A lição de Aécio: por que Temer mandou a Câmara votar a denúncia de Janot. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 15 de junho de 2017 às 23:37
Al Capone e Lucky Luciano

 

Michel Temer orientou seus aliados na Câmara dos Deputados para que votem rapidamente a denúncia criminal que o procurador Rodrigo Janot deve fazer contra ele – já existe fundamento para denúncia por corrupção passiva e formação de quadrilha.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que é genro do braço direito de Temer, Moreira Franco, já disse que fará isso e, se preciso, suspenderá o recesso para votar a denúncia.

Tamanha pressa significa que Michel Temer confia que terá os 172 votos (ou ausências), dos 513 em disputa, necessários para engavetar a denúncia.

Ao contrário do que se especula, Temer dá sinais de que não vê como incerto seu futuro no Palácio do Planalto.

Ele tem seguido a estratégia que seu principal aliado, o presidente do PSDB, Aécio Neves, expôs na conversa gravada que este teve com Joesley Batista.

Osmar Serraglio, o ministro “peba”, caiu, e quem entrou no Ministério da Justiça só está esperando a primeira oportunidade para trocar o comando da Polícia Federal.

Ou, o que é possível, acertar os ponteiros com o atual mandatário, Leandro Daielo, e dar mais poder à facção tucana que fez ninho na Polícia Federal desde os tempos de Fernando Henrique Cardoso.

Aécio é explícito no que pretende fazer com a Polícia Federal. Recordemos o diálogo com Joesley:

Aécio diz:

— O que que vai acontecer agora? Vai vim um inquérito de uma porrada de gente, caralho, eles são tão bunda mole que eles não (têm) o cara que vai distribuir os inquéritos para o delegado. Você tem lá cem, sei lá, 2.000 delegados da Polícia Federal. Você tem que escolher dez caras, né?, do Moreira, que interessa a ele vai pro João. 

Joesley concorda:

Pro João.

Aécio prossegue:

— É. O Aécio vai pro Zé (…)

A estratégia definida por Aécio repete o que ele e a irmã, Andrea, fizeram em Minas Gerais.

Em 2010, um delegado independente, João Octacílio Silva Neto, perdeu o posto em Belo Horizonte e foi transferido para o interior depois que reuniu provas e depoimentos que incriminavam o grupo de Aécio e uma empresa que era doadora das campanhas do PSDB.

Trata-se da mineradora Samarco, aquela da lama em Mariana, que aparece na Lista de Furnas como uma das empresas que pagaram propina para o caixa de campanha montado por Dimas Toledo, homem de confiança de Aécio.

Para saber mais, leia reportagem publicada pelo DCM em dezembro de 2015.

No lugar do delegado independente, assumiu o inquérito um dos chefes da Polícia Civil do Estado na época, Márcio Nabak, o Zé de Aécio. O inquérito simplesmente desapareceu.

Este é um exemplo de como a polícia em Minas foi instrumentalizada, exatamente como Aécio disse querer fazer com a Polícia Federal.

Em Minas, eles foram mais longe: quem denunciou o Mensalão Mineiro e a Lista de Furnas, o lobista Nílton Monteiro, foi preso e denunciou ter sofrido tortura.

Marco Aurélio Carone, o dono de um site que publicava as denúncias contra Aécio, também foi preso sem condenação durante nove meses, dos quais três em solitária.

Geraldo Elísio, um jornalista premiado, editor do site de Carone, teve a casa invadida por policiais, que apreenderam seu notebook, assim como o advogado Dino Miraglia, que defendia o autor das denúncias contra Aécio.

Em Minas, durante os doze anos do governo de Aécio Neves e de seu afilhado Antônio Anastasia, houve um estado de terror que só agora começa a ser conhecido em sua plenitude.

Terror que protegia a corrupção.

Em Brasília, o quadro já é parecido.

No Supremo Tribunal Federal, já existem dois tucanos, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes.

Em poucos dias, poderemos ter um presidente denunciado por corrupção e formação de quadrilha, mas blindado pela Câmara dos Deputados.

Em setembro, ao término de seu mandato, o procurador-geral Rodrigo Janot será substituído, certamente por alguém da confiança de Temer e do presidente do partido que é seu principal aliado, o PSDB.

Temer e o PSDB estão fazendo do Brasil uma república de ladrões, com a cumplicidade do ex-batedores de panela.

Só as manifestações de rua podem mudar esse quadro, porque as instituições já estão contaminadas.

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PS:

1) Fernando Henrique Cardoso, em nota publicada na quinta, dia 15, na Folha de São Paulo, não diz se sai ou se fica. Produziu frase de efeito — “preferiria atravessar a pinguela, mas, se ela continuar quebrando, será melhor atravessar o rio a nado” – mas não disse nada de concreto. A decisão do PSDB de permanecer abraçado com Temer foi tomada com a concordância dele.

2) Em Minas Gerais, depois de ser condenado em primeira instância a 20 anos e dez meses de prisão, com base das denúncias de Nílton Monteiro no caso do Mensalão Mineiro, o ex-presidente nacional do PSDB Eduardo Azeredo segue a vida com tranquilidade. O processo está parado no Tribunal de Justiça há um ano e meio, e Azeredo recebe alto salário como consultor internacional da Federação das Indústrias do Estado de Minas (FIEMG). Lá ainda está (quase) tudo dominado.