A força bruta não apagou Marielle Franco. Por Jean Wyllys

Atualizado em 14 de março de 2019 às 11:38

Publicado originalmente no Universa

POR JEAN WYLLYS

Além de me deixarem estarrecido, as notícias sobre o planejamento detalhado da execução fria e brutal de Marielle Franco e Anderson Gomes, por parte dos sicários que a perpetraram há um ano, me levaram de volta à noite daquele 14 de março sombrio, que eu, como outros milhões de brasileiros, gostaria de não ter vivido.

Apesar de fazer sangrar uma ferida que nunca se fechou, rememorar a maneira singular como experimentei aquele horror é também uma forma de evitar que outras pessoas sofram algo semelhante no futuro e, ao mesmo tempo, um combustível à luta por justiça. Afinal, a minha arma em defesa de Marielle Franco é o que a memória guarda.

Recebi a notícia da execução da Marielle por telefone. Quem me deu a notícia foi meu assessor, Bruno Bimbi. Uma frase seca (não por insensibilidade, longe disso, mas por choque): “Jean, mataram Marielle”. Seguiu-se um silêncio entre nós dois que pareceu tão grande quanto a distância que nos separava: ele estava no Rio e eu em Brasília. Perguntei incrédulo e meio tonto: “Como assim mataram Marielle, Bruno? Que loucura é essa?”.

(…)

Meus amigos me informaram que as ruas das principais cidades já estavam tomadas de gente. “Afinal, há mais gente que se importa”, pensei. Sem dormir durante toda noite, olhos inchados de um choro que retorna como água de fonte, sempre que a vejo em fotos, sempre que penso nela, subi à tribuna da Câmara (não conseguira voo para voltar ao Rio e participar fisicamente de seu velório e enterro; e também não sei se gostaria de ter participado; queria me poupar do apagamento que alguns canalhas poderiam fazer da linha que separa a presença solidária da exposição eleitoreira) e reivindiquei ao presidente Rodrigo Maia a criação imediata de uma comissão externa que acompanhasse as investigações daquele crime brutal. Ele atendeu prontamente.

E pelos meses seguintes eu presidiria essa comissão, cumprindo o papel que me cabia na cobrança por justiça. Nesse curto discurso na tribuna – como me demorar em palavras, quando tudo que eu sentia era dor, raiva e medo? – eu disse às centenas de populares presentes no plenário algo mais ou menos assim: “Marielle sucumbiu aos tiros, mas as ideias são à prova de balas! Suas ideias continuarão vivas! Saibam os canalhas que lhe mataram!”.

Sim, Marielle Franco vive por meio de suas ideias. Vive em mim. Em cada um que a louva e (re)encarna suas ideias, sua visão inclusiva de mundo. Marielle vive em nós porque nem mesmo a força bruta pode um sonho apagar.