A lerdeza dos que deveriam impedir o crime de Bolsonaro. Por Moisés Mendes

Atualizado em 7 de dezembro de 2020 às 9:41

Originalmente publicado em BLOG DO MOISÉS MENDES

Por Moisés Mendes

Um pai não sabe o que dizer ao filho sobre o início da vacinação contra a Covid-19, se é que teremos vacinação em massa. Mas a Folha online dava em manchete no domingo, durante todo o dia, que o Brasil caminha para a adoção do voto facultativo.

É uma previsão-provocação do ministro do Supremo Luis Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral. O Brasil espera que os ministros do Supremo digam logo o que a Justiça pode fazer para que a vacinação seja definida e ocorra sem muita demora, e Barroso vem com a pauta do voto facultativo.

Que prioridade há hoje no Brasil em torno da mudança do voto obrigatório? Qual é a urgência, em meio à emergência da pandemia, de propor a discussão sobre o direito das pessoas de não serem obrigadas a votar?

É um debate caduco, fora de hora. A urgência hoje é a vacinação. O governo não diz nada sobre as vacinas que serão escolhidas e compradas. Não mandou comprar nem as seringas.

Os governadores não pressionam, os prefeitos não sabem o que fazer. E o ministro Barroso ganha manchete da Folha (do início da tarde até o final da noite) com a falsa polêmica do voto facultativo.

O Supremo tirou da gaveta na sexta-feira as ações que pedem a interferência da Justiça para que o governo defina um plano de vacinação. Essa é a questão que importa.

Estava tudo pronto para o início da votação das ações, quando o ministro Luiz Fux apresentou um destaque e retirou o tema do plenário virtual.

Parou tudo. O STF terá de fazer uma sessão específica para discutir as ações, por videoconferência, e isso só deve acontecer dia 17.

Alguns países já iniciaram ou iniciam esta semana a vacinação. E o Brasil adia uma decisão do Supremo que pode obrigar Bolsonaro a planejar o que precisa ser feito.

Se o Supremo decidir que o plano deve ser apresentado, o governo teria 30 dias para divulgá-lo. O que significa que, se quiser atrasar ainda mais o início da imunização, Bolsonaro só precisa responder na segunda quinzena de janeiro.

As ações foram apresentadas no final de outubro por PSB, PT, PSOL, Cidadania e PCdoB. Estavam tramitando sem pressa no STF. E tudo continua devagar. Por que votar só no dia 17, se nunca o país viveu uma urgência em saúde tão grande quanto a que vive hoje?

Há por parte da Justiça, do Ministério Público, dos Estados e dos municípios uma resignação quase absoluta diante da decisão de Bolsonaro de boicotar a vacinação. É um boicote claro, declarado, explícito.

Estamos todos entregues a Bolsonaro e a essa lerdeza do STF, que poderia ser questionada com pressão política. Mas pressão de quem, se o país está anestesiado? E o STF pode dizer que Bolsonaro não é obrigado a apresentar plano algum.

Hoje, o que o brasileiro sabe com certeza é que o governo não tem um plano de vacinação. Além das dúvidas sobre a vacina a ser escolhida e sobre a data do começo do programa, outra é ampliada: a de que talvez não vá existir vacina para todos.

Bolsonaro pode perpetrar o maior crime contra a saúde pública já cometido no país, com o conluio das instituições que se omitem diante do seu negacionismo. O crime de Bolsonaro poderá ter muitos cúmplices.