A Resolução

Atualizado em 15 de agosto de 2012 às 15:50
Enquanto houver um livro não estarei sozinho

Tenho uma resolução de fim de ano.

Uma única.

Colocar um filtro rigoroso em minhas relações de amizade. Basicamente, prefiro ficar numa solidão siberiana a estar na companhia de pessoas sobre cujo caráter eu não tenha uma boa opinião.

Só não fica sozinho, como escreveu  Schopenhauer, quem não suporta a própria companhia.

Aos 54 anos, você não tem mais tanto tempo assim. Contemporizar com pessoas de discutível integridade não faz o menor sentido. É um desperdício.

Omissão, para mim, é fraqueza.

Tive o exemplo de meu pai. Uma colega de magistério, Helena Pignatari, foi presa em 1964. Os amigos sumiram. Meu pai foi visitá-la, com todo o risco que isso trazia naqueles dias. Anos depois, o cronista Lourenço Diaféria seria processado pela ditadura militar por causa de um crônica considerada ofensiva ao patrono do Exército, o Duque de Caxias. Mais uma vez, meu pai estava lá, para prestar o testemunho de sua amizade corajosa. Falou, no tribunal, em defesa de Lourenço. (Era tão complicado o episódio que um general poderoso ameaçou Octavio Frias de Oliveira de fechar o jornal caso ele não atendesse a suas solicitações. Frias atendeu. Uma delas era afastar do comando da redação o diretor Claudio Abramo. Claudio foi varrido e substiuído por um editor de direita, Boris Casoy, o primeiro diretor do jornal que não dominava o idioma português.)

Papai saiu em defesa do amigo Lourenço em situação de risco

Não sou exatamente um admirador de Lênin, mas respeito um traço dele. Se tivesse que ficar sozinho em sua cruzada, não hesitava. Assim foi quando ele decidiu romper com uma ala de seu partido quando entendeu que as pessoas ali não tinham a firmeza necessária. (Essa ela receberia o nome de “menchevique”, minoria em russo. Lênin ficou com os “bolcheviques”, maioria.)

Não sou Lênin, e muito menos meu pai.

Mas em 2011 pretendo não sorrir hipocritamente a quem não merece. Não mais. E nem fingir que sou amigo daqueles que sei, pela omissão, que não terei a meu lado quando precisar.

Amizade é uma coisa muito séria para ser tratada levianamente, inclusive por mim.

De resto, enquanto houver um livro não estarei sozinho.