A Itália não é opção para quem quer deixar o Brasil de Bolsonaro. Por Donato

Atualizado em 8 de novembro de 2018 às 9:17
Jair Bolsonaro. Foto: AFP

O medo tem dominado boa parte daqueles que não votaram em Jair Bolsonaro. O receio de perseguição e cerceamento de direitos faz com que o slogan ressuscitado pelo falastrão Silvio Santos esteja realmente em voga. A ideia de deixar o país já é levada a sério por muita gente desde que o inominável capitão saiu vencedor das urnas.

Nas rodas de conversa tem sido frequente ouvir sobre emissão de passaportes, opções de países, oferta de trabalho. Portugal e EUA, destinos preferidos daqueles que votaram no militar reformado e resolveram cair fora, são preteridos. Uruguai desponta como um dos favoritos. Aqueles que me conhecem questionam se não seria o momento de ir para a Itália.

Pois bem, como já tive a oportunidade de expressar neste DCM em artigos anteriores, a Itália é o Brasil do dia seguinte. Foi assim, por exemplo, com a Mãos Limpas e a Lava Jato. 

Portanto aqui cabe parênteses: nos últimos dias houve muita discussão acerca do aceite de Sergio Moro para o cargo de ministro de Justiça e novamente foram diversas as comparações entre a postura dele e dos magistrados italianos da operação Mãos Limpas. Tanto a operação contra a máfia italiana como o procurador Giovani Falcone foram inspirações para o juiz de Curitiba. Mas nem Falcone nem Antonio di Pietro foram decisivos e interferiram em uma eleição como foi Moro. Fecha parênteses, andiamo.

A Itália de hoje, com Matteo Salvini, mais uma vez dá mostras do que veremos deste lado do Atlântico à partir de 1º de janeiro. Após Salvini assumir o cargo de vice-primeiro-ministro os casos de violência dispararam.

Encorajados por mais uma liderança dos dias atuais que caberia na definição “soa como nós” – dita por David Duke da Ku Klux Klan em relação a Bolsonaro – simpatizantes de Salvini partiram para a ação. Grupos fascistas têm saído às ruas para atacar ‘inimigos’. Lá como cá os inimigos são os refugiados, os gays, os negros, os ‘comunistas’ (não, pelo menos isso preciso reconhecer, os italianos não são tão ignorantes, não utilizam esse rótulo).

Refugiados e até mesmo imigrantes já inseridos há anos na sociedade italiana têm sido agredidos de forma rotineira. Só de junho pra cá foram registrados 69 ocorrências graves. Ao menos um imigrante do Mali morreu e outros tantos sofreram lesões sérias devido a facadas e ferimentos por armas de fogo. Uma criança de um ano e meio está em risco de ficar paralítica. Dezenas precisaram se submeter a cirurgias (o levantamento foi pelo movimento Scusate se non siamo affogati, “Desculpem se não morremos afogados”, em alusão às travessias nas balsas).

Grupos fascistas saem pelas cidades armados de com bastões de beisebol e soco-inglês. Basta ser negro ou estar falando ao celular em outro idioma para tornar-se um alvo. Locais que abrigam refugiados têm sido incendiados com frequência.

Poucos são os casos de intervenção por populares, mas existem. Em Napoles, uma mulher corajosamente enfrentou um racista que ofendia um paquistanês dentro de um vagão de trem. A mulher o interpelou, chamou-o de racista e disse que aquilo era uma vergonha. O cretino, como todo cretino, ao ser confrontado não conseguiu argumentar e passou a repetir roboticamente: “A Itália é nossa! A Itália é nossa!”. Vem então a bofetada moral finalizadora da mulher: “Prefiro que a Itália seja deles do que de gente como você, fascista, racista!”.

No último dia 28, uma manifestação ocorrida na data do aniversário da Marcha de Roma teve adesão preocupantemente alta. Cerca de 2 mil fascistas foram até o túmulo de Benito Mussolini repetindo a saudação da extrema-direita durante todo o tempo. Muitos trajavam uma camiseta onde se lia Auschwitzland (assim mesmo, fazendo graça com o nome do campo de concentração mais famoso da Segunda Guerra e utilizando até a mesma tipologia do logotipo da Disneylândia).

No domingo em que Bolsonaro foi eleito, muitos de seus seguidores agiram como os fascistas italianos. Foram diversos relatos de agressões naquela noite, durante e após a ‘comemoração’ da vitória.

Como o discurso do futuro presidente em nada tem evoluído, essas cenas podem se tornar rotineiras. Mas para escapar dessa barbárie, a Itália não é uma opção.