A má relação de Bolsonaro com o Congresso é fruto dele se comportar como virgem no prostíbulo

Atualizado em 26 de maio de 2019 às 8:40
Jair Bolsonaro. Foto: EVARISTO SA AFP

DA CARTA CAPITAL

POR ANDRÉ BARROCAL

Na terça-feira 21, o senador Omar Aziz (PSD-AM), de 50 anos, dizia em plenário aquilo que muitos parlamentares comentam nos bastidores. “Ninguém vai mudar a natureza do presidente Bolsonaro. Ele tem uma natureza própria, ele tem uma idade já e não vai mudar de opinião.”
Para os congressistas, Jair Bolsonaro não vai parar de demonizar a “velha política”, de portar-se como virgem entre pecadores, de apelar às ruas e às milícias digitais para tentar levar o Congresso a curvar-se ao governo. Diante disso, a má relação do presidente do Congresso parece não ter volta.

Deputada na Constituinte de 1988, a senadora Rose de Freitas (Pode-ES), de 69 anos, diz nunca ter visto um ambiente tão “ridículo” no Congresso. Obra, segundo ela, dos parlamentares bolsonaristas, que em vez de debater com os colegas, preferem fazer vídeos e postagens para as redes sociais.

Na sessão em que Aziz falou da personalidade de Bolsonaro, Rose fez um apelo ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). “O senhor tem que atravessar essa rua e dizer lá (no Planalto) o nível de insatisfação que nós estamos vivendo aqui. E não é por troca de cargos – não é por troca de cargos!”.

“A insatisfação política já está instalada, a olhos vistos” pelo menos desde o início de maio, quando o deputado Capitão Augusto (PR-SP), de 52 anos, deu entrevista ao Valor para explicar a renúncia ao cargo de vice-líder de Bolsonaro na Câmara. Augusto, que é da bancada da bala, acredita que os partidos cozinharão Bolsonaro até a popularidade presidencial não servir mais como proteção.

Uma pesquisa da consultoria Atlas Político para o El País mostrou, na terça-feira 21, que já há mais gente a achar o governo ruim ou péssimo (36%) do que regular (31%) ou bom e ótimo (28%). Na sexta-feira 24, uma pesquisa encomendada por uma empresa do “mercado”, a XP, mostrou a mesma coisa: 36%, 26% e 34%, respectivamente.

O deputado mais votado da Bahia, Pastor Isidório (Avante), de 56 anos, deu sua definição de Bolsonaro ao propor, na terça-feira 21, que a Câmara enviasse um emissário ao presidente para conversar sobre o clima na Casa. Ele se ofereceu para ser o emissário. “Sou conhecido como doido, e para conversar com um doido, só outro doido.”

Seu conterrâneo Otto Alencar (PSD), senador de 71 anos que topava ser um colaborador crítico do governo, foi ácido ao referir-se ao presidente naquele mesmo dia: “pusilânime, indeciso, vacilão”. Citou 14 exemplos de recuos ou contraordens presidenciais como prova de “pusilanimidade”.

Na véspera, Bolsonaro havia se superado. Pela manhã, dizia na Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) que “o grande problema é a nossa classe política”. À tarde, em evento no Planalto, que “nós valorizamos, sim, o Parlamento”.

Para tentar contornar a má relação com os partidos maiores, Bolsonaro resolveu se aproximar de uns nanicos, como Novo, Pros, Podemos e Pode, e até isso deu confusão.

Recebeu deputados daquelas legendas em 14 de maio, véspera dos protestos estudantis contra cortes na verba das universidades federais. Diante deles, ligou para o ministro da Educação, Abraham Weintraub, e mandou-o repor a verba. A trupe saiu do Planalto e deu a boa nova publicamente. Logo em seguida, um desmentido de Weintraub.

Um dos deputados ficou uma fera com o que Otto Alencar chamaria de “pusilanimidade” de Bolsonaro e subiu à tribuna da Câmara para reclamar. Foi Capitão Wagner (Pros), de 40 anos, campeão de votos no Ceará. Ele disse que ou o ministro ou o Bolsonaro mentiu. E esculachou os filhos e o “guru” do presidente, Olavo de Carvalho.

Com menos de seis meses no cargo, Bolsonaro só pode contar mesmo com os radicais das ruas para sobreviver.