A ineficácia dos movimentos de esquerda e a lição paraguaia. Por Carlos Fernandes

Atualizado em 2 de abril de 2017 às 6:59

Alguém, em algum momento da história, já afirmou que somos cúmplices de toda a injustiça que não combatemos.

Sendo isso verdade, não é menos verdade que contribuímos, de uma forma ou de outra, com as mazelas que, sem qualquer resistência, nos são facilmente impostas.

Óbvio está que os movimentos de esquerda não podem ser acusados de passividade diante o desfecho do golpe e toda a mazela política, econômica e social dele decorrente.

Muitas foram as manifestações, os debates públicos, as mobilizações e as resistências.

Os sites e blogues progressistas defenderam a democracia heroicamente. As redes sociais foram incansáveis em denunciar a tragédia anunciada dessa aventura antidemocrática.

Porém, a despeito de tudo isso, o golpe foi concretizado e sofremos todos, agora, as consequências desastrosas que tanto alertamos.

A grande questão que fica é: até que ponto podemos ficar isentos de culpa, uma vez que todos os nossos esforços até aqui depreendidos simplesmente não foram suficientes para que restasse preservada a soberania desse país?

Para mim, pelo menos, já está claro que muito — e de diversas formas — ainda há de ser feito. A liberdade, o respeito, a igualdade e a justiça social jamais, em momento algum da história, foram alcançados sem luta.

E somente com ela, a luta, nos será devolvido o sagrado poder de decidirmos o nosso próprio futuro a partir da expressa e irrestrita vontade do povo brasileiro por meio do mais poderoso e eficiente instrumento da democracia: o voto.

As manifestações desse 31 de março, no que pese toda a sua grandeza, ficou muito aquém do que poderia ter sido. É possível que tenhamos perdido uma grande oportunidade de mostrarmos, de maneira efetiva, que podemos, sim, tomarmos de volta o que nos foi subtraído.

Nenhuma outra data teria maior simbologia para darmos os primeiros passos de volta à normalidade democrática.

O aniversário do golpe militar de 64, aliado aos acontecimentos do dia, deveria ter marcado o ritmo de todo uma marcha.

O novo recorde de desempregados divulgado pelo IBGE (13,5 milhões de almas errantes), a desmoralizante taxa de rejeição e desconfiança ao governo Temer demonstrada pelo Ibope e, principalmente, a sanção presidencial ao maior atentado aos direitos dos trabalhadores já visto no Brasil, deveriam ter causado uma verdadeira inundação de revolta e indignação em todas as partes desse país.

Muito longe disso, ficou no mínimo curiosa a fala do líder do MTST, Guilherme Boulos, na avenida Paulista.

Disse ele: “Este ato faz parte de uma série que teremos nos próximos dias até a greve geral em 28 de abril. Se até lá a Reforma da Previdência for aprovada pelo governo golpista de Temer, teremos que invadir o Congresso”.

Se for aprovada!!!???

Da mesma forma que permitimos — sim, permitimos —  embasbacados a aprovação e sanção do esfacelamento dos direitos trabalhistas, iremos permitir a aprovação da “reforma” da Previdência para só após invadirmos o Congresso?

O governo Temer cambaleia inebriado pela sua própria incompetência e podridão. Mas, uma vez que temos uma justiça comprada e acovardada além de um Congresso que dispensa apresentações, não cairá se ficarmos presos a esse tipo de ação reativa.

Não podemos esperar a próxima atrocidade a ser praticada por esse governo sobre nossos direitos para termos a coragem de fazer o que há muito já deveria ter sido feito.

Nisso, o nosso irmão e vizinho latinoamericano, o Paraguai, nos deu uma inspiradora lição.