A nova do colunismo: “impeachment fez bem ao PT”. É sério. Por Raymundo Gomes

Atualizado em 29 de agosto de 2018 às 18:21
Logotipo do PT. Foto: Divulgação

POR RAYMUNDO GOMES

Os comentaristas da mídia coxinha – no vão esforço de convencerem a si mesmos de que é real o universo paralelo que criam em seus textos – volta e meia se referem à tal “narrativa do PT”.
Na versão mais recente desse tipo de argumento, o impeachment de Dilma “fez bem ao PT” – acreditem. Foi o que escreveu nesta quarta o colunista Hélio Schwartsman, da Folha de S. Paulo.
Não que ele seja um colunista importante (fora do prédio da Folha na alameda Barão de Limeira, ninguém sabe quem é), mas seu texto é bastante ilustrativo.
Veja o que disse Schwartsman no jornal, caricaturando assunto sério: “O impeachment é um elemento que se incorpora facilmente à narrativa do PT de que o partido foi vítima de um complô das elites e da CIA para evitar que os pobres melhorassem de vida e para nos privar das riquezas do pré-sal.”
Com termos diferentes – “estratégia da vitimização” e outros – essa linha de raciocínio vem sendo explorada nos últimos tempos pelos articulistas, em variados graus de desespero diante desses fatos que teimam em não se encaixar em suas teorias.
O argumento é mais ou menos o seguinte: se Dilma não tivesse sido derrubada, estaria agora às voltas com baixíssimos índices de popularidade, e Lula nem de longe gozaria da liderança folgada nas pesquisas que possui hoje. O PT seria afastado do poder pela urna, e não por um golpe.
Foi mal aí, Schwartsman. A pressa em derrubar Dilma atropelou a paciência exigida de quem aceita as regras do jogo democrático e espera as eleições para chegar ao poder com os votos do povo. Agora, só resta virar de novo a mesa para impedir Lula de ser eleito – o que, aliás, não incomoda nem um pouco o colunista da Folha, nem os demais da pequena grande imprensa.
O PT não pode dizer nada, no entender dos colunistas, pois tudo se encaixa numa “narrativa”, numa “estratégia”.
Dê um Google em busca de “narrativa do PT”. Vai encontrar 26.300 referências. Agora dê um Google em “narrativa do PSDB”. Vai encontrar quatro. Não 4.000. Quatro. (Fora, agora, este texto, claro.)
O curioso nesses artigos é que só o PT parece ter uma “narrativa”, termo que é implicitamente contraposto a uma suposta realidade, que só existe na cabeça dos colunistas. A ideia de que o PT é culpado por todos os males do Brasil não é uma “narrativa”, então?
Já que falamos em exagero e caricatura, é inevitável pensar no que esses colunistas escreveriam se vivessem não em 2018, mas em outros tempos da história humana.
“A crucificação é um elemento que se incorpora facilmente à narrativa dos cristãos”. Palestina, c. 33 d.C.
“A escravidão é um elemento que se incorpora facilmente à narrativa dos negros.” Brasil, 1888.
“O Holocausto é um elemento que se incorpora facilmente à narrativa dos judeus.” Europa, 1945.
Como li outro dia num post espirituoso em redes sociais, há uma solução fácil para privar o PT dessa narrativa. Sugiro aos colunistas dos jornais que passem a defendê-la.
Soltem Lula.