A Globo tenta tirar, inutilmente, Cunha de seu álbum de família. Por Kiko Nogueira

No Globo

 

A Globo está lidando com Eduardo Cunha como se nunca o tivesse conhecido biblicamente. É o mesmo tratamento dispensado a ex-sócios caídos em desgraça, como Ricardo Teixeira, da CBF, poupado pela emissora até a situação ficar insustentável.

No começo de 2015, sua eleição para a presidência da Câmara foi festejada. “Aborto e regulação da mídia, só pode cima do meu cadáver”, declarou ele, deixando claro que estava ali pelos amigos.

A situação ganha ares de retoque de fotos do stalinismo em que personagens somem. Numa matéria pós julgamento do Supremo, chamada “Os Passos de Cunha”, assim é descrita a maneira como ele conheceu a mulher:

A dedicação de Cunha a Collor rendeu-lhe a presidência da Telerj, antiga companhia telefônica do Estado do Rio. Foi na época que conheceu a atual mulher Cláudia Cruz. Comandou a Telerj até 1993, quando foi exonerado após o impeachment de Fernando Collor.

 

Pronto.

Cunha começou a carreira na bandidagem no Rio de Janeiro. Não virou o que é em Brasília por causa do PT. Nunca mereceu um minuto da atenção que a emissora dispensa aos meliantes petistas.

E, embora não seja mencionado, Cláudia, que pode ser presa também, foi funcionária. Não adianta tentar apagar dos arquivos, como fizeram também com Mirian Dutra, a ex-amante de FHC que foi escondida na Espanha como correspondente.

Cláudia foi empregada da Globo entre 1989 e 2001. Apresentou Bom Dia Rio, Jornal Hoje, RJTV, Globo Ciência, Globo Comunidade, Jornal da Globo e Fantástico.

Em 10 de abril de 2000, deu a notícia da demissão de seu marido da presidência da Companhia Estadual de Habitação, Cehab, por causa de denúncias de fraudes em contratos. Meses depois, seria demitida.

Segundo matéria da Folha, em 1992 o então presidente da extinta Telerj assinou um aditivo de 92 milhões de dólares a um contrato de 1989 com a NEC Brasil — fornecedora de equipamentos para telefonia controlada, na ocasião, por Roberto Marinho.

Não houve licitação. O aditivo serviria para ampliar o número de terminais para 40 mil celulares (em 1993, um segundo aditivo foi assinado por 30 milhões de dólares por mais 40 mil terminais — 62 milhões a menos do que pagou Cunha).

Em julho de 2015, uma colunista da Época relatou o envolvimento dele num caso de violência doméstica. Se ela está contando a verdade, por que ninguém da revista foi atrás de um boletim de ocorrência?

Diz a jornalista que, quando dirigia o jornal O Dia, em 1996, ele teria ido parar numa delegacia da Barra da Tijuca com a ex-mulher Cristina Dytz depois de uma briga. “Cunha”, segundo o texto, “fez de tudo para impedir a publicação. Telefonou primeiro para um editor, depois telefonou para o dono do jornal.

A reportagem saiu. Cunha travou com o jornalista um diálogo pesado ao telefone. E o levou à Justiça. Perdeu, porque nada havia ali que configurasse difamação ou injúria. Apenas fatos.”

Enquanto Cunha não foi apanhado com a boca na botija, Cláudia voou à vontade. Ele dançou na Cehab, ela dançou também. Durante ao menos duas décadas, a Globo não moveu um dedo de seu arsenal jornalístico para mostrar quem era EC.

Cunha deu o golpe, terminou o serviço e agora pode ser dispensado. No dia 24 de abril, um editorial do Globo explicou a situação: “Será saudável para o país se, passado o impeachment, o STF der sequência aos inquéritos existentes na Corte sobre o presidente da Câmara e demais políticos”.

Isso é pornografia explícita, o resto é perfumaria.

 

Kiko Nogueira

Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

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Kiko Nogueira

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