A pergunta de Raquel, de novo. Por Moisés Mendes

Atualizado em 27 de outubro de 2025 às 10:04
A repórter Raquel Krähenbühl, correspondente da Globo em Washington. Foto: Reprodução

A repórter Raquel Krähenbühl, correspondente da Globo em Washington, perguntou a Trump se ele iria falar de Bolsonaro no encontro com Lula na Malásia. Trump respondeu, diante de Lula: “Não é da sua conta”.

As redes sociais ficaram irritadas com Raquel por ter enfiado Bolsonaro no encontro. Mas a jornalista fez o certo, mais uma vez.

Bolsonaro é citado na primeira frase da advertência pública ao Brasil, em julho, quando Trump tentou impor o fim do julgamento do golpista.

O chefe da organização criminosa está em tudo o que se fala sobre a chantagem de Trump. Qualquer jornalista faria a pergunta. O tom da resposta prova que a repórter fez seu trabalho.

E outra pergunta pode, então, ser acionada pelas reações à pergunta da correspondente: por que tantas críticas à jornalista?

O que ela fez de errado ao forçar Trump a dizer o que disse?

Em agosto, Raquel obrigou Trump a dizer que conversaria com Lula sobre o tarifaço. E conseguiu arrancar do neofascista uma acusação contra Lula, de que o presidente brasileiro fez “a coisa errada”.

No pátio da Casa Branca, Raquel falou mais alto na gritaria dos colegas e emplacou várias perguntas, nessa sequência:

Raquel Krähenbühl: Você está aberto a negociar com o Brasil? O presidente Lula disse que gostaria de ligar. Se ele pedisse para conversar, você falaria com ele agora?

Donald Trump: Ele pode conversar comigo quando quiser.

Raquel: Você está disposto a negociar as tarifas?

Trump: Sim, ele pode conversar comigo quando quiser.

Raquel: O que está na mesa para o Brasil?

Trump: Vamos ver o que acontece. Mas eu amo o povo do Brasil.

Raquel: Então, por que tarifas de 50%? Elas não parecem ter relação com o comércio.

Trump: As pessoas que governam o Brasil fizeram a coisa errada.

Vou repetir o que escrevi em agosto: viva o jornalismo. Raquel Krähenbühl está brilhando em Washington desde a cobertura da invasão do Capitólio, em janeiro de 2021.

As contas

Quem é ou foi repórter vive de fazer perguntas. Foi o que eu mais fiz na vida até hoje. Repórter não pode ter medo de perguntas e muito menos de respostas.

Fiz as contas agora, nesses tempos de números inúteis. Considerando que eu tenha feito, em média, pelo menos 30 perguntas por dia — inclusive sábados e domingos — por 50 anos, durante todo o tempo em que fui repórter devo ter feito 500 mil perguntas.

Em alguns dias, um repórter pode fazer até 100 perguntas. Em uma entrevista por telefone, um repórter chega a fazer mais de 30 perguntas para depois aproveitar só uma frase.

É assim que funciona. Repórter só pode afirmar alguma coisa se fizer as perguntas — as certas e as erradas.

Moisés Mendes
Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim) - https://www.blogdomoisesmendes.com.br/