A Lava Jato se encaminha para um fim inglório. Por Luis Felipe Miguel

Atualizado em 1 de outubro de 2019 às 15:14
Sérgio Moro e Deltan Dallagnol. Foto: AFP

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POR LUIS FELIPE MIGUEL

A Lava Jato se encaminha para um fim inglório. Cai por seus muitos erros, em particular porque seus protagonistas agiram com uma soberba absolutamente imprópria para quem participava de uma conspiração criminosa de enormes dimensões.

Outro erro da Lava Jato mostra ter grandes consequências: eles subestimaram a estatura moral de Lula.

Lula surgiu das entranhas do sindicalismo oficial e converteu-se no maior líder operário de nossa história. Mostrou coragem e tirocínio político ao comandar as greves que puseram em xeque a ditadura. Esteve à frente do projeto de um partido de esquerda de novo tipo, tornou-se a voz maior das oposições e delineou um caminho próprio para alcançar e exercer o poder, que a literatura acadêmica hoje alcunha de “lulismo”.

O lulismo foi uma estratégia de transformação social muito moderada, a fim de evitar atrito com os grupos dominantes. Para seus muitos críticos, entre os quais sempre me incluí, Lula se acomodou bem demais à posição de gestor do nosso capitalismo subalterno. Tornou-se amigo de empreiteiros, de financistas e de oligarcas. Tornou-se um mestre da nossa política tradicional, corrompida e excludente. Levava adiante o combate à pobreza extrema e apontava para um horizonte de nacionalismo econômico, mas evitava ciosamente dar qualquer outro passo que melindrasse seus novos parceiros.

A fúria com que as nossas velhas elites se voltaram contra ele e contra seu partido claramente o pegou de surpresa. Mesmo depois do golpe, mesmo depois da prisão, Lula não deixou de expressar sua mágoa com aqueles que romperam unilateralmente um pacto que lhes era muito favorável e que o próprio Lula cumpriu com tanto zelo.

A Lava Jato apostou, então, que a perseguição – que culminou na absurda prisão, que se prolonga há quase ano e meio – produziria um Lula abatido. Um Lula alquebrado.

Um Lula incapaz de aceitar a mudança na sua vida – dos jantares de Estado e dos agrados dos poderosos ao banco dos réus e à pequena cela em Curitiba – e, portanto, disposto a aceitar todas as humilhações.

Em suma: se a campanha contra Lula não fora capaz de destruí-lo, ele, quebrado pela perseguição sofrida, destruiria a si mesmo.

Em vez disso, encontraram um gigante. Um homem com um sentido de honradez pessoal e uma consciência de seu papel histórico como poucas vezes se viu.

Quando Lula fala – e ele tem falado muito, desde que a censura a ele foi levantada – é possível discordar de muita coisa: de seu diagnóstico do passado recente, de sua avaliação da conjuntura, da estratégia que ele propõe para o campo popular.

Mas é impossível não admirar a dignidade e o sentido de sacrifício com que ele enfrenta a adversidade.

Como esperar que a Lava Jato se contraponha a isso? Moro e Dallagnol são nomes próprios que, no português brasileiro, estão se tornando quase sinônimos de abjeção. Carentes de uma régua moral que lhes permita medir alguém como Lula, enredam-se em seus próprios truques e, a cada dia que passa, se resumem, mais e mais, a meros sintomas da degradação do Brasil.