A prisão arbitrária dos alunos em SP é um aperitivo do estilo no novo Ministro da Justiça. Por Mauro Donato

Atualizado em 14 de maio de 2016 às 13:16


As declarações de Alexandre de Moraes, novo Ministro da Justiça, a respeito de como tratar os movimentos sociais e, sobretudo, a demonstração prática de seu legado na Secretaria de Segurança de São Paulo na manhã de ontem quando a PM invadiu ocupações de escolas sem precisar mais contar com mandado judicial e conduzir 89 estudantes para a delegacia, deixou boquiaberta a parcela pensante da população.

Enquanto os alunos que restaram soltos faziam uma assembléia para decidir o futuro das ocupações, uma manifestação chamada pela página O Mal Educado reunia diversos movimentos sociais, membros da Gaviões, o MPL, SINTUSP, movimentos por moradia e outros na avenida Paulista. Todos em solidariedade aos estudantes dura e covardemente reprimidos e preocupados com o que está por vir.

Foi um episódio emblemático. Menores de idade foram acordados e arrastados para fora, enfiados em ônibus e impedidos de comunicar a quem quer que fosse. Muitos pais, revoltados, ficaram sabendo o que ocorria através da TV. As acusações incluem, entre outras coisas, “esbulho possessório”, invasão de propriedade alheia. Escola é propriedade alheia a estudantes desde quando?

Só mesmo no novo Brasil que escalou para a pasta da Educação um ministro como Mendonça Filho (DEM) que tem em seu currículo ser a favor da redução da maioridade penal, ser contra as cotas raciais e que já foi à justiça contra o ProUni. Com um ministro desses não é de se estranhar que estudantes e menores de idade estejam sendo tratados como criminosos.

Afinal, em que país vivemos desde às 6:30 da manhã do dia 12 de maio?

“Estamos sob condições muito mais duras porque essa mudança de governo autorizou setores mais à direita a abrir uma guerra de reconquista de território que perderam por 12 anos. O que aconteceu hoje de manhã deve ser lido junto com as declarações do novo Ministro da Justiça. É um sinal claro de que a repressão será bem mais dura a partir de agora”, afirmou Pablo Ortellado, filósofo professor de Gestão de Políticas Públicas, presente ao ato.

Um estado que trata reivindicações legítimas com repressão policial e atropela direitos constitucionais é filme reprisado mas sempre assombra. Até porque, as justificativas são acintosas. Adalberto Robert Alves, autor do parecer da Procuradoria-Geral do Estado que respaldou as reintegrações das escolas sem mandado judicial, alegou que recorrer à justiça significa demora para resolver problemas. “Muitas vezes o Judiciário não aprecia o nosso pedido com a urgência necessária. É um procedimento que acaba atrapalhando.”

Como o judiciário é lento, vamos com as próprias mãos. É isso? Recado assimilado, foi isso que fez o governo de São Paulo, foi isso o que fizeram populares em outras ocupações. Invadiram, bateram, ameaçaram de morte os alunos. No Rio de Janeiro a escola Mendes de Moraes, ocupada há 50 dias, foi palco de uma batalha sangrenta que durou quase uma hora e deixou quatro feridos. Dois deles precisaram ser levados a hospitais. Em São Paulo outras escolas foram retomadas com violência protagonizada por diretores, pais, alunos e milicianos contrários às ocupações. O legado de Alexandre de Moraes e o argumento do assessor jurídico da PGE liberaram o vale-tudo.

“As coisas ficaram mais difíceis mas a gente não vai se desmobilizar por causa disso não. Está uma perseguição grande tanto policial quanto politicamente dentro das escolas. Alguns BOs foram enviados diretamente da polícia para o Centro Paula Souza”, declarou Douglas de Oliveira, aluno da ETEC Guaracy.

O protesto em solidariedade aos estudantes marchou pela cidade e no final juntou-se às Mães de Maio que faziam um ato em memória dos dez anos da perda seus filhos. Em 2006, 505 civis foram assassinados para vingar a morte de 59 policiais pelo PCC. Dez anos depois, que país vivemos?

Enquanto estudantes eram presos e agredidos, as atenções da grande mídia estavam voltadas para os pronunciamentos e entrevistas do novo ministro da Economia sobre mercado, câmbio, finanças. A sexta-feira 13 mostrou ao mundo a tradução do lema do governo Michel Temer. ‘Ordem’ só para manter a periferia onde está, e ‘progresso’ apenas o financeiro, para os barões de sempre. Aqueles que inflam um pato mas não querem pagar.