A parábola fascista de “Star Wars: O Despertar da Força”. Por Pedro Zambarda

Atualizado em 21 de dezembro de 2015 às 9:32

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ATENÇÃO: CONTÉM SPOILERS

 

Presente como uma força transformadora nos cinemas desde 1977, o lançamento de um novo episódio de Star Wars é sempre rodeado de especulações sobre o roteiro e seu provável sucesso comercial. O filme “O Despertar da Força”, sétimo episódio da ópera espacial concebida por George Lucas, bateu US$ 250 milhões nos dois primeiros dias, quebrando o recorde de “Jurassic World”, e marcou a estreia da Disney e do diretor J. J. Adams (novos Star Treks e Lost) na série.

Política sempre foi um tema importante em Star Wars. Na primeira trilogia, encerrada em 1983 com o filme “O Retorno de Jedi”, o enredo se centra no jovem Luke Skywalker, que se junta a um grupo de rebeldes para enfrentar as forças imperiais e seu maior general, o lorde das trevas Darth Vader, que na verdade é o pai do protagonista.

Já a segunda série de filmes, terminada em 2005 com “A Vingança dos Sith”, mostra a transformação de uma república democrática galáctica em uma ditadura de cunho militar através das mãos de Vader, então conhecido como o cavaleiro jedi chamado Anakin Skywalker. Ele é atraído para o lado negro da Força, um poder mágico, através das mãos do senador Palpatine, cujo nome verdadeiro é Darth Sidious. A história foi contada de trás para frente, dos episódios IV, V e VI para o I, II e III.

Star Wars é um enredo sobre fascismo perpetuado por um pai que foi seduzido por forças malignas e passou a dominar a galáxia através de tropas militares, os Stormtroopers. Nesta nova geração, que já vive após a morte de Darth Vader, a história política se desenha de outra forma.

“O Despertar da Força” ocorre 30 anos depois de “O Retorno de Jedi”. Luke Skywalker (Mark Hamill) estabeleceu com sua irmã, Leia Organa (Carrie Fisher), e com o piloto da famosa Millenium Falcon, Han Solo (Harrison Ford), uma nova República democrática com o fim do Império Galáctico. Como novo cavaleiro Jedi, ele também funda uma nova ordem de guerreiros justos e passa a treinar o descendente de Han e Leia para se tornar um usuário da Força.

O problema é que o jovem é seduzido novamente pelo lado negro, personificado agora em uma entidade chamada Snoke. O jovem Jedi se torna Kylo Ren (Adam Driver, da série Girls), um senhor das trevas com espada laser em cruz, e ajuda a fundar uma nova organização imperial chamada A Primeira Ordem.

Os imperiais caçam os republicanos e começam a destruir planetas com uma entidade chamada Starkiller, um mundo em neve com um canhão solar capaz de destruir cinco planetas ao mesmo tempo. A arma é muito mais poderosa do que as Estrelas da Morte construídas na era de Darth Vader.

Com uma guerra em curso, Luke decide se exilar, porque ele foi parcialmente responsável pela criação de Kylo Ren. Han Solo se separa de Leia Organa. Ele volta a ser contrabandista ao lado do companheiro wookie Chewbacca, enquanto ela se torna general da Resistência republicana.

Enquanto isso, temos a saga de uma catadora de lixo chamada Rey (interpretada pela novata atriz Daisy Ridley), habitante do planeta Jakku.

O local é cenário de uma chacina orquestrada por Kylo Ren, que busca um droid chamado BB-8 com informações sobre a localização de Luke Skywalker.

Entre os Stormstroopers fiéis a Kylo Ren, um jovem chamado Finn (John Boyega, britânico de “Attack the Block”) deserda e ajuda Rey a esconder o robô. Os dois encontram a antiga Millenium Falcon de Han Solo e iniciam uma aventura pela galáxia.

O filme é uma inversão do conto entre Darth Vader e Luke Skywalker. Pensava-se que o universo estava livre do fascismo após a derrota dos lordes Siths. Os Jedis seriam capazes de reformar as instituições republicanas e a paz no universo.

Eis que surge o mal na figura de Kylo Ren, filho de Han e Leia, que se tornou obcecado pelas histórias do avô Vader. Em um enredo trágico, Ren provoca uma desgraça familiar neste episódio da série, mostrando que o fascismo não é apenas a figura paterna dos antigos filmes. O ser maligno surge nos descendentes e em um ser que deveria ser a esperança.

Isso provoca desespero até no lendário Luke Skywalker, que decide se retirar para meditar. A nova esperança está em uma mulher catadora de lixo, Rey, e num negro que fugiu das tropas imperiais, Finn. O filme acerta em tornar uma personagem feminina tão importante quanto Luke nesta nova história, tirando o foco apenas nos homens.

E Rey, sensível à Força, é quem vai encarar o neofascismo de Kylo Ren.

Star Wars VII é um filme pipocão para assistir com toda a família, com várias piadas que remetem ao longa-metragem original de 1977. Não é complexo, mas também acerta na mensagem política que traz.

O filme certamente vai encantar os fãs dos episódios dos anos 80 e é muito diferente da trilogia pensada por George Lucas nos anos 2000, que abusava de efeitos especiais e tinha diálogos canastrões protagonizados pelo ator Hayden Christensen (Anakin Skywalker) na companhia de Ewan McGregor (o mestre Obi-Wan Kenobi). “O Despertar da Força” recupera o humor mais pueril de Mark Hamill, Carrie Fisher e Harrison Ford nos novatos Daisy Ridley e John Boyega.

Em tempos de ideologias totalitárias ganhando força na Europa, além das bobagens xenofóbicas ditas pelo ultradireitista Donald Trump nos Estados Unidos e os revoltados antipetistas no Brasil, é importante atentar que o fascismo não é uma concepção velha. Ele sempre poderá se manifestar entre os jovens de hoje e de amanhã.