A maestria de Jorge Ben diante do sujeito que o chamou de ‘crioulo sujo’ num show. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 16 de fevereiro de 2016 às 15:07
Mestre absoluta
Mestre absoluta

 

Jorge Ben marcou um golaço ao interromper o show no Circo Voador, no Rio, depois de ser xingado de “crioulo sujo” por um cafajeste na plateia.

Segundo relatos, Jorge — me desculpe, mas não consigo chamá-lo de Ben Jor; é como um amigo, Leleco de infância, que há 20 anos resolveu se rebatizar Apolo 19 — tocava a espetacular “Take It Easy My Brother Charles”.

Mandou o trompetista parar e falou para o sujeito subir ao palco. Os dois discutiram. Tiveram de ser separados e o cidadão terminou indo embora pela coxia.

“Esse cara ficou me chamando de ‘crioulo sujo’. Não vou aceitar isso. Sou carioca e brasileiro. O que um sujeito desses está fazendo neste show?”, contou ao microfone.

Em seguida, avisou: “Mas não vou estragar a noite. Vamos para um grande momento, vou chamar minha musa”. Marisa Monte apareceu e o acompanhou em “Balança Pema” e “Descalço no Parque”.

O Brasil está vivendo um momento em que o retardado on line saltou do sofá e do Facebook para a vida real. O fascista que acha normal invadir a timeline alheia para acusar o cunhado de comunista passou a fazer isso na rua.

Lembre-se dos vagabundos que foram encher o saco de Chico Buarque no Leblon. Um deles considerou razoável xinga-lo de “merda”. Sem contar tantos outros corruptos que deram vexames em hospitais e restaurantes.

Agora, nesse caso temos um agravante. O que leva um imbecil a ir ao show de um artista para ofendê-lo? Que tipo de psicótico é esse? Ele pagou o ingresso? Era um sonho antigo?

As apresentações de Jorge Ben têm mais ou menos o mesmo roteiro há décadas. Acompanhado da incrível Banda do Zé Pretinho, entrega seus clássicos sem estripulias e sem surpresas. Profissionalíssimo. O anti Tim Maia.

É um mestre generoso. Me recordo de uma noite no velho Palace em que ele voltou cinco vezes para o bis num concerto que deve ter durado quatro horas.

Está, oficialmente, com 70 anos. Para alguém da audiência tirá-lo do sério, é porque algo grave foi dito. Normalmente, um bocó desses seria ignorado.

Jorge reagiu com profissionalismo. Poderia ter exposto a pessoa e causar um incidente no meio da multidão. Preferiu confrontar o agressor num território controlado, o palco, e manda-lo para casa. E ainda convocou Marisa Monte para continuar a festa.

Senhor de seu castelo, mestre de seu domínio. “Depois que o primeiro homem/Maravilhosamente pisou na lua/Eu me senti com direitos, com princípios/E dignidade/De me libertar”.

Take it easy, my brother Charles. Que os canalhas saiam pelos fundos.