falar/):

Para Lava Jato, ex-marqueteiro do PT corre risco de ‘perder timing’ da delação se demorar a falar
“POR PAINEL
“Corra, Lola
“Investigadores da Lava Jato alertam: é bom que o marqueteiro João Santana e sua mulher, Mônica Moura, não embromem muito para aceitar os termos da delação premiada. “Ou podem perder o timing”, dizem.
“Santana, até então reticente, decidiu entrar nas negociações do acordo de colaboração. Os investigadores não viam sentido em aceitar a delação de Mônica sem o depoimento do ex-marqueteiro do PT. O casal está preso desde fevereiro em Curitiba, mas o processo corre no STF. Foi remetido por Sérgio Moro à corte após a inclusão de políticos com foro privilegiado no inquérito.
“Santana tentou o quanto pôde evitar a delação. Temia muito afugentar futuros clientes. Para ele, o sigilo profissional era a garantia de que poderia continuar fazendo campanhas — ao menos em outros países.
“Investigadores afirmam que as negociações estão “mornas”. A defesa de João Santana nega que ele esteja negociando delação.”

Curiosamente, porém, no jornal impresso a nota saiu bem menor. Foi publicado apenas o seguinte na página A4 da edição de 16 de julho da Folha de S. Paulo:

“Corra, Lola
Investigadores da Lava Jato alertam: é bom que o marqueteiro João Santana e sua mulher, Mônica Moura, não embromem muito para aceitar os termos da delação premiada. “Ou podem perder o timing”, dizem.”

Mais curioso ainda é que NA VÉSPERA, a mesma seção Painel havia publicado que João Santana JÁ HAVIA aceitado negociar a delação premiada. Eis o que saiu no Painel em 15 de junho (inclusive com trechos idênticos aos da nota publicada na internet no dia seguinte).

“Ex-marqueteiro do PT, João Santana cogita aderir à delação premiada, já negociada por sua mulher
“POR PAINEL
“O marqueteiro fala
A proposta de delação de Mônica Moura, mulher de João Santana, ganhou um reforço de peso. O marido, até então reticente, decidiu entrar nas negociações do acordo de colaboração da Lava Jato. Os investigadores não viam sentido em aceitar a delação de Mônica sem o depoimento do ex-marqueteiro do PT. O casal está preso desde fevereiro em Curitiba, mas o processo corre no STF. Foi remetido por Sérgio Moro à corte após a inclusão de políticos com foro privilegiado no inquérito.

“Vai pegar mal
Santana tentou o quanto pôde evitar a delação. Temia muito afugentar futuros clientes. Para ele, o sigilo profissional era a garantia de que poderia continuar fazendo campanhas — ao menos em outros países.

“Passo a passo
A coluna confirmou as tratativas com diversas pessoas que atuam no caso. Investigadores afirmam que as negociações estão ‘mornas’. A defesa de João Santana nega que ele esteja negociando delação.”

Nesta quinta-feira, 21 de julho, por fim o jornal O Globo noticia, em reportagem assinada por Thiago Herdy:

“Ex-marqueteiro do PT assina acordo para iniciar delação
“CURITIBA — O ex-marqueteiro do PT João Santana e sua mulher e sócia, a empresária Mônica Moura, assinaram termo de confidencialidade com a Procuradoria-Geral da República (PGR), documento que marca o início do processo formal de colaboração premiada. Presos em Curitiba há cinco meses, dessa vez o casal tenta fechar uma delação em dupla — no início de abril Mônica tentou acordo individual, mas os termos não foram aceitos pelos procuradores.”

Aparentemente, João Santana parou de “embromar”, na expressão dos ventríloquos que falam pela boca da marionete Natuza Nery, e entendeu a mensagem. As negociações que estavam “mornas” foram subitamente aquecidas, depois do recado passado pelas páginas do jornal da família Frias.

Durante a ditadura, a Folha da Tarde, de propriedade de Octavio Frias de Oliveira (pai do atual diretor da Folha), notabilizou-se por publicar “recados” da ditadura militar a respeito do destino de “subversivos”. As mortes de guerrilheiros de esquerda eram noticiadas pelo vespertino paulistano antes da ocorrência real. É uma história bem documentada no livro “Cães de Guarda”, de Beatriz Kushnir. O livro pode ser baixado inteiro neste link, mediante cadastro na Unicamp: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=vtls000231037

Na página 310 do livro de Kushnir, é relatado o episódio da morte anunciada de Joaquim Alencar de Seixas, militante do MRT (Movimento Revolucionário Tiradentes). Noticiada em 17 de abril de 1971 pela Folha da Tarde, só veio a ocorrer no dia 19. A história também pode ser lida neste depoimento do filho de Seixas, Ivan, preso e torturado como o pai: http://memoriasdaditadura.org.br/biografias-da-resistencia/ivan-seixas/

Agora a imprensa não noticia mortes antes da hora, mas noticia delações premiadas que ainda estão por ocorrer. Agora não há pau de arara, mas há prisões temporárias sem limite temporal. É lamentável que jornalistas do primeiro time da imprensa brasileira se prestem ao papel de meninos de recados de justiceiros que, escondidos atrás do anonimato, não querem limpar a política brasileira, mas apenas se livrar de políticos com os quais não concordam e que, apesar de toda a campanha contra, continuam liderando as pesquisas eleitorais.

Diario do Centro do Mundo

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