A militância perdeu a paciência com o PT?

Atualizado em 25 de dezembro de 2014 às 10:11
A militância
A militância

Vejo uma mensagem de Isabelle Truda no Facebook. O conteúdo resume o que se passa numa grande parte da chamada “Onda Vermelha”, a militância do PT, depois do anúncio dos 13 novos ministros de Dilma, nesta terça.

Isabelle é uma jovem de 33 anos que mora em  Niteroi. Seu texto, abaixo.

Também estou me despedindo do PT.

Entendo a governabilidade, entendo que às vezes é preciso dar dois passos atrás para dar um pra frente… Caso a Dilma indicasse a Katia Abreu por pressão de sua base aliada, eu até entenderia, mas não. A Katia Abreu não faz parte da real politik. Foi uma escolha pessoal da Dilma e o PMDB, que não a queria, acatou.

Sem contar Cid Gomes, que chegou a afirmar que professores não deveriam trabalhar por salário, mas por amor. Será que o Cid Gomes conseguiria passar uns meses sem seu salário se fizesse política por amor também? Acho que não.

O PT deveria valorizar o que tem de mais precioso, que é a sua militância. Fiz grandes amigos e espero levá-los para sempre em minha vida.

Em breve formalizarei meu pedido de desfiliação e vou petralhar em outras bandas. Foi bom enquanto durou. Beijos, abraços e boas festas a todos!”

O “também” não era gratuito. Outras pessoas tinham postado a mesma coisa no Facebook. O desabafo de Isabelle gerou um debate intenso. Li os comentários, por curiosidade intelectual.

Um líder petista, Valter Pomar, tentou convencer Isabelle a reconsiderar. A melhor opção, segundo Pomar, é tentar mudar o PT “dentro dele”.

Isabelle não pareceu se comover com a argumentação de Pomar. Alguém colocou uma provocação: em breve, Lula dirá que o PT tinha a melhor militância do mundo.

Claro que os decepcionados de agora podem reconsiderar as coisas depois do primeiro impacto negativo. Mas alguma coisa parece estar acontecendo entre militantes do PT como Isabelle. Ao menos, entre os mais jovens. Um limite talvez tenha sido rompido, ou a paciência se tenha esgotado, ou o crédito se tenha consumido.

Não que seja uma epidemia de inconformismo. Principalmente entre os petistas mais velhos, ainda vigora uma grande aceitação pelos desígnios do governo. O blogueiro Eduardo Guimarães é um destes casos. Guimarães defendeu tenazmente no Twitter o governo de Dilma.

E bateu no resto.

“Se a esquerda quer governo puro, só de esquerda, tem que parar de fazer merdas como as Jornadas Patetas de junho, que fortaleceram a direita”, escreveu ele.

Luciana Genro também apanhou.

“Durante a campanha, Luciana Genro atacou religiões em um país em que 90% do povo é religioso. Enquanto a esquerda fizer estas merdas, será fraca.”

Não me lembro de ataque nenhum de Luciana Genro às religiões. Recordo apenas o momento em que ela pediu licença ao Pastor Everaldo para chamá-lo de Everado, mas não é isto o que está em discussão.

Guimarães parecia nervoso.

“Alguém disse que apoio Dilma incondicionalmente. Puta cretinice. Apoio racionalmente. Votei nela faz dois meses e querem que já ataque. Bah!”

As reações opostas de Isabelle Truda e Eduardo Guimarães, ela jovem e ele veterano, podem ser icônicas: a juventude é menos paciente e menos disposta a suportar tudo em nome da “governabilidade”.

É ainda cedo para formular previsões acabadas, mas é possível que 2014 reforce algo que se manifestou nas “Jornadas Patetas” de junho de 2013: a perda do poder de atração do PT entre os jovens de esquerda.

Nos protestos de junho, foi dito chega ao sistema político tal como ele é, o PT incluído. O PT descobriu, ali, que não comandava as ruas.

Dilma só não perdeu a eleição, em 2014, porque os descontentes entenderam que a opção Aécio era muito pior. Mas ao ver um ministério que poderia ser o de Aécio muitos insatisfeitos se lembraram de tudo que os tinha levado a desiludir-se com o PT.

Concretamente, hoje o PT é um partido de centro. Com boa vontade, centro esquerda. O PSDB também se deslocou da área que ocupava, e hoje pertence à direita, ou centro direita.

Há, portanto, um espaço na esquerda, claramente.

Na Espanha, surgiu o Podemos, um partido novo que promete revigorar as causas clássicas da esquerda. E no Brasil, há chances de surgiu um Podemos? Ou melhor: já existe a raiz do Podemos, o PSOL?

Neste momento, final de dezembro, o PSOL está longe de ser o Podemos. Não entusiasma as multidões: seu fascínio é circunscrito a um grupo pequeno, como se viu na votação de Luciana Genro.

Mas este grupo pode crescer – desde que o PSOL consiga mostrar aos desiludidos que é o endereço certo para eles.

Para tanto, o PSOL teria que amadurecer politicamente. Se o PT se deixou tomar por um pragmatismo exacerbado, o PSOL parece dominado por um idealismo ingênuo e, em certos momentos, infantil.

Aristóteles dizia que a virtude está no meio,  e talvez esta seja uma boa divisa para o PSOL.

Vai ser fascinante observar, nos próximos meses, os movimentos dentro da esquerda brasileira.

Até onde irá o desgostos de jovens petistas como Isabelle Truda? Para onde eles levarão sua militância política? O PT conseguirá estancar o processo de desgaste que parece se alastrar em sua ala mais jovem e mais progressista?

Dezembro de 2014, com os “13 de Dilma”,  traz todas as perguntas acima.

Será divertido observar, nos próximos meses, as respostas a elas.